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Covid-19: Gilmar Mendes vota por proibir missas e cultos coletivos

O ministro lamentou a situação: “O Brasil já foi exemplo em importantes atividades de saúde pública (...) hoje nós estamos nessa situação altamente constrangedora”.

7/4/2021

Nesta quarta-feira, 7, o plenário do STF deu início ao julgamento sobre a possibilidade da realização de cultos, missas e outras atividades religiosas coletivas presenciais em meio a pandemia.

Na tarde de hoje, foram feitas as sustentações orais e o ministro Gilmar Mendes, relator da matéria, proferiu seu voto. Gilmar reiterou a proibição de celebrações religiosas presenciais coletivas. Para o ministro, “há um razoável consenso na comunidade científica”, no sentido de que os riscos de contaminação, decorrentes de atividades religiosas coletivas, são superiores ao risco de outras atividades econômicas, mesmo em ambientes fechados.

(Imagem: Fellipe Sampaio /SCO/STF)

No último sábado, Nunes Marques liberou celebrações religiosas presenciais em meio a pandemia de covid-19. Em liminar, o ministro determinou que Estados, municípios e DF se abstenham de editar decretos que proíbam atividades religiosas presenciais.

Na decisão, Nunes Marques considerou que a proibição total da realização de cultos religiosos presenciais representa uma extrapolação de poderes, pois trata o serviço religioso como algo supérfluo, que pode ser suspenso pelo Estado, sem maiores problemas para os fiéis. Veja a decisão de Nunes Marques. 

"A proibição categórica de cultos não ocorre sequer em estados de defesa (CF, art. 136, § 1º, I) ou estado de sítio (CF, art. 139). Como poderia ocorrer por atos administrativos locais? Certo, as questões sanitárias são importantes e devem ser observadas, mas, para tanto, não se pode fazer tábula rasa da Constituição."

Dois dias depois da decisão de Nunes Marques, Gilmar Mendes manteve a proibição de cultos e missas em São Paulo. Ao negar o pedido liminar do PSD - Partido Social Democrático, Gilmar Mendes considerou que as medidas de restrição são necessárias em meio à pandemia. Veja a decisão de Gilmar Mendes. 

"Em um cenário tão devastador, é patente reconhecer que as medidas de restrição à realização de cultos coletivos, por mais duras que sejam, são não apenas adequadas, mas necessárias ao objetivo maior de realização da proteção da vida e do sistema de saúde."

Gilmar Mendes votou por proibir os cultos religiosos coletivos, por conta da pandemia. O ministro iniciou seu voto classificando o presente julgamento como “fúnebre” diante das mais de 330 mil mortes pelo coronavírus.

Posteriormente, Gilmar Mendes criticou a gestão de André Mendonça que, até poucas semanas atrás, ocupava o cargo de ministro da Justiça. O ministro afirmou que André Mendonça poderia ter proposto medidas contra a pandemia, no que tange ao transporte. "É preciso que cada um de nós assuma as suas responsabilidades", afirmou.

"Eu poderia ter entendido que S. Exa. teria vindo agora para a Tribuna do Supremo de uma viagem a Marte e ele estava descolado de qualquer responsabilidade institucional, com qualquer assunto no Brasil."

Em seguida, Gilmar Mendes citou inúmeros exemplos internacionais que a imprensa publicou de reuniões religiosas durante a pandemia que ocasionaram um “boom” de casos de coronavírus. Uma sul-coreana contaminou 5 mil pessoas ao ir à igreja, sendo a maior responsável pelo maior epicentro da covid-19 no país.

O ministro citou decisão do Supremo que estabeleceu competência concorrente da União, Estados e municípios para combater a covid-19 e afirmou que, se não fosse essa decisão, “muito provavelmente o nosso quadro sanitário estaria muito pior do que se encontra”. E completou que esse é um ensinamento do Brasil, de que as situações ruins podem, sim, piorar: “às vezes o poço parece que não tem fundo”.

Gilmar Mendes salientou que “há um razoável consenso na comunidade científica” no sentido de que os riscos de contaminação, decorrentes de atividades religiosas coletivas, são superiores ao risco de outras atividades econômicas, mesmo em ambientes fechados.

O ministro afirmou que é “surreal” a narrativa de que a interdição temporária de eventos coletivos em templos religiosos teria algum motivo anticristão. “É necessário desconfiarmos do “bom-mocismo” constitucional, muito presente em intervenções judiciais", salientou.

Gilmar Mendes, por fim, lamentou a situação do Brasil e afirmou que nos tornamos “párias internacionais na saúde”: “O Brasil que já foi exemplo em importantes atividades de saúde pública (...) hoje nós estamos nessa situação altamente constrangedora".

Veja o voto de Gilmar Mendes.

Primeiro a sustentar oralmente no julgamento, o AGU André Mendonça se posicionou a favor dos cultos presenciais: "ser cristão, na sua essência, é viver em comunhão (...) ser cristão é estar junto ao próximo".

A sessão de hoje foi a primeira de André Mendonça, depois que voltou a ocupar o cargo de Advogado Geral da União, após as reiteradas trocas dos cargos diretivos por Bolsonaro. André Mendonça é pastor e se posicionou contra a medida restritiva do toque de recolher, que, segundo ele, é própria de Estados autoritários.

O AGU afirmou que os governos não determinaram o fechamento de sindicatos, de associações e partidos políticos: "por que somente as igrejas? por que essa discriminação?".

Ao finalizar sua sustentação oral, André Mendonça disse que cristãos estão dispostos a morrer pela liberdade de cultos e concluiu: "Não há cristianismo sem vida comunitária sem a vida comunitária. Não há cristianismo sem a casa de Deus. Não há cristianismo sem o dia do Senhor".

No mesmo sentido, defendeu o PTB – Partido Trabalhista Brasileiro, pelo advogado Luiz Gustavo Pereira da Cunha. O patrono defendeu que as medidas sanitárias se mostram excessivas: “não se pode permitir que, em nome de uma grave crise sanitária, se autorize a instauração de um verdadeiro estado de exceção, que não respeita a Constituição Federal”. O advogado defendeu que o acolhimento espiritual pelas instituições religiosas nesse período é, sim, essencial. 

Ao finalizar sua sustentação oral, Luiz Gustavo Pereira da Cunha mandou um recado para os ministros "que hoje votarão pelo fechamento da casa do Senhor". O patrono citou versículo da Bíblia (Lucas 23:34): "Então ele ergueu seus olhos para o céu e disse: 'Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem'".

Pela Associação do Centro Dom Bosco de Fé e Cultura falou o advogado Taiguara Fernandes, o qual argumentou que não existe “sacramento virtual” e que alguns ritos católicos, como batismo e ceia, não podem ser realizados de forma virtual. “Não existe como a liberdade religiosa não ser exercida sem a sua permissão pública, presencial e física”, concluiu.

Por outro lado, o advogado Paulo Roberto Vecchiatti, pelo Partido Cidadania, classificou como “equivocada” a decisão de Nunes Marques, que liberou os cultos presenciais. Segundo o advogado, as medidas sanitárias como álcool em gel e máscaras são medidas paliativas e que o “isolamento social” é a medida mais eficaz contra o coronavírus. Para o advogado, não se trata de menosprezo da atividade religiosa de ninguém.

O Conselho Nacional com Conselhos de Pastores do Brasil, por meio do advogado Ricardo Hasson Sayeg, elogiou a decisão de Nunes Marques, que permitiu a presença dos fiéis nos cultos no fim de semana da Páscoa. De acordo com o advogado, o Estado se mostrou ineficiente e a medicina se mostrou inoperante e, portanto, aquilo que sobra é a fé: “essa fé não pode ser solapada. As pessoas não vão à igreja para simplesmente manter um convívio social. Elas vão lá para combater a morte”.

Posteriormente, falou o advogado Walter de Paula Silva, pelo Conselho Nacional de pastores e Líderes Evangélicos Indígenas. Segundo o patrono, a igreja não se curva a nenhum tipo de repressão: “a igreja é, de fato, maior do que a reunião; mas não podemos, neste momento, discriminar as instituições religiosas, determinando o seu fechamento”.

O Instituto Santo Atanásio de Fé e Cultura, representado pelo advogado Kayan Acassio da Silva, trouxe dados que mostraram o aumento de casos de ansiedade e depressão durante a pandemia e afirmou que as instituições religiosas auxiliam no combate dessas doenças. Segundo o advogado, comparecer presencialmente no templo religioso é inerente à prática da liberdade religiosa.

Finalizando o momento de sustentações orais, falou Augusto Aras. O PGR afirmou que o Estado é laico, mas as pessoas não são. “A ciência salva vidas, a fé também”, disse. Segundo Aras, a CF/88, ao dispor sobre a liberdade religiosa, assegura o livre exercício dos cultos religiosos, e a sua proteção, na forma da lei.

Aras, posteriormente, questionou: decretos, como atos administrativos, ainda que decorrentes de lei ordinária, podem ter força para subtração de direitos fundamentais postos da lei maior? “Parece-me que não”.

“Aonde o Estado não chega, lá existe um missionário, um padre, um pastor que em nome da sua crença para levar paz social.”

De acordo com o PGR, o direito ao livre exercício dos cultos religiosos tem como elemento intrínseco o direito de estar no templo e participar no culto: “A Constituição de 88, portanto, assegurou o culto público coletivo”.

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