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Para procuradores que atuaram na Operação Sundown, decisão do STJ de anular interceptações prejudica o interesse público no caso

A Sexta Turma do STJ anulou quase dois anos de interceptações telefônicas no curso de investigações feitas pela Polícia Federal contra o Grupo Sundown, do Paraná. A decisão é inédita no STJ. Até então, o Tribunal tinha apenas precedentes segundo os quais é possível prorrogar a interceptação tantas vezes quantas forem necessárias, desde que fundamentadas.

11/9/2008


Interesse público

Para os procuradores que atuaram na Operação Sundown, decisão do STJ de anular interceptações prejudica o interesse público no caso

A Sexta Turma do STJ anulou quase dois anos de interceptações telefônicas no curso de investigações feitas pela Polícia Federal contra o Grupo Sundown, do Paraná. A decisão é inédita no STJ. Até então, o Tribunal tinha apenas precedentes segundo os quais é possível prorrogar a interceptação tantas vezes quantas forem necessárias, desde que fundamentadas.

As decisões anuladas foram proferidas pelo juiz Titular da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba.

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As decisões que determinaram o monitoramento e sua renovação foram prolatadas explanando as razões que indicavam existir um crime e que lançavam suspeita sobre o titular do terminal telefônico monitorado, ou ainda se fundaram na necessidade de aprofundamento da apuração decorrente dos indícios da prática continuada dos crimes.

O juiz também não deixou de mencionar a gravidade dos crimes em investigação e que era necessário que a apuração se alongasse no tempo em função da complexidade dos crimes praticados e da quadrilha que se articulou para sua efetivação. As decisões, portanto, foram fundamentadas.

E não se tratavam de meras especulações, como bem demonstrou o resultado dos trabalhos. As pessoas investigadas sofreram, em seguida aos monitoramentos, vários processos criminais que lhes imputaram a prática de muito mais de cem crimes, dentre eles delitos de falsidade, descaminho, formação de quadrilha, contra o sistema financeiro nacional e de corrupção.

Os dois empresários do Grupo Sundown que coordenaram os crimes já contavam com mais de 40 anos de condenação cada um. Ainda existem dezenas de outros inquéritos tramitando aguardando conclusão para que, se não fosse a decisão do STJ, fossem intentadas outras ações criminais para responsabilizar aqueles que cometeram os delitos.

Se dos efeitos é possível conhecer a causa, está mais do que evidente que as decisões determinando as interceptações e sua renovação estavam adequadamente fundamentadas.

Cumpre também ressaltar que a legalidade dessas interceptações telefônicas já havia sido analisada pelo juiz e também por três desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que as reputaram regulares, confirmando em segundo grau a condenação de empresários do Grupo Sundown pela corrupção de auditores da Receita, crimes desvelados através dos monitoramentos.

O que ocorreu, singelamente, é que foram constatados crimes às dezenas e foram usados os meios legais para apurá-los na medida do necessário. Se os crimes se repetiram às dezenas, engendrando a necessidade de perpetuação dos monitoramentos, a responsabilidade por isso não é do Estado, mas sim dos investigados.

O que se deve questionar é se existe mesmo a alegada “invasão de privacidade” quando o criminoso:

1. é acusado, recentemente, da prática de mais de 245 crimes – se fôssemos tomar o número de dias em dois anos de monitoramentos, houve acusações à razão de um crime para cada três dias;

2. está sendo investigado em dezenas de inquéritos pela prática de vários outros delitos, dentre eles o de lavagem de dinheiro, destacando-se que no último dia 4 foi recebida pela Justiça nova denúncia pela prática de 67 crimes;

3. é acusado e condenado pela prática do crime de corrupção de agentes públicos, em sentença confirmada pelo Tribunal Regional, segundo a qual os auditores deixaram de tomar em conta, indevidamente, bases tributáveis superiores a R$ 60 milhões;

4. apresentava vários cuidados nas conversas por telefone, chegando a usar codinomes e códigos, fato que obriga a estender o período de monitoramento;

5. usava estratagemas de ocultação e obstrução da descoberta da verdade, empregando testas-de-ferro, laranjas e off-shores nos contratos sociais;

6. é condenado, em apenas três dos processos criminais recentes, a penas que somam entre 45 e 49 anos de prisão, fato que mostra a freqüência e a gravidade dos delitos;

7. sonegou, de acordo com apenas alguns procedimentos tributários concluídos até o momento, mais de R$ 70 milhões, os quais deixaram de reverter em favor da sociedade;

8. evadiu mais de R$ 21 milhões para o exterior e praticou crimes de descaminho que geraram autos de infração de aproximadamente R$ 14 milhões de reais;

9. com franco desrespeito a decisão da mais alta Corte do País (STF) fugiu para o Uruguai, local onde até hoje permanece impune.

A decisão de ontem fez uma escolha: optou tutelar a privacidade de alguns cidadãos, que usavam essa privacidade e seu livre-arbítrio para cometer crimes em proveito próprio e prejuízo de toda a sociedade. Os ministros rejeitaram, ainda, não só o direito de investigação do Estado, mas a própria proteção dos bens jurídicos violados com os crimes, a lisura e probidade na Administração Pública e na condução dos negócios empresariais.

A validade da renovação consecutiva do monitoramento sempre foi admitida e é absolutamente necessária para apurar qualquer crime com razoável complexidade probatória, seja para demonstrar a ocorrência da infração seja para desvelar todos os seus autores. Não sem razão em todas as operações policiais recentes os monitoramentos se desenvolveram por muito mais do que tal prazo, o que não foi – nesses outros casos – fundamento para sua invalidação. Muito menos a resumida fundamentação de decisões foi antes razão para invalidar qualquer processo relativo a tráfico de entorpecentes, roubos ou outros crimes de regra praticados por pessoas pobres e que não freqüentam a alta sociedade.

Conseqüências da decisão - A decisão proferida ontem lançou por terra boa parte de um longo e profundo trabalho conduzido com extrema seriedade por agentes do Ministério Público, da Polícia, da Receita e da Justiça Federais. Ainda será devidamente aquilatado o que poderá ser salvo e o que está perdido, mas certamente restarão prejudicados processos criminais, inclusive de corrupção de servidores públicos, dezenas de inquéritos policiais e investigações desmembradas que apuram crimes gravíssimos, autos de infração por sonegação fiscal e bloqueios de recursos que hoje somam mais de R$ 100 milhões, valores que serviriam para indenizar, ainda que parcialmente, o Estado.

Não há recurso eficiente a ser manejado para revisar a decisão.

Deltan Martinazzo Dallagnol e Orlando Martello Junior

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