Ocorrência
TJ/PA rejeita abertura de PAD contra magistrada no caso da adolescente de Abaetetuba que ficou presa em cela com homens
Por maioria de votos, o Pleno do TJ/PA decidiu pela não instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar contra a juíza Clarice Maria de Andrade, em virtude de ocorrência que a envolveu quando titular da 3ª Vara Criminal da Comarca de Abaetetuba. Os julgadores entenderam não haver motivos que fundamentassem a instauração de PAD, uma vez que a magistrada não poderia ser responsabilizada pela presença da adolescente L. S. P em uma cela da Delegacia de Abaetetuba juntamente com presos do sexo masculino, considerando que a responsabilidade administrativa pela custódia do preso é do Estado.
Na votação, 15 desembargadores opinaram pela não instauração de PAD, contra sete votos favoráveis à abertura e uma abstenção. A desembargadora presidente, Albanira Bemerguy, ofereceu voto escrito, que leu ao plenário, opinando pela abertura do PAD, sem afastamento da juíza.
Votaram pela não instauração os desembargadores Maria Helena Ferreira, Sônia Parente, Rosa Portugal, Eronides Primo, Vânia Fortes, Raimundo Holanda, Maria Rita Xavier, Brígida Gonçalves, Maria de Nazaré Gouveia, Ricardo Nunes, Marneide Merabet, Cláudio Montalvão, Maria do Carmo Araújo, Maria de Nazaqré Saavedra e Dahil Paraense.
Pela abertura do PAD, votaram os desembargadores Albanira Bemerguy, Raimunda do Carmo Noronha, Luzia Nadja Nascimento, João Maroja, Eliana Abufaiad, Constantino Guerreiro e Célia Regina Pinheiro. A desembargadora Vânia Silveira absteve-se de votar. Os demais integrantes do Colégio de Desembargadores estiveram ausentes da sessão, por motivos justificados.
Entre as manifestações pelo voto favorável à abertura do PAD, foi destacado que o processo seria uma oportunidade para definir responsabilidades pelos acontecimentos envolvendo a menor, em Abaetetuba, inclusive para que a própria magistrada tivesse nova oportunidade de explicar a sua participação no episódio. Quanto aos magistrados que votaram pela não abertura, predominou o entendimento de que não havia no processo razões que os convencessem a julgar ao contrário.
Na abertura da apreciação da representação do Conselho, a presidente do TJ, desembargadora Albanira Bemerguy, deu ciência aos demais desembargadores sobre o teor do ofício encaminhado pela Polícia Federal, dando conta de que não existe qualquer investigação na instituição a respeito do episódio relativo à Abaetetuba. Na semana passada, a apreciação da representação foi adiada para que fosse verificada a procedência de notícia divulgada em jornal da cidade, segundo a qual haveria uma suposta investigação sigilosa pela PF de que o episódio em Abaetetuba teria sido produzida por alguma organização criminosa para desmoralização da Polícia e da Justiça.
O pedido de instauração de PAD constou de representação do Conselho da Magistratura que, por sua vez, acolheu pedido de representação formulado pela Corregedoria do Interior contra a juíza, através do titular, desembargador Constantino Guerreiro. A representação foi encaminhada ao Pleno, que é o órgão competente pela instauração de PAD contra magistrado.
De acordo com os autos do procedimento, no final do ano passado, a Corregedoria do Interior procedeu correição na 3ª Vara Criminal, visando apurar possível responsabilidade sobre a prisão da adolescente na Delegacia do Município juntamente com vários homens. A correição gerou sindicância contra a magistrada, concluindo-se pelo seu suposto envolvimento no episódio. No entendimento do corregedor e do Conselho, a juíza teria infringido normas previstas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional, no Código Judiciário do Estado do Pará e de Resolução do CNJ, bem como não teria dado cumprimento a determinações previstas em Provimentos da Corregedoria do Interior, nos procedimentos referentes à prisão da adolescente.
Dentre os provimentos que não teriam sido cumpridos pela magistrada está o Provimento nº 004/2007-CJCI, que dispõe sobre a prioridade de tramitação do processo criminal relativo a réu preso provisório, procedimentos e prazos a serem observados pelos magistrados e servidores do interior, e do provimento nº 001/2007-CJCI, que regulamenta a transferência e recambiamento de presos provisórios, que, de acordo com ato regimental, depende de autorização da Corregedoria.
Conforme a defesa da magistrada, a informação de prisão da adolescente foi encaminhada pela autoridade policial apenas no dia 7 de novembro, 17 dias após a efetivação da prisão. No documento, a autoridade policial solicitava a transferência da detenta em caráter de urgência, considerando a situação de risco, mas não dava conta de que ela estava em uma mesma cela com presos do sexo masculino. No mesmo dia 7, segundo a defesa da magistrada, a juíza despachou o pedido, determinando ao diretor de secretária da 3ª Vara, o envio de pedido de autorização para a Corregedoria de Justiça do Interior, o qual só foi emitido no dia 20 de novembro.
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Confira abaixo a íntegra do voto da desembargadora Albanira Lobato Bemerguy.
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“Da análise minuciosa dos autos de representação formulada pela douta Corregedoria de Justiça, acolhida pelo Egrégio Conselho da Magistratura e ora em apreciação pelo Tribunal Pleno, emergem culpas genéricas e pontuais que passo a apontar.
No caso sub-judice há necessidade de serem pesquisados os limites das culpas pontuais e das culpas genéricas, daí porque tramitam uma sucessão de inquéritos apurando fatos ocorridos na carceragem da delegacia de policia do município de Abaetetuba a quando da prisão de uma mulher em cela com presos do sexo masculino, que envolveram autoridades e servidores da área policial, judiciária e Ministério Público (órgão fiscal da lei).
Do exame das peças saltam aos olhos dúvidas e controvérsias sobre: datas; circunstâncias com relação as várias detenções de Lidyane, configurando um ciclo vicioso sem solução jurídica; condições da carceragem; a eficiência das visitas carcerárias pelas autoridades competentes e até mesmo quanto a análise técnico-jurídica do flagrante levado a apreciação da magistrada.
Neste particular cumpre-me destacar algumas considerações fáticas e legais que somente em sede de Processo Administrativo Disciplinar poderão ser avaliadas quanto a observância por parte da magistrada representada, senão vejamos.
Depreende-se dos autos de Representação que a magistrada no dia 23/10/2007 recebeu a comunicação da prisão em flagrante e a manteve, ficando ciente naquela ocasião que uma mulher estava presa na Delegacia de Abaetetuba onde, conforme inspeção realizada pela magistrada, não existia cela própria para prender mulheres, mas, tão somente, um espaço menor agregado a um outro maior. À respeito, o art. 82, parágrafo 1º da Lei 7210/84 (Lei de Execução Penal) dispõe que a mulher deverá ser recolhida, separadamente, em local próprio e adequado as suas condições pessoais.
Verifica-se, ainda, que de acordo com o art.310, § único do CPP a autoridade judiciária competente deverá em caso de prisão em flagrante conceder a liberdade provisória quando presentes os requisitos legais independentemente de fiança por se tratar de um direito subjetivo do réu e não uma mera faculdade. O crime imputado a Lidiane foi o tipificado no art.155 c/c art.14, inciso II do Código Penal, que é o furto na modalidade tentada. É crime afiançável, inclusive, consoante o art.323 do CPP, cabendo, portanto, o arbitramento de fiança. Além do que o art.350 do CPP autoriza até mesmo a liberdade provisória sem o pagamento de fiança em caso de pobreza. Por fim, disposições constitucionais (art.5º, LXV, LXVI) garantem a liberdade do indivíduo em havendo ilegalidade ou possibilidade de liberdade provisória com ou sem fiança.
A observância destes dispositivos, dentre outros, por parte da magistrada, precisa ser averiguada no PAD, até porque é mandamento legal, art. 35, inciso I e III da LOMAN, que o magistrado dê cumprimento às disposições legais, ato de ofício e atos processuais.
Há imputações, também, a servidores vinculados à pseudo-negligência da magistrada representada, apontando violação a princípios da legalidade e impessoalidade, que devem resguardar a instituição, razão pela qual entendo como um dever a instauração de um processo administrativo disciplinar.
É também latente nos autos indícios de que, em torno dos atos de enviar o ofício para Corregedoria, solicitando a autorização de transferência da presa, e o de recebimento do mesmo, pairam muitas dúvidas, em especial, quanto ao lançamento de datas. Isso é explorado no bojo da Sindicância e na própria defesa da magistrada, outra razão para a abertura de Processo Administrativo Disciplinar.
Ademais, frise-se, estamos no século XXI, na era dos avanços tecnológicos de comunicação, como o aparelho de celular, o que possibilitaria imediata comunicação com a Corregedoria, Presidência e respectivos auxiliares.
No referido ofício 870/07, de 05/11/07, restou dito que a presa estava custodiada com outros detentos, correndo risco de sofrer todo e qualquer tipo de violência por parte dos demais, informação que por si só exigiria diligenciamento minucioso e até a presença da magistrada na carceragem para saber da real situação da presa, independentemente da resposta da Corregedoria do Interior, justificando, mais uma vez a apuração solicitada.
Ressalto, ainda, que há procedimentos instaurados perante a Corregedoria Geral da Polícia Civil, Ministério Público e Câmara Federal, logo, seria, a meu ver, constrangedor que o Poder Judiciário que representamos se esquivasse ao cumprimento de suas atribuições, o que, certamente, ensejará a avocação dos autos para apuração devida por órgãos alheios a este Poder.
Isto posto, confiando no elevado desempenho desta Corte de Justiça, voto, nos termos do art.49, inciso XXV do RITJE pela abertura do Processo Administrativo Disciplinar em face da magistrada Clarice Maria de Andrade, sem o seu afastamento, eis que não podemos deixar de registrar o reconhecimento a relevantes serviços prestados a instituição pela MM Juíza representada.
É como voto, conste dos autos.
Desa. Albanira Lobato Bemerguy
Presidente do E.TJ/PA”
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