Em um comício realizado no Madison Square Garden, em Nova York, que marcou o início da reta final de sua campanha eleitoral, Donald Trump prometeu a pena de morte para imigrantes que cometam crimes contra americanos. O evento, que aconteceu no último domingo, 27, reuniu milhares de apoiadores e teve uma série de discursos carregados de ataques contra imigrantes e provocações a redutos democratas.
A ideia, vista como uma medida desproporcional e juridicamente inexequível, reforça a retórica acalorada da campanha de Trump, que disputa a presidência com Kamala Harris nas eleições de 2024. Especialistas apontam que a proposta, além de suscitar questões éticas, enfrenta grandes barreiras legais dentro da estrutura federativa americana.
Nos Estados Unidos, a aplicação da pena de morte é uma decisão estadual, com cada um dos Estados mantendo a autonomia sobre os critérios para sua utilização. Atualmente, 27 Estados ainda permitem a pena capital, enquanto o restante do país a proíbe ou possui moratórias.
De acordo com Daniel Toledo, advogado que atua na área do Direito Internacional, fundador da Toledo Advogados Associados, escritório de advocacia internacional com unidades no Brasil e nos Estados Unidos, mesmo onde permitida, a pena de morte é reservada a crimes considerados extremamente graves, como homicídios com agravantes, tortura e homicídios múltiplos.
“Aplicá-la a crimes cometidos por imigrantes, como sugerido por Trump, seria uma violação dessa limitação e contradiz o funcionamento do sistema jurídico dos Estados Unidos.”
Para aplicar a pena de morte em um caso envolvendo um imigrante, o processo teria que passar por um julgamento onde fossem aplicadas as diretrizes de crimes de primeiro grau, o que raramente seria o caso em crimes menores ou menos violentos.
“Por isso, a fala de Trump ignora o fato de que o sistema penal americano não permite uma punição severa como essa para crimes que não envolvem intencionalidade, como homicídios culposos, ou em casos onde o crime não seja diretamente relacionado a uma ação dolosa.”
A ilusão da aplicação Federal e as complexidades jurídicas
Mesmo em uma eventual vitória eleitoral, a implementação de uma proposta como a de Trump enfrentaria barreiras substanciais. O sistema federativo americano é estruturado de maneira que os Estados possuem um elevado grau de independência em questões penais. Para que a pena de morte para imigrantes fosse implementada, seria necessário um processo legislativo complexo, incluindo a aprovação no Congresso e uma adaptação das legislações estaduais.
“Na prática, cada Estado teria o poder de aprovar ou vetar a medida, especialmente em regiões onde a pena de morte é proibida.”
Para o advogado, a realidade do sistema judicial americano também impõe limitações à aplicação de mudanças abruptas.
“Mesmo no caso de crimes Federais, a pena de morte só é permitida em circunstâncias muito específicas, como espionagem, terrorismo ou homicídio de autoridades Federais. Crimes comuns cometidos por imigrantes dificilmente se enquadram nessas categorias, tornando a proposta de Trump juridicamente inviável.”
Eleições e a retórica da polarização
A declaração de Trump intensifica um ambiente de polarização e, para Toledo, incita sentimentos de ódio e desconfiança entre a população. “Essa retórica pode impactar as relações comunitárias e criar uma divisão ainda maior entre os americanos e a comunidade de imigrantes. Para muitos, trata-se de uma promessa vazia que, ao explorar temas de alta sensibilidade, busca atrair o voto de eleitores mais radicais”, lamenta.
As campanhas eleitorais são marcadas por promessas impactantes, mas irrealizáveis. “O debate sobre a aplicação da pena de morte para imigrantes é um exemplo de como a retórica política pode distorcer a percepção pública sobre temas complexos, criando expectativas que não condizem com a realidade jurídica e legislativa”, relata.
Adote uma análise crítica no período eleitoral
Toledo acredita que, independentemente da posição política, compreender as limitações e implicações das promessas de campanha é essencial para que o voto seja consciente e alinhado com os valores democráticos. “Esse cenário reforça que o discurso eleitoral muitas vezes é construído mais para causar impacto imediato do que para propor soluções reais”, finaliza.