O procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu, no STF, a constitucionalidade da separação obrigatória de bens para idosos que venham a se casar ou celebrar união estável após os 70 anos. O posicionamento foi em parecer no ARE 1.309.642, representativo do Tema 1.236 da sistemática de repercussão geral, que discute o regime de bens aplicável ao casamento e à união estável de maiores de 70 anos.
O PGR se manifestou pelo desprovimento do recurso e sugeriu fixação de tese no sentido da constitucionalidade da separação obrigatória de bens para pessoa maior de 70 anos, conforme disposto no Código Civil, com o objetivo de resguardar princípios da dignidade humana, da proteção à propriedade e à herança e do dever de amparo às pessoas idosas.
No documento, o procurador-geral defende ser constitucionalmente legítimo o uso da idade como critério de diferenciação entre os indivíduos e/ou grupos sociais, para fins de proteção desses grupos. O PGR considera que o estabelecimento de regime de bens diverso da separação legal poderia acarretar em “consequências ruinosas ao cônjuge idoso, na hipótese de dissolução inter vivos da sociedade conjugal, ou aos seus filhos, no caso de dissolução causa mortis”.
Para Augusto Aras, o dispositivo jurídico em questão não afronta a autonomia do idoso na administração de seu patrimônio, apenas impõe limites legais, visando a proteção dos maiores de 70 anos enquanto grupo social relativamente vulnerável. “O inciso II do art. 1.641 do Código Civil, apesar de impor o regime diferenciado, resguarda a autonomia da vontade da pessoa idosa que pode, em vida, dispor dos seus bens da maneira que entender melhor”, reforça. A norma em questão, portanto, estabeleceu apenas o regime de bens da relação conjugal, sem adentrar e disciplinar aspectos atinentes à disposição do patrimônio em vida, enquanto manifestação da vontade livre e consciente.
Aras ressalta que o princípio de proteção ao direito de propriedade do idoso e de seus herdeiros encontra respaldo tanto na CF (arts. 5º, XXII e XXX) quanto na Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos (arts. 23 e 30), tratado de direito internacional do qual o Brasil é signatário, cujo texto prevê que os Estados partes adotarão “todas as medidas necessárias para prevenir o abuso e a alienação ilegal” da propriedade dos maiores de 70 anos.
União estável
Para o procurador-geral, as mesmas regras e consequências do regime de separação legal de bens previsto para o casamento devem ser aplicados também à união estável contraída por indivíduo maior de 70 anos, considerando a tese fixada no julgamento pelo STF do Tema 809 de RE 878.694. Na oportunidade, ficou decidido que a hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição Federal, devendo cônjuges e companheiros serem equiparados para fins de regimes sucessórios.
Caso concreto
O ARE 1.309.642 foi interposto em ação de inventário em que cônjuge sobrevivente requer o direito de participar de sucessão hereditária após falecimento do autor da herança, que celebrou união estável aos 72 anos. A Justiça de São Paulo, em primeira instância, chegou a reconhecer o direito da requerente, declarando a inconstitucionalidade do art. 1.641, II, do Código Civil, mas a decisão foi reformada no TJ/SP. Após recursos negados no TJ/SP e no STJ, o STF, por meio do plenário virtual, reconheceu a repercussão geral do tema, indicando relevância social, jurídica e econômica que ultrapassa os interesses da causa.
Sugestão de tese
Considerando os efeitos do julgamento do recurso em questão em relação aos demais casos que tratem ou venham a tratar do Tema 1.236, o PGR sugere a fixação da seguinte tese: “É constitucional o regime de separação legal de bens no casamento e na união estável da pessoa maior de 70 anos, tendo em conta a tutela ao direito de propriedade e à herança”.
- Processo: ARE 1.309.642
Leia na íntegra a manifestação.
Informações: PGR