Ministro Humberto Martins, do STJ, manteve decisão que obriga a Rede Globo a indenizar família adotiva de crianças de Monte Santo/BA, caso que ficou conhecido em 2011. O valor da indenização fixado pelo TJ/SP foi de R$ 300 mil.
A história começou em 2011, quando, no interior da Bahia, cinco irmãos foram retirados dos pais biológicos por ordem judicial expedida pelo juiz Vitor Manoel Xavier Bezerra com base em documentos apresentados pelo Conselho Tutelar de Monte Santo e com o aval do Ministério Público por acusações de maus-tratos.
As crianças – na época, com idades entre 2 meses e 8 anos – foram direcionadas para quatro famílias da RMC - Região Metropolitana de Campinas que já estavam devidamente habilitadas na comarca de Monte Santo para a adoção, já que nenhum familiar tinha condições de acolher os cinco irmãos.
Um ano depois, começou o problema. Por meio de uma matéria jornalística veiculada pelo Fantástico em 2012, as famílias foram acusadas de fazer parte de uma quadrilha de tráfico de crianças; na matéria, a mãe e o pai biológico, já separados, alegaram não haver abandonado os filhos e que os queriam de volta.
O juiz Luis Roberto Cappio Pereira, de Monte Santo, determinou, então, que as cinco crianças adotadas retornassem à mãe biológica na Bahia.
Os pais adotivos não desistiram das crianças e, também, de provar a sua inocência nesse caso. Foi então que, em 2015, outra notícia veio à tona: a mãe biológica das crianças procurou o SBT para contar a sua versão da história. Na reportagem, ela afirmava que se arrependia de ter reivindicado os direitos da guarda das crianças e que gostaria de devolvê-las às famílias substitutas. Na mesma reportagem, que foi ao ar no dia 26 de maio de 2015, ela alegou que as crianças estavam com o pai e que ela temia que o pior pudesse acontecer.
A Justiça autorizou o retorno das crianças, que também foi televisionado, comprovando que as famílias não tiraram as crianças à força da primeira vez, como dito na reportagem do Fantástico.
Danos morais
Na Justiça, uma das famílias pediu a condenação da emissora. Nas instâncias de origem, a Globo foi condenada a pagar danos morais. O TJ/SP fixou a indenização em R$ 300 mil por considerar que ficou provada a conduta dolosa da ré, ou, no mínimo culposa, na condução de reportagem.
“Ficou provada a conduta dolosa da ré, ou, no mínimo culposa, na condução de reportagem que acabou por mostrar a casa dos autores e, assim, identificá-los como destinatários de crianças obtidas em processo irregular e criminoso de adoção de menores, inserindo-os num verdadeiro contexto de tráfico de crianças, com sérios danos às suas personalidades, o que se reputou abusivo e em evidente desvio da atividade meramente informativa que deveria ser observada pela reportagem.”
Na avaliação da Corte estadual, a emissora extrapolou o seu direito de informar, ferindo, ou não, os direitos e garantias individuais.
A Globo acionou o STJ, mas não conseguiu reverter a condenação. Ministro Humberto Martins, que analisou o caso monocraticamente, ponderou que rever os fundamentos do acórdão recorrido acerca da ocorrência do dano moral, bem como alterar o montante compensatório fixado, a fim de modificar os seus fundamentos, seria imprescindível o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é inviável em recurso especial, haja vista o teor da súmula 7 do STJ.
Para a advogada das famílias adotivas, Lenora Thais Steffen Todt Panzetti, “é uma mistura de emoções. Desde o início, afirmamos não haver nada de errado com o processo e que tudo havia sido feito dentro do devido processo legal”.
“A acusação de tráfico foi leviana e cruel e destruiu os sonhos, a paz e a harmonia que havia entre os irmãos e suas famílias afetivas. No aspecto criminal, após muitas batalhas conseguimos provar a inocência das famílias, mas a retratação da história inventada e a reparação pelos danos causados era quase inconcebível e inalcançável. Tenho muito orgulho de ter feito parte desta história, realizando meu trabalho por acreditar que a Justiça pode tardar, mas não falha, e a luta por sua realização não deve ser esquecida ou abandonada, independentemente do tempo e dos custos emocionais e pessoais que estejam envolvidos nesta busca. Me considero parte da família destas crianças e tenho o maior orgulho de chamá-los de sobrinhos e de ser chamada de tia por eles até hoje.”
O caso tramita em segredo de justiça.