O desembargador Ricardo Dip, do Órgão Especial do TJ/SP, suspendeu parte de uma lei promulgada no município de Santo André, no ABC Paulista, que veta a realização de abortos mesmo em casos já previstos pela legislação. A norma 10.702/23 foi sancionada no início de setembro, após a Câmara Municipal derrubar o veto do prefeito Paulo Serra.
Na petição inicial, o PSOL defendeu que a lei possuía uma série de vícios e inconstitucionalidades que impedem sua validade e sua eficácia. Um dos vícios citados no processo é a usurpação da competência do Executivo para legislar sobre o regime jurídico de servidores.
Ainda segundo o partido, a lei incorre em inconstitucionalidade material por violação do Pacto Federativo, posto que, ao legislar extrapolando sua competência de regulamentação suplementar, invade a seara de entes federativos, em violação aos art. 30, I e II e art. 198 da CF, e ao art. 144 da Constituição Estadual de São Paulo.
Ao avaliar a ação, o relator do caso, desembargador destacou que o art. 1º da lei impõe a vedação de política pública que incentive ou promova a prática do aborto, uma vez que o procedimento é constitucional em alguns casos.
"Dá-se que o SUS, em âmbito nacional, tem entendido executável o aborto em dadas hipóteses, tendo mesmo editado uma Norma técnica sobre prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes. Desta maneira, há aparente vício competencial dizer, de forma na edição de preceito, contrário à normativa nacional, emanado de município, tal o que ocorre no caso destes autos."
Além disso, o desembargador suspendeu o art. 3º, que versa sobre punições a servidores públicos. Segundo o relator, é competência do Executivo legislar sobre o regime jurídico de servidores.
Por outro lado, Dip não vislumbrou problemas quanto ao art. 2º da lei, que se destina a vedar o incentivo, a instigação ou o estímulo da prática de abortamento.
"O aborto é crime (arts. 124 a 127 do CP); sua instigação, auxílio, ajuste, concurso delitual (art. 31 do mesmo Código); o que diz o texto do art. 128 do Código penal é que o aborto, praticado por médico, não se pune, nas duas hipóteses que ali se elencam."
LEI Nº 10.702, DE 4 DE SETEMBRO DE 2023
O Presidente da Câmara Municipal de Santo André, no uso de suas atribuições legais e nos termos do artigo 46, parágrafo 7º da Lei Orgânica do Município de Santo André, promulga a seguinte lei:
PROJETO DE LEI CM Nº 5/2023
AUTOR: VEREADOR MARCIO COLOMBO – PSDB.
PROÍBE A PROMOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, CAMPANHAS OU MANIFESTAÇÕES DE QUALQUER NATUREZA QUE INCENTIVEM A PRÁTICA DO ABORTO, POR QUALQUER DOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA, INDIRETA E DAS AUTARQUIAS NO MUNICÍPIO DE SANTO ANDRÉ.
A Câmara Municipal de Santo André decreta:
Art. 1º Fica proibida a instituição de qualquer política pública pelos órgãos da administração pública direta, indireta ou autarquias do Município de Santo André que incentive ou promova a prática do aborto, mesmos aqueles descritos no art. 128 e seus incisos do Decreto-Lei No 2.848, de 7 de dezembro de 1940.
- Termo "ou promova" encontra-se com eficácia suspensa por força de medida cautelar deferida em 02/10/2023 pelo Tribunal de Justiça nos autos das ADIs nº 2254531-18.2023.8.26.0000 e 2262392-55.2023.8.26.0000.
Art. 2º É proibido à Administração Pública Municipal direta, indireta ou autárquica promover campanhas ou manifestações que incentivem, instiguem ou estimulem a prática de qualquer tipo de interrupção de gravidez.
Art. 3º O agente público que descumprir a legislação terá processo administrativo disciplinar aberto contra si para apuração de responsabilidade e aplicação de penalidade proporcional.
- Artigo 3º encontra-se com eficácia suspensa por força de medida cautelar deferida em 02/10/2023 pelo Tribunal de Justiça nos autos das ADIs nº 2254531-18.2023.8.26.0000 e 2262392-55.2023.8.26.0000.
Art. 4º Essa lei entra em vigor na data de sua publicação.
Câmara Municipal de Santo André, 4 de setembro de 2023, 470º ano da fundação da cidade.
CARLOS ROBERTO FERREIRA
Presidente
Registrada e digitada na Coordenadoria de Comunicações Administrativas e publicada.
RAFAEL LOPES PINTO DA SILVA
Diretor Geral
- Processo: 2262392-55.2023.8.26.0000
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