O plenário do CNJ aplicou pena de disponibilidade, por 60 dias, à juíza Maria Youssef Murad Venturelli, do TJ/MG, por postagens de teor político-partidário feitas após os atos golpistas de 8 de janeiro.
Para o colegiado, “demonstrar apreço ou desapreço a candidatos, lideranças políticas e partidos políticos também são condutas vedadas”.
O que é pena de disponibilidade aplicada a juízes?
A pena de disponibilidade aplicada a juízes é uma sanção disciplinar prevista na legislação brasileira para magistrados que cometeram infrações funcionais graves. Quando um juiz é colocado em disponibilidade, ele é afastado de suas funções jurisdicionais e administrativas, mas continua a receber parte de sua remuneração.
Essa medida não é definitiva e o magistrado pode ser reintegrado ao cargo após um período de tempo, dependendo da avaliação de sua conduta durante o afastamento. Durante a disponibilidade, o juiz fica impedido de exercer suas funções judiciais e de participar de qualquer atividade que possa comprometer a integridade do Judiciário.
Entenda o caso
O CNJ recebeu uma denúncia de que a magistrada publicava, em suas redes sociais, textos e vídeos de cunho político-partidário. As publicações continham críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma delas intitulada “revoltante, PT propõe projeto Zanin para garantir a impunidade no Brasil”.
A magistrada também compartilhou um vídeo em que uma mulher afirma que o presidente da Islândia viajou até Londres para a coroação do Rei Charles em um voo comercial. Ao divulgar o conteúdo, a juíza escreveu: “Lição não aprendida pelos nove dedos”.
Veja as publicações:
Em defesa, Maria assumiu ter feito as publicações, porém afirmou que elas não se caracterizam como atividade político-partidária e que não tinha a intenção de depreciar a imagem de qualquer pessoa.
Ressaltou que não tinha conhecimento razoável de como operar suas redes sociais e retirou as postagens com ajuda de seu gabinete, uma vez que tem pouco manejo das plataformas.
Decisão
Ao avaliar a ação, a relatora do caso, conselheira Renata Gil, não acatou a defesa da juíza ao concluir que Maria demonstrou aptidão ao publicar conteúdo e inclusive acrescentar legendas às postagens.
“Isso indica que, mesmo não sendo uma usuária experiente, possui habilidades fundamentais para se comunicar e disseminar informações nessas plataformas.”
O argumento de que as publicações não têm viés político também não foi aceito pela relatora, que concluiu que o “posicionamento político-partidário da requerida é facilmente identificado ao se ler os prints".
Nesta linha, pontuou que “demonstrar apreço ou desapreço a candidatos, lideranças políticas e partidos políticos também são condutas vedadas”.
“É importante ressaltar que a conduta do magistrado, na condição de órgão do Poder Judiciário, não diz respeito apenas a si mesmo, mas se confunde com a do poder que representa. Portanto, o magistrado possui o dever de sobriedade.”
Mediante o exposto, a relatora aplicou a pena de advertência, ao levar em conta que, embora o fato da magistrada ter 72 anos e não ser uma usuária experiente não sejam elementos capazes de afastar, por si sós, a caracterização da infração funcional, devem, sim, ser considerados como circunstância atenuante no caso em apreço.
“Tais argumentos, incabíveis para nativos digitais, merecem ponderação dos julgadores quanto ao comportamento e desenvoltura das pessoas idosas nas redes sociais.”
O voto da relatora foi acompanhado pelos conselheiros Caputo Bastos e Alexandre Teixeira.
Leia o voto da relatora.
Voto divergente
Abrindo divergência da relatora, o conselheiro Luis Felipe Salomão concordou com a relatora quanto à procedência do PDA, porém divergiu quanto à dosimetria da pena.
Para Salomão, a penalidade mais branda aplicada pela relatora “parece destoar do entendimento deste Conselho Nacional de Justiça acerca da penalidade a ser aplicada”.
Segundo o conselheiro, o colegiado deve seguir jurisprudência já estabelecida pelo CNJ.
“Em matéria disciplinar, para evitar subjetivismo e insegurança jurídica, a observância dos precedentes e de regras objetivas claras são imprescindíveis ao processo administrativo. Por isso, no caso vertente, não me parece possível nem razoável, com a devida vênia, criar qualquer exceção ou distinção aos precedentes anteriores.”
Dessa forma, o conselheiro votou pela penalidade de disponibilidade por 60 dias, tendo a maioria seguido seu entendimento.
Seguiram o corregedor o presidente do CNJ, Luís Roberto Barroso, e os conselheiros José Edivaldo Rocha Rotondano, Mônica Autran Machado Nobre, Daniela Pereira Madeira, Guilherme Feliciano, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Santos Schoucair, Dayane Nogueira de Lira e Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho.
Leia o voto de Luis Felipe Salomão.
- Processo: 0005551-82.2023.2.00.0000