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Cara de Sapato e MC Guimê podem responder por importunação sexual?

Os participantes foram expulsos do BBB 23 na noite de ontem após acusações de assédio à mexicana Dania Mendez, que entrou no reality show para um período de intercâmbio nesta semana.

17/3/2023

Na noite desta quinta-feira, 16, o lutador de MMA Antônio Carlos Coelho de Figueiredo Barbosa Júnior, mais conhecido como Cara de Sapato, e o cantor MC Guimê foram expulsos do BBB 23 após acusações de assédio à mexicana Dania Mendez, que entrou no reality show para um período de intercâmbio nesta semana. O anúncio foi feito ao vivo pelo apresentador do programa, Tadeu Schmidt:

"Eu queria muito estar aqui hoje para falar de festa e alegria, mas estou aqui para falar de algo bem desagradável. Nós temos na nossa casa uma convidada, uma visitante, uma pessoa que veio de outro país, mas acima de tudo uma mulher e, como todas as mulheres, merece respeito absoluto. Nós conversamos com a Dania, mas a partir de tudo que vimos e ouvimos, eu estou aqui para dizer que nós não gostamos do que vimos ontem. Sapato e Guimê passaram do ponto. É preciso tomar cuidado com os limites aqui e fora daqui. Assim, por contrariar as regras do programa, Guimê e Sapato estão eliminados do BBB 23."

Os fatos aconteceram na noite de quarta-feira, durante a Festa do Líder de MC Guimê. Na ocasião, atitudes dos brothers com Dania Mendez repercutiram fora da casa.

Guimê, que é casado com a cantora Lexa, foi acusado de apalpar as nádegas da mexicana e, em outro momento, de tentar tocar os seios dela. Já Cara de Sapato tentou beijar a participante mesmo após a recusa dela e acabou “roubando” um selinho.

Diante do acontecido, Migalhas procurou especialistas para saber: Guimê e Sapato podem responder pelo crime de importunação sexual? Veja a seguir o que eles dizem.

Cara de Sapato e MC Guimê, do BBB 23.(Imagem: Reprodução/TV Globo)

Lei de importunação sexual

A lei Federal 13.718/18, mais conhecida como lei de importunação sexual, tornou crime “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, com pena que pode variar de um a cinco anos de prisão.

Como importunação sexual estão inclusos casos como cantadas invasivas, beijos forçados, toques sem permissão, até mesmo casos de ejaculação, que já foram registrados dentro do transporte público na capital paulista em 2017 e impulsionaram a criação desta lei.

A norma também criminaliza a divulgação de cenas de estupro, nudez, sexo e pornografia.

Conduta inadequada e criminosa

A advogada Daniella Meggiolaro ressaltou que não assistiu ao programa, mas pontuou que se a mulher não consentiu com nenhum desses atos, ocorreu importunação sexual. Ela explicou que o crime não depende de iniciativa da própria vítima para ser apurado, pois é de ação penal pública incondicionada.

“Até 2018 esse tipo de comportamento gerava muita discussão porque havia uma lacuna legislativa enorme para prevenir e reprimir esse tipo de conduta. Agora, com a lei de importunação sexual, existe um tipo penal que se enquadra perfeitamente na conduta que eles praticaram.”

A causídica acredita que se eles vierem a ser investigados e processados pelo crime de importunação sexual podem se beneficiar com a suspensão condicional do processo ou até mesmo de um ANPP - acordo de não persecução penal. "Não acredito que eles possam sofrer efetivamente uma pena de prisão."

Na mesma linha é o entendimento do advogado Flávio Filizzola D’Urso (D'Urso e Borges Advogados Associados):

“O Código Penal prevê que aquele que pratica ato libidinoso, contra alguém e sem esta pessoa ter anuído, para satisfazer sua lascívia ou de terceiro, comete o crime de importunação sexual, prevista no art. 215-A. A pena para este crime é de reclusão de 1 a 5 anos, se o ato não constituir crime mais grave. Como o art. 225 do Código Penal especifica que, para este crime, a ação penal é pública incondicionada, ou seja, independe de representação da vítima, mesmo que a vítima não denuncie o autor do ato libidinoso, isso não impede a ação penal e punição do autor.”

Para a configuração da importunação sexual tem que ficar comprovada a finalidade libidinosa do ato. A afirmação é da advogada Clarissa Höfling.

"No âmbito criminal a autoridade policial provavelmente vai instaurar um inquérito pra investigar a suposta ocorrência do crime de importunação sexual. Isso acontece independente da vontade da vítima, já que se trata de um crime de ação penal pública incondicionada. Se o inquérito apurar que teve dolo, o Ministério Público poderá denunciá-los e eles se tornarão réu em uma ação penal."

A criminalista Amanda Magalhães lembra que ações como cantadas provocativas reiteradas, toques e beijos forçados ocorrem principalmente em ambientes de descontração como em festas. 

"O fato é que nem o ambiente e nem o argumento de que o ofensor estaria bêbado, por exemplo, autorizam ou justificam a prática deste crime, pelo contrário, é fundamental que todos compreendam que ainda que o discernimento possa ter sido afetado pelo consumo de álcool, por ter sido opcional, o cuidado e atenção devem ser redobrados. A diversão só é legal - nós dois sentidos - quando todos estão de acordo com a extensão dela e compreendem os limites do que é sim e do que é não."

A advogada diz que é importante destacar que na hipótese de a vítima estar embriagada, ela assume uma posição ainda maior de vulnerabilidade e a repercussão criminal pode ser ainda mais severa.

Advogada e conselheira do IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Jacqueline Valles conta que, a princípio, o caso se parece com importunação sexual.

“Ela, por ser visitante e estrangeira, claramente tenta ser gentil diante das investidas, mas não consente em nenhum momento. Ela expressamente diz ‘não’, tira as mãos de um deles das suas costas e, portanto, sinaliza que não queria aquele tipo de contato. Isso é suficiente para caracterizar a importunação sexual.”

Para o criminalista Bruno Salles Ribeiro, é importante esclarecer que o assédio sexual, como fenômeno social, é distinto do tipo penal de assédio sexual previsto no art. 216-A, do Código Penal. "Enquanto aquele se refere a um fenômeno amplo, a tipificação se refere ao constrangimento de alguém com prevalência de superioridade hierárquica ao ascendência inerente ao exercício de emprego, cargo ou função."

"As condutas de passar a mão em alguém ou tentar beijar a força, até 2018, enquadravam-se na categoria do estupro, um tipo amplo e severo, que sempre foi objeto de crítica doutrinária, por abranger desde conduta menos gravosas, como passadas de mão, até a conjunção carnal. Em 2018 foi inserido no ordenamento o tipo de 'importunação sexual', considerada uma figura intermediária, para casos de menor gravidade do que o próprio estupro. O tipo trata da prática de ato libidinoso contra alguém 'sem a sua anuência'. Portanto, aqui, como no delito do estupro, terá peso determinante a manifestação de consentimento ou não da vítima, para a caracterização do tipo penal."

Os advogados Roberto Parentoni, Luca Parentoni e Bruno Parentoni (Roberto Parentoni e Advogados) pontuaram que "ainda que pareça estar configurado o delito de importunação sexual, evidentemente, tudo ainda precisa ser melhor apurado, desde a culpabilidade dos participantes expulsos até, inclusive, a influência e responsabilidade que o próprio programa teve para os tristes acontecimentos."

O advogado Carlo Luchione (Luchione Advogados) ressaltou que, na lei de importunação sexual, apalpar e beijo forçado são considerados atos libidinosos aptos a deflagrar investigações ou ação penal. "A questão é polêmica, pois várias circunstâncias precisam ser analisadas como vulnerabilidade, consentimento etc, lembrando que nem todo consentimento afasta a ocorrência do crime, por isso é importante a análise fática caso a caso."

Já o advogado Francisco Gomes Júnior (OGF Advogados) afirmou que qualquer conduta sem consentimento é inadequada e criminosa. “Não se avança sobre o corpo de outra pessoa sem a sua autorização. Não se encosta em outra pessoa sem autorização.” O profissional destacou também que estar embriagado não exime ninguém da responsabilidade pelo crime.

Consequências na esfera cível

No âmbito cível, a advogada Maíra Recchia explica que a conduta dos dois ex-BBBs também pode ter consequências. “A vítima pode tanto demandar contra a emissora que não foi capaz de garantir sua segurança, bem como contra os abusadores.” Ela diz que toda ação ilícita gera direito a reparação por dano moral (art. 186 e 927 do Código Civil e art. 5 da Constituição Federal).

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