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Cartões de crédito: não dá para viver sem eles

quinta-feira, 15 de junho de 2023

Atualizado às 07:51

Uma das coisas bem estruturadas e entregues ao consumidor no mercado de consumo para que ele use e que, de fato, não possa ficar sem, é o cartão de crédito. Sua implementação é um dos maiores sucessos do mercado de consumo.

Meu amigo Outrem Ego trabalhou num grande banco estrangeiro, que tem agências no mundo todo. Há muitos anos, na década de oitenta, ele fez um curso sobre concessão de crédito de massa e sua cobrança (isto é, cobrança de créditos do varejo e no qual se incluem as dívidas dos cartões de crédito). Foi um excelente aprendizado, como ele diz, e cujo modelo acabou sendo implantado em todo o planeta.

Veja o que ele contou sobre cartões de crédito:

"O professor", disse ele, "perguntou a nós, alunas e alunos, quais eram as prioridades do consumidor no que dizia respeito ao pagamento de suas dívidas: 'Quando ele recebe seu salário no fim do mês, o que ele escolhe pagar em primeiro lugar?'. Nós respondemos que, logicamente,  pela ordem de importância: medicamentos, alimentação, serviços públicos essenciais como energia elétrica, água e gás, escola do filhos, aluguel da casa etc."

Meu amigo prosseguiu:

"O professor, então disse: 'É isso mesmo! O consumidor estabelece uma escala de prioridades. Ele, consciente ou inconscientemente, constrói uma pirâmide de prioridades. No topo estão os itens de primeira necessidade e na medida em que se desce a montanha vão aparecendo os débitos menos necessários ou menos urgentes. É natural, portanto, que os débitos com os bancos estejam na base da pirâmide. Ele paga todo mundo apenas se tiver dinheiro para tanto'"

Outrem Ego disse que, na sequência, o professor apresentou o pulo do gato: "Nós, que trabalhamos nos bancos, temos que dar um jeito de inverter a pirâmide. Temos que colocar no topo nossos créditos. E dá para fazer: basta conseguir colocar o cartão de crédito em todas as operações existentes. No comércio, na indústria, na prestação de serviços, o que inclui médicos e hospitais, e até nas escolas, nos serviços públicos etc. Como o cartão será o instrumento mais importante do poder de compra do consumidor, a primeira coisa que ele deverá fazer quando receber seu salário será pagar sua fatura.  Estaremos no topo da pirâmide".

E deu certo!

Já faz bastante tempo que se pode pagar quase tudo com cartão de crédito. Existe uma verdadeira invasão de cartões, uma superexposição ao cartão de crédito; inclusive, os grandes estabelecimentos comerciais se utilizam de seu próprio cartão. Quem ainda não cansou de ouvir o caixa dizer: "Você tem cartão de crédito X?". Aliás, não é incomum, o consumidor possuir 3, 4, 5 ou mais cartões.

E, na atualidade o cartão pode ser real ou virtual.

De fato, tendo em vista sua praticidade, o cartão de crédito talvez seja o exemplo mais representativo da evolução das formas de pagamento na sociedade de consumo. O pagamento em moeda corrente e mesmo através do cheque foi sendo substituído pelo chamado "dinheiro de plástico". E isso por uma série de facilidades que ele oferece, além daquelas apresentadas pelo professor americano.

O cartão poupa o consumidor das complicadas tarefas de assinar contratos para obtenção do crédito; idas e vindas aos bancos ou acessos via online; permite compra sem gasto, enquanto o dinheiro está em alguma aplicação financeira ou ainda não chegou; colabora com o controle do orçamento doméstico, uma vez que o extrato aponta todas as compras feitas; além de uma série de outros benefícios e serviços oferecidos pelos administradores (seguros automáticos, saque de moeda corrente etc.). Tudo isso, é claro, aliado à enorme facilidade que é ter no aparelho celular uma imagem ou no bolso apenas um pequeno documento de plástico, substituindo papel moeda, talão de cheques etc.

Como no Brasil os juros cobrados pelos administradores dos cartões ainda são elevados, nem todas essas vantagens estão implementadas. O consumidor acaba fugindo do financiamento - aliás, deve fazê-lo para não correr o risco de se endividar1 --, e o cartão de crédito acaba funcionando mais como um cartão de compra. E, ademais, por isso mesmo, o cartão tem também sido muito usado na função de débito, firmando-se cada vez mais como um instrumento de compra, além do financiamento.

Mas, sem dúvida, não dá para viver sem eles.

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1 O lado negativo do uso excessivo do cartão de crédito é exatamente este: o consumidor acaba se perdendo nas aquisições a prazo, se descontrola e se endivida ou, pior, se superendivida.