O Estado de SC e o hemocentro terão de indenizar advogado que foi impedido de doar sangue por ser homoafetivo e, em decorrência disso, ser considerado “grupo de risco”. Decisão é da juíza de Direito Lizandra Pinto de Souza, da 2ª vara da Fazenda Pública de Chapecó.
Em entrevista ao Migalhas, o doador, Matheus Brandini, disse ter se sentido desrespeitado e humilhado, porque estava lá de livre vontade querendo ajudar e a sua orientação sexual pesou mais do que o fato de você ser um ser humano.
“Não há mais espaço para qualquer tipo de discriminação, seja ela de qualquer origem. Grupos minoritários são historicamente reprimidos e a saída que temos hoje para garantir nossos direitos é buscar o poder judiciário e não nos calarmos diante de qualquer abuso ou repressão.”
Entenda
Segundo Matheus, se dirigiu ao hemocentro de Chapecó/SC, com o intuito voluntário de doar sangue, uma vez que os estoques de sangue nos hemocentros estão baixos. Na entrevista, foi questionado se havia tido relação sexual com pessoas do mesmo sexo e, ao ouvir resposta positiva, a profissional informou que ele estava inapto para doação de sangue.
Após o espanto do doador, pois foi fato público que o STF declarou inconstitucional a proibição, ele explicou para a profissional que não poderia mais restringir a doação de sangue com base nas normas derrubadas pela Suprema Corte simplesmente pelo fato de uma pessoa ser gay.
Mesmo diante das explicações e da decisão do STF, o hemocentro forneceu declaração de que Matheus estaria inapto a doar, em decorrência de ser considerado “grupo de risco”.
Decisão
Ao analisar a ação proposta pelo doador, a juíza observou que o hemocentro afirmou nos autos do processo que passou a tomar todas as medidas necessárias para a adequação de sua rotina de triagem clínica dos doadores.
A magistrada analisou que a ata do julgamento da ADIn 5.543 fora divulgada em 18 dias antes da recusa, sendo inverossímil a alegação de desconhecimento da nova alteração, a qual, foi amplamente divulgada nos meios de comunicação.
“Ficou demonstrado que a orientação sexual do autor foi formalmente considerada quando do procedimento de habilitação, tendo em vista que ainda constava da ficha de triagem o questionamento declarado inconstitucional, o que acarreta o dever de indenizar, porquanto, ao ter de responder sobre sua orientação sexual quando não mais deveria ser obrigado a responder tal questionamento, o autor foi submetido a constrangimento.”
Era obrigação do hemocentro ter cumprido as decisões do STF, concluiu a juíza.
Assim, julgou procedente o pedido para condenar o município e o hemocentro ao pagamento de dano moral em R$ 3 mil.
- Processo: 5012318-32.2020.8.24.0018
Veja a decisão.
“Desrespeitado e humilhado”
Em entrevista ao Migalhas, Matheus disse que foi muito constrangedor quando falaram que ele estava inapto para doar pelo simples fato da sua orientação sexual.
“É como se você fosse promiscuo ou já tivesse algum tipo de DST por conta disso. E não há argumentos que convençam, eles seguem um protocolo e nada mais. Na verdade, a gente se sente desrespeitado e humilhado, porque está lá de livre vontade querendo ajudar, e a sua orientação sexual pesa mais do que o fato de você ser um ser humano.”
Para o advogado, a sentença, independentemente do valor da condenação, demonstra que o Poder Judiciário serve para garantir e reafirmar os direitos individuais, coletivos e sociais, quando estes sofrem qualquer repressão por terceiros.
“Acredito que com a sentença da Magistrada vinculada a repercussão do caso servirá de alerta para que a situação não volte a acontecer com mais ninguém, pois já basta de preconceito na nossa sociedade. Não há mais espaço para qualquer tipo de discriminação, seja ela de qualquer origem. Grupos minoritários são historicamente reprimidos e a saída que temos hoje para garantir nossos direitos é buscar o poder judiciário e não nos calarmos diante de qualquer abuso ou repressão.”