Reincidência não é suficiente para impedir, por si só, a aplicação do princípio da insignificância. A conclusão é do ministro Gilmar Mendes, do STF, em duas recentes decisões que envolviam pequenos delitos: um sobre o furto de um bone; e o outro sobre o furto de duas telhas de aço.
"Para o reconhecimento de causa de exclusão de tipicidade ou ilicitude, são irrelevantes, em tese, os dados da vida pregressa do acusado."
Em ambos os casos, a Defensoria Pública de MG impetrou HC no STF pedindo a absolvição dos condenados.
Furto de boné
No primeiro caso, o paciente furtou um boné que se encontrava à venda na prateleira, deixando o local com o produto do furto. O MP, no entanto, requereu a absolvição do homem em razão da irrelevância da conduta.
Acontece que o magistrado de 1º grau não acatou esse argumento por causa da reincidência do homem: "face a reincidência do acusado, segundo entendimento majoritário na jurisprudência, impede o reconhecimento do princípio da insignificância, notadamente em razão de ganhar a conduta de furto contornos de maior reprovabilidade".
- Processo: HC 210.024
Telhas de aço
No outro caso, o paciente furtou duas telhas de aço, que estariam em desuso, de uma antiga fábrica de biscoitos que estava desativada. Ele foi preso em flagrante quando ainda estava próximo ao local, quando, então, restituiu os objetos. Negou-se-lhe o princípio da insignificância, porque é reincidente.
- Processo: HC 210.032
Insignificância, sim
Os dois casos estão sob relatoria de Gilmar Mendes. Nas decisões, o ministro relembrou julgamentos do plenário do STF que reconheceram que a reincidência não é suficiente para impedir, por si só, a aplicação do princípio da insignificância (HCs 123.108, 123.533 e 123.734).
"É por isso mesmo que tenho concedido, mas não deliberadamente, ordens de habeas corpus a reincidentes", registrou.
O relator explicou que, se o princípio da insignificância é causa de exclusão da própria tipicidade, resta irrelevante a análise da ficha de antecedentes criminais. "É, em certa medida, semelhante ao ato do magistrado que, para apurar se o réu agiu em legítima defesa, manda juntar aos autos folha de antecedentes criminais, a fim de saber se ele é primário ou reincidente", esclareceu.
De acordo com Gilmar Mendes, a primariedade/reincidência não é elemento da tipicidade, mas circunstância afeta à individualização da pena, "motivo por que não faz qualquer sentido indagar, para o reconhecimento de atipicidade, se o réu é primário".