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Os novos limites às ofertas de crédito reguladas no CDC

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Atualizado às 07:57

Continuo a comentar aspectos da lei 14.181, que introduziu no Código de Defesa do Consumidor uma série de normas visando aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispôs sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Cuido, hoje, dos novos limites impostos aos fornecedores na oferta de crédito.

Como mostrei nos comentários anteriores, o CDC já contemplava uma série de comandos para que o fornecedor pudesse oferecer créditos e empréstimos no art. 52. Agora, a regra do art. 54-C fixou alguns novos limites para os fornecedores no anúncio e oferta de crédito.

Começo por essas duas: a) está proibido de indicar que a operação de crédito poderá ser concluída sem consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação da situação financeira do consumidor; b) não pode ocultar nem dificultar a compreensão sobre os ônus e os riscos da contratação do crédito ou da venda a prazo.

A primeira, ainda que possa, de fato, impedir que o consumidor já endividado possa se endividar mais ainda, na prática irá retirar uma forma de entrega de crédito ou empréstimo que aquele que já estivesse numa situação ruim e que pudesse  conseguir levantar  algum dinheiro no mercado ou crédito para alguma compra.

Lembro que era - e sempre foi - risco do fornecedor oferecer crédito para consumidores em situação ruim de crédito. Se um banco quer entregar dinheiro para alguém que é inadimplente, negativado e, também,  que não tem condições de pagar as prestações (antigas e as novas) quem terá grande chance de perder algo é o próprio banco... É verdade que o consumidor se endividará mais. Todavia, conseguiria algum folego para poder tocar sua vida (e o risco, repito, seria integralmente do credor).

Agora, na prática,  essa proibição legal impedirá que o fornecedor ofereça crédito para quem pode estar precisando muito. (O novo art. 54-D, que comentarei na sequência, obriga que seja feita consulta aos bancos de dados de proteção ao crédito). Ora, um consumidor perdeu seu emprego, está doente ou algum familiar seu próximo está, foi negativado etc., não terá alternativa para conseguir dinheiro. Pergunto, como já fiz quando falei do mínimo existencial: Quem é que vai socorrê-lo? Quem irá emprestar dinheiro para ele? Se o risco era de quem oferecia o dinheiro, o tiro saiu pela culatra: foi o consumidor nessas condições que saiu prejudicado.

A segunda proposição é natural para toda e qualquer operação de crédito e empréstimo: o fornecedor não pode mesmo ocultar nem dificultar a compreensão a respeito dos ônus e dos riscos da contratação do crédito ou da venda a prazo.

Outro item trazido expressamente pela nova lei: o fornecedor não pode  "assediar" ou "pressionar" o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito. Definição fortemente subjetiva. O que seria "assédio" para a contratação? Um anúncio publicitário oferecendo conforto? Ou regalias? Ou promessas de uma vida melhor? Difícil dizer.

Do mesmo modo a expressão "pressionar". A caracterização desse tipo de conduta demanda prova do fato. Talvez um vendedor ligando incessantemente para a casa do consumidor e falando, falando, falando que ele deveria contratar...

A norma tem um complemento. Diz que o assédio ou o pressionamento se dará mais fortemente no caso de "consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada ou se a contratação envolver prêmio". Tirando a oferta de prêmio para a consecução do negócio e a do caso do analfabeto, algo simples de se constatar, as outras hipóteses exigem prova do fato de condição: a da doença e a do estado de extrema vulnerabilidade.

Quanto ao idoso, anoto que também se exige prova de uma condição especial de vulnerabilidade do caso específico. Lembro que ser idoso não é ser doente. Este que escreve este texto neste momento é idoso em termos legais e posso garantir que tenho plena capacidade de discernir sobre como devo ou não obter crédito ou empréstimo. Aliás, posso muito bem orientar como se deve fazê-lo e se o legislador agiu bem ou não. Repito: o idoso não é doente apenas porque, por definição legal, seja assim intitulado.

Por fim, nesse ponto, anoto que esse tipo de pratica já está caracterizada como abusiva no inciso IV, do  art. 39 do CDC e de forma menos preconceituosa. Leia-se:

"Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

               (...)

IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;"

Continuando com o art. 54-C, está proibido que seja condicionado o atendimento de pretensões do consumidor ou o início de tratativas à renúncia ou à desistência de demandas judiciais, ao pagamento de honorários advocatícios ou a depósitos judiciais. Até que enfim um ponto objetivo e claro. Mas, nem precisaria ser escrito porque, evidentemente, essa forma de condicionamento é típica prática abusiva enquadrada na hipótese do inciso V do art. 39 acima referido:

"Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

(...)

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;"

No próximo artigo, continuarei os comentários sobre as novas regras.