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A conciliação judicial no superendividamento

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Atualizado às 07:39

Continuo a comentar aspectos da lei 14.181, que introduziu no Código de Defesa do Consumidor uma série de normas visando aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispôs sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Cuido, hoje, da conciliação judicial no superendividamento.

O consumidor superendividado poderá ir a Juízo requerer uma espécie de recuperação judicial, conforme previsto no artigo 104-A. Penso que, certamente, antes do ingresso do pedido, o consumidor deverá ter orientação jurídica (de advogado e/ou órgão de proteção ao consumidor) e, também, de contador ou perito contábil. Isso porque a norma permite proposta de repactuação das dívidas para um prazo de até 5 anos. Além disso, há de ser preservado o mínimo existencial (que como demonstrei aqui na coluna de 15-7-21, exige melhor detalhamento1). E, a proposta, que envolve todos os credores, além de tudo, deve respeitar as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. Nada muito fácil de ser feito, especialmente, envolvendo interesses de credores diversos que, por sua vez, venderam produtos e serviços diversos, com preços e prazos de pagamento diversos.

Examinado o pleito, o juiz poderá instaurar o processo de repactuação de dívidas visando realizar a audiência conciliatória. Não é uma conciliação simples de ser executada ainda que as intenções sejam legítimas.

O credor, por sua vez, tem obrigação de comparecer à audiência de conciliação ou enviar procurador com poderes para transigir, sob pena de suspensão da exigibilidade do débito existente e interrupção da contagem dos encargos da mora. Além disso, se o consumidor souber o montante devido a este credor que não compareceu nem se fez representar, ele (o credor) estará sujeito ao plano de pagamento que vier a ser fixado, mas receberá seu crédito somente após o pagamento feito aos demais credores que compareceram à audiência.

A norma fala também do óbvio. Diz que havendo "conciliação, com qualquer credor, a sentença judicial que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada", algo natural e decorrente da sentença.

De todo modo, a norma também impõe que a conciliação seja feita com certos parâmetros. Da sentença devem constar: a) as medidas de dilação dos prazos de pagamento e de redução dos encargos da dívida ou da remuneração do fornecedor e todas as demais alternativas negociadas visando o pagamento da dívida; b) referência à suspensão ou à extinção das ações judiciais em curso; c) a data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e dos cadastros de inadimplentes. Esses elementos decorrem do estado de endividamento do consumidor no momento da conciliação.

Mas, além deles, deve constar ainda da sentença a determinação para que o consumidor não faça novas transações nem se comporte de modo que possa gerar o agravamento de sua situação de superendividamento. E essa determinação é condicionante: o pacto amigável homologado tem seus efeitos ligados à essa abstenção do consumidor devedor.

Importante realçar que nem todas as dívidas estão sujeitas à repactuação. São excluídas as operações oriundas de dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.

E estão excluídas também aquelas operações celebradas "dolosamente pelo consumidor, que as realizou sem o propósito de realizar o pagamento". Essa situação fatalmente exigirá apuração judicial, nem sempre fácil de executar.

Por fim, a norma deixa claro que o pedido de repactuação não importa em declaração de insolvência civil e que somente poderá ser repetido após decorrido o prazo de 2 (dois) anos, contado da liquidação das obrigações previstas no plano de pagamento orginalmente homologado.

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1 ABC do CDC de 15-7-21, in Migalhas.com.br.