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TJ/MG: Relação de consumo exige tentativa extrajudicial antes da Justiça

Tese fixada em IRDR valerá para todas as demandas semelhantes no Tribunal mineiro.

14/10/2024

Nas ações de natureza prestacional das relações de consumo, a caracterização do interesse de agir depende da comprovação da prévia tentativa de solução extrajudicial da controvérsia. Assim decidiu a 2ª seção Cível do TJ/MG, ao fixar tese em IRDR – incidente de resolução de demandas repetitivas.

A decisão surgiu da análise sobre a necessidade de uma etapa prévia de autocomposição antes da propositura de ações judiciais, à luz do direito de acesso à justiça e da inafastabilidade da jurisdição.

A tese fixada pelo TJ/MG estabelece que, para que o consumidor tenha interesse de agir em juízo, é necessária a tentativa de resolução extrajudicial por meio de canais oficiais, como SAC - Serviço de Atendimento ao Consumidor, Procon, Banco Central ou plataformas públicas e privadas, como o consumidor.gov e Reclame Aqui. A ausência dessa comprovação poderá resultar na extinção do processo sem julgamento do mérito.

TJ/MG define que consumidor deve provar busca por solução extrajudicial antes de ir à Justiça.(Imagem: Freepik)

Além disso, a decisão prevê que, nos casos em que o fornecedor não responder à reclamação dentro de um prazo de dez dias úteis, a ausência de resposta configura o interesse de agir, permitindo que o consumidor busque seus direitos no Judiciário.

Também foi estabelecido que, em situações de risco de perecimento de direito, como o iminente transcurso de prazo prescricional, o consumidor poderá entrar diretamente com a ação, desde que comprove a tentativa de solução extrajudicial no prazo de até 30 dias após a decisão sobre a concessão de tutela de urgência.

A tese fixada no IRDR ainda aborda a necessidade de adaptação das partes envolvidas em processos ajuizados antes da publicação desta decisão, prevendo um prazo para que o consumidor emende a inicial com as devidas comprovações.

Veja a íntegra da tese fixada:

(i) A caracterização do interesse de agir nas ações de natureza prestacional das relações de consumo depende da comprovação da prévia tentativa de solução extrajudicial da controvérsia. A comprovação pode ocorrer por quaisquer canais oficiais de serviço de atendimento mantido pelo fornecedor (SAC); pelo PROCON; órgão fiscalizadores como Banco Central; agências reguladoras (ANS, ANVISA; ANATEL, ANEEL, ANAC; ANA; ANM; ANP; ANTAQ; ANTT; ANCINE); plataformas públicas (consumidor.gov) e privadas (Reclame Aqui e outras) de reclamação/solicitação; notificação extrajudicial por carta com Aviso de Recebimento ou via cartorária. Não basta, nos casos de registros realizados perante o Serviços de Atendimento do Cliente (SAC) mantido pelo fornecedor, a mera indicação pelo consumidor de número de protocolo.

(ii) Com relação ao prazo de resposta do fornecedor à reclamação/pedido administrativo, nas hipóteses em que a reclamação não for registrada em órgãos ou plataformas públicas que já disponham de regramento e prazo próprio, mostra-se razoável a adoção, por analogia, do prazo conferido pela Lei nº. 9.507/1997 (“Habeas Data”), inciso I, do parágrafo único do art. 8º, de decurso de mais de 10 (dez) dias úteis sem decisão/resposta do fornecedor. A partir do referido prazo sem resposta do fornecedor, restará configurado o interesse de agir do consumidor para defender os seus direitos em juízo.

(iii) Nas hipóteses em que o fornecedor responder à reclamação/solicitação, a referida resposta deverá ser carreada aos documentos da petição inicial, juntamente com o pedido administrativo formulado pelo consumidor.

(iv) A exigência da prévia tentativa de solução extrajudicial poderá ser excepcionada nas hipóteses em que o consumidor comprovar risco de perecimento do direito alegado (inclusive na eventualidade de iminente transcurso de prazo prescricional ou decadencial), situação em que o julgador deverá aferir o interesse de agir de forma diferida. Nesses casos, caberá ao consumidor exibir a prova da tentativa de solução extrajudicial em até 30 (trinta) dias úteis da intimação da decisão que analisou o pedido de concessão da tutela de urgência, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC.

(v) Nas ações ajuizadas após a publicação das teses fixadas no presente IRDR, nas quais não exista comprovação da prévia tentativa extrajudicial de solução da controvérsia e que não haja pedido expresso e fundamentado sobre a excepcionalidade por risco de perecimento do direito, recebida a inicial e constatada a ausência de interesse de agir, a parte autora deverá ser intimada para emendar a inicial de modo a demonstrar, no prazo de 30 dias úteis, o atendimento a uma das referidas exigências. Decorrido o prazo sem cumprimento da diligência, o processo será extinto sem julgamento de mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC.

(vi) Com relação à modulação dos efeitos da tese ora proposta, por questão de interesse social e segurança jurídica (art. 927, §3º do CPC c/c art. 46 da Recomendação n. 134/ 2022 do CNJ), nas ações ajuizadas antes da publicação das teses fixadas no presente IRDR, o interesse de agir deverá ser analisado casuisticamente pelo magistrado, considerando-se o seguinte: a) nas hipóteses em que o réu ainda não apresentou contestação, constatada a ausência do interesse de agir, a parte autora deverá ser intimada para emendar a inicial (art. 321 do CPC), nos termos do presente IRDR, com o fim de coligir aos autos, no prazo de 30 dias úteis, o requerimento extrajudicial de solução da controvérsia ou fundamentar o pleito de dispensa da prévia comprovação do pedido administrativo, por se tratar de situação em que há risco de perecimento do direito. Quedando-se inerte, o juiz julgará extinto o feito sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC. b) nas hipóteses em que já houver contestação nos autos, tendo sido alegado na peça de defesa fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito do autor (art. 373, II, do CPC), restará comprovado o interesse de agir.

Caso concreto

O processo que deu origem ao IRDR envolveu uma consumidora que ajuizou ação contra instituições financeiras alegando cobranças indevidas e buscando a revisão de contratos bancários.

A controvérsia surgiu em torno da necessidade de comprovar a tentativa prévia de solução extrajudicial, como reclamações ao Procon ou pelo SAC, antes de ingressar com a ação judicial.

O TJ/MG reconheceu que havia divergências sobre esse tema nas decisões de primeira instância, o que motivou a instauração do IRDR.

Ao final, foi decidido que, na ausência de comprovação da tentativa de resolução extrajudicial, o interesse de agir não se configura, resultando na extinção do processo sem julgamento de mérito.

No caso específico, como a consumidora não apresentou essa comprovação, a ação foi extinta, consolidando o entendimento estabelecido na tese jurídica fixada pelo Tribunal.

Os advogados Rafael Barroso Fontelles, Renato Faig, Clarissa Machado e Gabriel Melo, do escritório Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça & Associados, atuaram na causa.

Leia o acórdão.

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