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STF decidirá validade de patentes sem prazo máximo

Os ministros deverão analisar dispositivo da Lei de Propriedade Industrial, que deixa indeterminado o prazo máximo da patente, em caso de demora na apreciação do pedido pelo INPI.

6/4/2021

Está pautado para amanhã, 7, no plenário do Supremo Tribunal Federal um assunto tormentoso: a extensão de prazo para a vigência de patentes em caso de demora na apreciação do pedido pelo INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial. A decisão do STF pode cancelar mais de 30 mil patentes das mais diversas áreas (eletrônicos, medicamentos, agroquímicos etc).

O caso ganha ainda mais importância em razão da crise sanitária ocasionada pela covid-19. É que segundo os que querem o fim das patentes, a decisão pode beneficiar a produção de medicamentos genéricos e fazer o SUS economizar R$ 3 bilhões. Fazendo um cotejo com a atual situação calamitosa, dramatiza-se ainda mais dizendo que o valor seria suficiente para comprar mais de 14 mil respiradores e custear 1,3 milhão de diárias em UTIs.

O que está sendo questionado?

A ação foi ajuizada em 2016 pelo então procurador Rodrigo Janot contra o art. 40 da lei 9.279/96, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial.

A lei estabelece que as patentes podem ter validade de 20 anos, mas, na prática, com a demora da análise dos processos pelo INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial, esse prazo pode chegar a 30 anos. Isso porque, de acordo com a lei, o depositante do pedido terá proteção patentária durante toda a tramitação do processo administrativo.

A PGR quer que esse prazo "estendido e indeterminado" seja declarado inconstitucional. Um dos recentes argumentos de Augusto Aras é, justamente, a crise sanitária do coronavírus: nos medicamentos, o monopólio na fabricação impede a produção de genéricos, que são cerca de 35% mais baratos. Para Aras, esse prazo indeterminado prejudica a saúde da população e o próprio SUS.

Em contraposição à PGR, o INPI prestou informações ao relator da matéria, ministro Dias Toffoli, e informou que apenas quatro pedidos de patente alusivos a medicamentos indicados pelo ministério da Saúde, para tratamento do coronavírus, apresentam a possibilidade de incidência do prazo estendido. Ou seja, para o instituto, o dispositivo não tem grandes efeitos sob os medicamentos contra a covid-19. Além desse fato, o INPI informou que cerca de 60 medicamentos tiveram seus prazos estendidos em função do artigo 40 da lei de propriedade intelectual.

Veja a íntegra do dispositivo questionado:

Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 ([...]) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 ([...]) anos contados da data de depósito.

Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 ([...]) anos para a patente de invenção e a 7 ([...]) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.

Patentes e a vacinação contra a covid-19

O monopólio de uma empresa na venda de determinados medicamentos ou tecnologias impede a concorrência de preços e, por conseguinte, pode impactar na vacinação da população contra o coronavírus. Isso porque, atualmente, há diversas indústrias farmacêuticas na corrida pela produção e venda do imunizante. Vale lembrar que tais empresas, e seus respectivos produtos, são protegidos pelo Acordo sobre os ADPIC - Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio.

A reitora da Unifesp - Universidade Federal de São Paulo, Soraya Smaili, defendeu a quebra das patentes das vacinas contra a covid-19, como forma de garantir a soberania e autonomia do Brasil, viabilizando a produção por instituições públicas como o Instituto Butantã e a Fiocruz, e sem a dependência de fornecedores estrangeiros. Isso já ocorreu no Brasil, em 2007, com a quebra das patentes dos antivirais contra o HIV.

Tramita no Senado o PL 12/21, o qual dispensa o Brasil de cumprir — enquanto durar a situação de emergência provocada pelo coronavírus — algumas exigências adotadas pela OMC - Organização Mundial do Comércio. De acordo com o texto, os titulares de patentes ficam obrigados a ceder ao Poder Público todas as informações necessárias para a produção de vacinas e medicamentos para o enfrentamento à covid-19.

De acordo com o advogado Marcus Vinicius Vita (Wald, Antunes, Vita e Blattner Advogados), representante da FarmaBrasil, a norma não encontra paralelo em nenhuma outra jurisdição no mundo.

“A imprevisibilidade do tempo de duração da patente fere o princípio da temporariedade, do artigo 5, XXIX, e por isso é inconstitucional. O constituinte brasileiro buscou restringir a patente, por se tratar de monopólio, e não alargá-la, como feito pelo parágrafo único do artigo 40".

O outro lado da moeda

Caso o STF invalide a norma, mais de 30 mil patentes podem ser canceladas. Quem pode sair prejudicado com a inconstitucionalidade da norma são as universidades públicas. Um exemplo relevante é o remédio Vonau Flash, que serve para enjoo. O medicamento é uma patente da USP, que representa a maior fonte de arrecadação em royalties da instituição.

O pedido foi feito em 2005 e a patente foi concedida em 2018. Isso significa que, a depender da decisão dos ministros (bem como a modulação dos efeitos da decisão) este medicamente pode ser sua patente cancelada a partir de 2025. Segundo a Interfarma – Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, foram identificadas 780 patentes ameaçadas pela discussão no âmbito das universidades.

O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, já se manifestou contra a derrubada do artigo e contra a quebra de patentes de medicamentos. Segundo ele, a quebra de patentes de medicamentos pode prejudicar os investimentos no setor.

Em 2019, Mandetta afirmou: “não é bom ameaçar quebras de patente. O país jamais deveria fazer isso. Temos de zelar pela inventividade e pelo tempo gasto no balcão de pesquisa e no balcão dos nossos pesquisadores.”

No mesmo sentido, defende a ABPI - Associação Brasileira da Propriedade Intelectual, admitida como amicus curiae no processo. A entidade assevera que “a regra em vigor proporciona de forma clara e objetiva a tão buscada segurança jurídica àqueles que investem em inovação, pesquisa e desenvolvimento, gerando patentes".

Pauta

O caso está pautado para amanhã, dia 7 de abril. Nessa efeméride, entretanto, comemora-se o Dia da Abdicação, o que pode indicar que o STF vai abdicar de julgar o feito nesta data. E explicamos. Há, de fato, grandes chances de o caso não ser apregoado, pois o presidente da Corte, ministro Fux, pautou outro processo de urgência - o que que discute as celebrações religiosas presenciais na pandemia.

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