O plenário do TSE começou a julgar nesta terça-feira, 24, duas Aijes e uma RepEsp contra o ex-presidente da República e então candidato à reeleição nas Eleições 2022, Jair Bolsonaro, e o candidato a vice na chapa, Walter Souza Braga Netto. As ações apontam suposta prática de abuso de poder político e econômico, uso indevido dos meios de comunicação e conduta vedada nas comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil.
As Aijes 0600972-43 e 0600986-27 pedem a inelegibilidade dos candidatos por desvio de finalidade eleitoreiro, e a RepEsp 0600984-57 requer a condenação de ambos por conduta vedada no uso de bens e servidores públicos nos atos realizados em 7 de setembro do ano passado.
Argumentos da acusação
Após a leitura do relatório pelo corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, os advogados de acusação e de defesa apresentaram as respectivas alegações.
O advogado do Partido Democrático Trabalhista, autor da Aije 0600972-43, Walber de Moura Agra, sustentou haver um caráter sistêmico de infrações cometidas por Bolsonaro com o uso de trio elétrico, carro aberto, motociata e comício. Segundo o jurista, tanto em Brasília/DF como no Rio de Janeiro/RJ, era possível ir a pé do desfile cívico até o comício de campanha, demonstrando que não houve separação entre os eventos institucional e eleitoral, o que foi feito apenas com a retirada da faixa presidencial e o deslocamento a local próximo.
Ao citar transmissão feita pela TV Brasil, da EBC, o advogado afirmou que o então presidente, pela manhã, no Palácio do Planalto, convocou a população e falou em cadeia pública de televisão com caráter eleitoral. Além disso, segundo ele, houve gasto elevado do governo Federal com o evento e com a divulgação institucional. “É desvio de finalidade da coisa pública. O mandatário utilizou bens públicos para angariar votos”, ressaltou.
Representando a candidata à Presidência da República nas Eleições 2022 Soraya Thronicke, autora da Aije 0600986-27 e da RepEsp 0600984-57, a advogada Marilda de Paula Silveira afirmou que houve desvio de finalidade do evento institucional do 7 de setembro. De acordo com ela, a realização dos atos com o mesmo modus operandi teve diferença de “metros e minutos”, usando um apoio de poder e de força que não é do candidato, mas sim do Estado.
Ela citou 10 razões para justificar o ajuizamento da Aije e da Representação, tais como a divulgação do evento oficial na propaganda eleitoral gratuita dos então candidatos e a entrevista com viés eleitoral veiculada na TV Brasil após o evento. De acordo com a advogada, tentou-se fundir ato oficial com ato de campanha.
Argumentos da defesa
Atuando na defesa conjunta de Bolsonaro e Braga Netto, o advogado Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, quanto às questões preliminares, argumentou que as Aijes e a Representação Especial deveriam ter tramitação e votação conjuntas, com julgamento único. A partir desse entendimento, requereu a reabertura da fase instrutória, para colher depoimentos que haviam sido indeferidos no curso do processo.
Afirmou que a equipe de campanha de ambos os candidatos, em medida saneadora “imediata”, removeu conteúdos de suas redes sociais relativas aos eventos de 7 de setembro, cumprindo decisão do relator proferida em medida liminar.
Quanto ao mérito, o advogado sustentou haver uma participação tradicional de Bolsonaro em eventos políticos relativos à Independência do Brasil. A defesa afirmou, ainda, serem momentos diversos entre si uma fase do dia em que Bolsonaro atuava como presidente da República e outra em que agia como candidato.
A contestação conjunta citou depoimentos dos governadores do Rio de Janeiro e do Distrito Federal para reiterar a separação clara dos eventos oficiais dos eleitorais no 7 de setembro, apontando tanto que gastos com uma motociata foram custeados pela campanha dos investigados no Rio, quanto que Bolsonaro, após a cerimônia oficial, discursou em um trio elétrico em Brasília em uma manifestação organizada por apoiadores.
Por fim, mencionando que o então presidente, afastado fisicamente dos atos oficiais, se dirigiu a veículos particulares e sem a faixa presidencial, o advogado pediu ao TSE que julgue improcedente as ações, diante “da ausência da prática de qualquer ato abusivo”. No entender do advogado, caso haja alguma condenação, que ela seja limitada à aplicação de multa.
Parecer da PGE
Ao apresentar o parecer da procuradoria-Geral Eleitoral, o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, elencou diversas ocorrências que evidenciam a “mistura do oficial e do eleitoreiro nos eventos de comemoração ao Bicentenário da Independência”.
Segundo a PGE, tanto em Brasília como no Rio de Janeiro, houve estratégia de fusão dos eventos oficiais de desfiles militares e de ritos institucionais com os atos de campanha do investigado, realizados na vizinhança imediata e em que foram proferidos discursos de conteúdo eleitoral.
“A presença do presidente da República nas cerimônias oficiais, naqueles instantes tão rentes ao sufrágio por acontecer, foi acompanhada de atos de iniludível envergadura eleitoral, levados a cabo logo depois”, indica o parecer, que acrescenta que todo o aparato dos eventos oficiais foi usado em prol da campanha do candidato em busca da reeleição.
Segundo Gonet Branco, o desvio de finalidade evidenciado no uso da estrutura pública para obter vantagem eleitoral é um elemento do tipo de abuso de poder político. Entretanto, de acordo com ele, não há prova da participação e da anuência de Braga Netto sobre os fatos. Por isso, a PGE opina pela decretação de inelegibilidade apenas a Bolsonaro, bem como pela aplicação de multa em razão do uso de bens e de pessoal da Administração Pública durante os eventos.
Informações: TSE.