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Para PGR, uso de tese da legítima defesa da honra é inconstitucional

Augusto Aras pede ao STF que interprete regras dos Códigos Penal e de Processo Penal conforme à Constituição para impedir uso do argumento.

12/5/2023

O procurador-Geral da República, Augusto Aras, defende que o STF julgue inconstitucional a tese da legítima defesa da honra, argumento usado ao longo do tempo pela defesa de acusados de crimes contra a vida de mulheres, em referência à prática de adultério.

Segundo a PGR, contrariando os direitos fundamentais à vida, à igualdade, à não discriminação e à dignidade humana, ainda são proferidas decisões judiciais com base nesse argumento e que resultam em absolvições de acusados por crime de feminicídio.

“Uma tese que, além de não ter amparo no ordenamento jurídico nacional, viola tratados internacionais e um amplo arcabouço normativo de proteção da vida, da integridade e da dignidade das mulheres.”

A manifestação de Aras foi feita nos autos da ADPF 779. Em março de 2021, por unanimidade, os ministros do STF firmaram o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por violar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. A decisão referendou liminar concedida pelo ministro Dias Toffoli. Agora, ainda sem data definida, o colegiado julgará o mérito do caso.

PGR defende inconstitucionalidade da tese da legítima defesa da honra.(Imagem: Freepik)

Legítima defesa da honra

Aras pede que o STF dê a dispositivos dos Códigos Penal e de Processo Penal interpretação conforme à Constituição Federal para proibir o uso da tese de legítima defesa da honra. Conforme defende o procurador-Geral, a vedação deve valer para defesa, acusação e autoridade policial, seja nas fases investigatória ou processual e até mesmo durante o julgamento pelo Tribunal do Júri, ainda que seja feita de forma indireta. O desrespeito à proibição deve levar à nulidade do ato e do próprio julgamento.

Nos casos em que os jurados reconhecerem a materialidade e autoria do crime de feminicídio, mas ainda assim absolverem o réu, contrariando as provas, deve ser assegurado recurso de apelação para que seja reconhecida a inconsistência na apreciação das provas e determinada a realização de novo julgamento por outro júri.

No parecer, Augusto Aras explica que a definição legal de legítima defesa exclui a possibilidade de sua utilização para abarcar a honra do indivíduo.

“Atentar contra a vida de uma pessoa que supostamente tenha ofendido a honra de alguém é evidentemente desproporcional à gravidade da ofensa alegada. Assim, tecnicamente, é imprópria a acomodação da tese de defesa da honra nas normas processuais penais que disciplinam a legítima defesa.”

O PGR argumenta que a invalidação da tese não prejudica o direito de defesa dos réus submetidos ao júri. Os argumentos usados para defender o acusado devem se basear em preceitos constitucionais, como a dignidade humana, o direito à vida e os princípios da igualdade e da não discriminação.

Segundo ele, esses argumentos não podem ser usados como escudo à prática de homicídio contra mulheres.

“Nenhuma tentativa de justificar o assassinato de mulheres, com benefício a seus algozes, haverá de ser tolerada, sob pena de afronta imediata a preceitos constitucionais da máxima relevância e desprezo a todo um regramento que nos leva à direção oposta, contribuindo-se para a perpetuação da impunidade em crimes dessa natureza e o aumento de número já alarmante de mortes.”

Soberania dos veredictos

Outro ponto afastado pelo PGR no parecer é o que trata da soberania das decisões do Tribunal do Júri que, pela Constituição Federal, são irrecorríveis. O PGR destaca que, há algumas exceções previstas no artigo 593 do CPP. É o caso de decisões manifestamente contrárias às provas colhidas nos autos. Nessas situações, o Judiciário pode determinar a realização de um novo júri.

Para o PGR, recursos à decisão do Tribunal do Júri devem ser admitidos, sempre que verificada a contrariedade à prova dos autos. Segundo ele, tal interpretação não afronta a soberania do júri visto que, em regra, não há deliberação que possa ficar imune a controle jurisdicional. Sem essa garantia recursal, a absolvição mostra-se arbitrária e desproporcional, incompatível com o sistema de proteção da mulher, conforme argumenta Aras.

Sistema de proteção da mulher

Aras lembra que o Estado conta com um aparato de proteção da vida da mulher direcionado a prevenir e reprimir qualquer tipo de violência. O artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, prevê como dever do Estado assegurar “assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

A lei Maria da Penha (lei 11.340/06) foi editada “para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher”, promovendo alterações nos Códigos Penal e de Processo Penal e na Lei de Execução Penal, “inclusive mediante a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher”.

No contexto internacional, antes mesmo da promulgação da Constituição brasileira de 1988, o Brasil aderiu à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, da ONU.

O instrumento tomou parte relevante no objetivo de alcançar a plena igualdade entre homens e mulheres, em todas as esferas da vida pública e privada. A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), já está internalizada no país pelo decreto 1.973/96.

Leia a íntegra da manifestação.

Informações: PGR.

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