Nesta quarta-feira, 23, o plenário do STF deve julgar ações que questionam o fim do voto de qualidade do Carf. O caso começou a ser julgado em plenário virtual no ano passado e estava com pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
As ações foram ajuizadas pelo procurador-Geral da República, Augusto Aras, pelo PSB - Partido Socialista Brasileiro e pela Anfip - Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil.
Entenda
O Carf integra o ministério da Economia e é responsável pelo julgamento administrativo de segunda instância do contencioso administrativo fiscal na esfera Federal. As turmas do Carf são compostas paritariamente por representantes dos contribuintes e da Fazenda Pública, reservada à representante desta última a função de presidente.
Pela regra anterior (artigo 25, parágrafo 9º, do decreto 70.235/72), o voto de desempate era proferido pelo presidente da turma julgadora. O fim do voto de qualidade, foi incluído pela MP 899/19, que deu origem à lei 13.988/20. Com a suspensão, ficou determinado que, na hipótese de empate, o resultado deve ser favorável ao contribuinte.
O fim do voto, no entanto, não constava no texto original e foi incluído por emenda parlamentar na tramitação do projeto de lei de conversão da MP.
Veja o vídeo preparado por Migalhas na época que o caso começou a ser julgado:
Fundamentos
Na ADIn 6.399, Augusto Aras assinala que houve vício no processo legislativo em razão da inserção de matéria de iniciativa reservada e sem pertinência temática com o texto originário por meio de emenda parlamentar.
Aras alegou ainda que a Constituição Federal reservou ao presidente da República a disciplina da organização e do funcionamento dos órgãos da Administração Pública.
O PSB, na ADIn 6.403, afirma que a mudança implicará a alteração da própria natureza do Carf, que passará a ter caráter eminentemente privado, pois os representantes dos contribuintes, indicados por entidades privadas, passam a ter poder decisório soberano.
O partido argumenta que a alteração resultará numa perda de arrecadação aos cofres públicos de cerca de R$ 60 bilhões por ano e que, entre 2017 e 2020, mais de R$ 110 bilhões tornaram a integrar a carta de créditos tributários da União em decorrência da utilização do voto de qualidade.
Já a Anfip, na ADIn 6.415, aponta violação ao princípio democrático e ao devido processo legislativo, pois a alteração resultou de emenda parlamentar apresentada após a emissão de parecer pela Comissão Mista e não tem qualquer relação com a medida provisória que lhe deu origem. A associação ressalta ainda violação ao princípio constitucional implícito da prevalência do interesse público sobre o privado.
Inconstitucionalidade
O relator das ações é o ministro aposentado Marco Aurélio, que votou, em abril de 2021, pela inconstitucionalidade da norma e ressaltou que não se questiona a possibilidade de alteração, no Congresso, do texto primitivo, ou seja, o exercício regular do poder de emenda.
Para o ministro, a inconstitucionalidade decorreria do abuso desse poder, mediante enxerto, no âmbito parlamentar, durante a fase de conversão em lei, de dispositivo voltado a disciplinar tema sem relação com a proposição original, prática conhecida como "jabuti".
"Não há conexão da matéria com o texto original. O cenário é de molde a reconhecer a crise legislativa há tempos existente na frágil democracia brasileira, marcada pela opção por atalhos à margem da Constituição Federal - o que, na quadra vivenciada, tem se mostrado regra, e não exceção."
Dessa forma, julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 28 da lei 13.988/20, por meio do qual inserido o art. 19-E na lei 10.522/02.
Em seguida, Barroso pediu vista. Os autos foram devolvidos para julgamento em junho de 2021, ocasião em que o ministro divergiu do relator e sugeriu a seguinte tese:
"É constitucional a extinção do voto de qualidade do Presidente das turmas julgadoras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), significando o empate decisão favorável ao contribuinte. Nessa hipótese, todavia, poderá a Fazenda Pública ajuizar ação visando a restabelecer o lançamento tributário."
Depois disso, o caso foi novamente suspenso por pedido de vista, dessa vez de Alexandre de Moraes.
Os autos foram devolvidos em dezembro de 2021 e colocados na pauta de 23 de março do STF.