A 5ª turma do STJ negou pedido da defesa do senador Flavio Bolsonaro para anular inquérito conhecido como caso das “rachadinhas”. Seguindo voto do relator, ministro Felix Fisher, o colegiado considerou que os relatórios de inteligência financeira e as informações trocadas entre Coaf e MP foram legais.
No pedido de anulação do inquérito, no qual a defesa sustentou que, como os fatos ocorreram quando ele deputado estadual, deveria ter tramitado desde o início na segunda instância, o colegiado considerou prejudicado deviao à decisão que manteve os relatórios do Coaf.
O parlamentar é investigado em inquérito que apura suposto desvio de dinheiro em seu antigo gabinete na Alerj - Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, o qual teria ocorrido a partir de arrecadação ilícita de parte dos salários de seus servidores.
Em 23 de fevereiro, a 5ª turma anulou a quebra de sigilo fiscal e bancário do senador, seguindo voto divergente do ministro João Otávio de Noronha, que considerou que as decisões que determinaram a quebra de sigilo não foram adequadamente fundamentadas. Ficou vencido o relator, ministro Felix Fisher.
Após a decisão, a defesa do senador questionou à turma suposta ilegalidade no compartilhamento de informações sigilosas entre o Coaf e o MP/RJ, alegando que invade a área de reserva da jurisdição.
A defesa de Flavio procura, ainda, anular todo o inquérito, sustentando que, como os fatos ocorreram quando ele deputado estadual, deveria ter tramitado desde o início na segunda instância.
Comunicação obrigatória
O relator, ministro Felix Fisher ressaltou que o tribunal de origem, soberano na análise de fatos e provas, consignou que os relatórios de inteligência financeira se referiam a informações que se enquadravam nas hipóteses de comunicação obrigatória.
“No procedimento investigatório foram identificadas operações financeiras tidas suspeitas em contas bancárias de pessoas vinculadas à Alerj, inclusive um assessor do recorrente.”
O ministro lembrou que o tema 990 do Supremo não cria reserva de jurisdição na comunicação entre órgãos fiscalizatórios, tal como a receita Federal, o Coaf e o MPF, desde que ocorra de maneira formal.
O tema fixou a “possibilidade de compartilhamento com o Ministério Público, para fins penais, dos dados bancários e fiscais do contribuinte, obtidos pela Receita Federal no legítimo exercício de seu dever de fiscalizar, sem autorização prévia do Poder Judiciário”.
Para Fisher, os RIFs gerados pela unidade de inteligência financeira vinculavam somente os dados que já constavam do repositório de informações do Coaf, não havendo nenhuma comprovação da alegada fishing expedition.
“Tendo a câmara Criminal do TJ/RJ apenas apreciado a impetração que reconheceu o foro privilegiado ao agravante, quando o feito tramitava em primeiro grau, não há o que falar em nulidade de julgamento por usurpação de competência.”
O relator destacou, ainda, que em relação ao suposto excesso de prazo no encaminhamento do feito principal ao órgão especial do TJ/RJ, as informações são de que a providência já foi tomada pelo juízo de origem.
Assim, desproveu o agravo regimental. Os ministros Reynaldo da Fonseca e Ribeiro Dantas seguiram voto do relator.
Limites
O ministro João Otávio de Noronha divergiu do relator. O ministro destacou que não questiona que o Coaf possa compartilhar dados com o MP ou com o juízo independente de autorização judicial. “Essa discussão não está posta”, ressaltou. Noronha disse que se questiona os limites e a maneira que o relacionamento deve se dar.
O ministro destacou que no julgado do STF no RE 1.055.941. Para Noronha, não houve no julgamento do RE identificação dos efetivos limites do conteúdo dos relatórios de inteligência compartilhados com o Coaf e com órgãos persecutórios, já que a fixação da tese, nesse ponto, deu-se de maneira abstrata, sem análise do caso concreto.
Segundo Noronha, não se pode pedir que o Coaf investigue ou questionar o que mais se tem sobre o investigado, pois o que ele proporciona é apenas um banco de dados. “Se um órgão pedir informação, só pode fornecer a resposta nos exatos limites que poderia realizar se fosse espontaneamente”, completou.
Noronha disse que o julgamento teria o papel de verificar o cumprimento das diretrizes abstratamente afirmadas na tese 990 ao caso concreto, “ônus que nunca pertenceu ao STF”.
“O RIF foi confeccionado oito meses antes do paciente ser formalmente qualificado como investigado. Ele foi investigado sem um procedimento. Esse fato é inclusive confirmado às informações prestadas ao relator. Transformou um órgão de inteligência num órgão de investigação. Tudo poderia ter sido obtido de forma legal, mas não se fez.”
Dessa forma, declarou i) a nulidade do compartilhamento dos dados por meio dos RIFs 34.670, 38.484, 39.127 e 468, encomendados pelo MP ao Coaf; ii) a nulidade por delibação das demais diligências realizadas a partir das origens indicadas; iii) a nulidade das provas obtidas a partir da obtenção de fitas gravadas de segurança dos caixas e terminais de agências bancárias sem autorização judicial; iv) a nulidade das provas obtidas a partir de respostas enviadas pelas empresas ao MP com especificação de transições bancárias e v) a nulidade da decisão do desarquivamento do procedimento.
Assim, deu provimento para conceder a ordem. O ministro Joel Ilan Paciornik acompanhou a divergência.
Competência
No RHC 135.206, em que a defesa alega que os fatos ocorreram quando Flavio era deputado estadual e, por isso, deveria ter tramitado desde o início na segunda instância, o relator também negou provimento ao agravo ao entender que o recurso foi prejudicado pela decisão anterior.
Os ministros Reynaldo da Fonseca e Ribeiro Dantas acompanharam o relator.
O ministro João Otávio de Noronha divergiu. O ministro votou para dar provimento ao recurso para que a questão fosse apreciada pelo Órgão Especial do TJ/RJ. A divergência foi seguida no mérito pelo ministro Joel Ilan Paciornik.
Assim, a turma, por maioria, julgou prejudicado o recurso e negou provimento ao agravo.
- Processo: RHC 125.463 e RHC 135.206