O IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros emitiu nota de repúdio na quarta-feira, 31/3, à ordem do dia emitida pelo ministro da Defesa, Walter Braga Neto, enaltecendo o golpe de 31 de março de 1964.
No documento, assinado pela presidente nacional do IAB, Rita Cortez, a entidade afirmou que, no dia 31 de março, o Brasil contabilizou 318 mil mortos, 15 milhões de desempregados e mais alguns milhares de pessoas passando fome, e destacou, "não há nada a comemorar."
Na nota, o IAB também criticou os efeitos econômicos decorrentes do golpe militar.
“Historiadores, cientistas políticos e principalmente as vítimas que sobreviveram às perseguições, torturas e mortes por serem opositores ao governo militar, atestam que o golpe de 64, além de cassar mandatos e de tentar calar adversários do regime, fechando inclusive jornais, provocou uma das maiores recessões da história da economia do país.”
O Instituto destacou, também, que não é surpreendente a atitude do ministro, pois o atual presidente "não só flerta com atitudes contrárias à Constituição e ao pacto democrático de 1988, como enaltece torturadores, estimulando os quartéis a celebrar o golpe.”
O IAB criticou a autorização dada pelo Judiciário para a comemoração do golpe. “Espantoso, contudo, é o ato de um órgão do Poder Judiciário que afirma “estar tudo bem” com relação à celebração do golpe, quando sua obrigação é zelar pela observância da Constituição Federal.”
Leia a íntegra da nota de repúdio:
31 de março
“A quebra da ordem democrática não é motivo para celebração na República, por qualquer autoridade constituída ou servidor público.”
(Moção aprovada na sessão plenária do IAB em 23/3/2019)
A desafortunada Ordem do Dia emitida pelo ministro Walter Braga Neto, enaltecendo o golpe de 31 de março de 1964, porque teria sido, segundo ele, pautado na superada Guerra Fria e na necessidade de se conter uma pretensa instabilidade no País, não pode e não deve prosperar.
Historiadores, cientistas políticos e principalmente as vítimas que sobreviveram às perseguições, torturas e mortes por serem opositores ao governo militar, atestam que o golpe de 64, além de cassar mandatos e de tentar calar adversários do regime, fechando inclusive jornais, provocou uma das maiores recessões da história da economia do País, provocando desemprego em massa e pobreza absoluta – prova de que o chamado “milagre econômico” era na verdade uma ilusão.
A atitude do ministro não chega a causar surpresa ao IAB que completa, em 2021, 178 anos de participação ativa na história do Brasil, sempre na trincheira da resistência e do combate a medidas autoritárias.
Não acarreta surpresa até porque o atual presidente da República não só flerta com atitudes contrárias à Constituição e ao pacto democrático de 1988, como enaltece torturadores, estimulando os quartéis a celebrar o golpe. Assim o fez em 2019 e em 2020, por meio de nota do general Fernando Azevedo e Silva, agora por ele demitido.
Em 2019 o IAB emitiu moção de repúdio ao estímulo à comemoração, pugnando “pelo direito do povo brasileiro à memória”, como obstáculo à repetição dos graves erros do passado, “quando a democracia, as liberdades, a cidadania e a dignidade humana foram desrespeitadas, ao custo do sacrifício da vida de muitos brasileiros”.
Espantoso, contudo, é o ato de um órgão do Poder Judiciário que afirma “estar tudo bem” com relação à celebração do golpe, quando sua obrigação é zelar pela observância da Constituição Federal, que consagra a democracia e o estado de direito, além de autorizar a punição dos que torturam, lembrando que tortura, segundo a Lei 8.072/90, é crime hediondo.
Registrem-se, ainda, neste cenário funesto, as ameaças ao Supremo Tribunal Federal, que começaram a ser perpetradas em 2018 pelo general Vilas Boas.
Neste 31 de março, o Brasil contabiliza 318 mil mortos, 15 milhões de desempregados e mais alguns milhares de pessoas passando fome. Não há nada a comemorar.
As Forças Armadas têm um papel constitucional a cumprir e não podem permitir o uso da força para atender aos interesses do presidente da República ou de qualquer outra autoridade do governo.
A Lei de Segurança Nacional ainda em vigor não pode ser aplicada para intimidar os que criticam os desatinos e o desgoverno. Devemos lembrar que, no estado de exceção, os primeiros a serem calados são os advogados.
Firme no cumprimento do seu papel institucional, o IAB, na forma de seu Estatuto, seguirá, junto com outras instituições jurídicas e entidades de representação da advocacia, defendendo a ordem constitucional, a democracia, o estado de direito e as liberdades duramente conquistadas pelo povo brasileiro.
Rita de Cássia S. Cortez
Presidente do IAB Nacional
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