Em decisão unânime, os ministros do STF, em sessão virtual, decidiram pela garantia da aplicação da lei anti-homofobia no Distrito Federal. A lei prevê punição de até R$ 10 mil em casos de intolerância.
O plenário declarou inconstitucional o decreto legislativo 2.146/17 da Câmara Legislativa, que sustava os efeitos de norma do Executivo local que regulamenta lei sobre sanções às práticas discriminatórias em razão da orientação sexual no DF.
Na sessão virtual encerrada em 20/11, o plenário julgou procedente as ADIns - Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5.740 e 5.744, propostas, respectivamente, pelo PSOL e pelo governador do Distrito Federal.
A lei distrital 2.615/00 (lei anti-homofobia) prevê sanções administrativas pela prática de condutas homofóbicas e, no artigo 5º, estabelece que cabe ao governo do DF regulamentar questões procedimentais. Em 2017, o Executivo editou o decreto 38.923/17, que regulamentava este ponto da lei. A Câmara Legislativa, no entanto, aprovou o decreto legislativo 2.146/17, que sustou a eficácia da norma regulamentadora, apresentando como justificativa considerações sobre a necessidade de proteção à família.
Uso estrito
O colegiado acompanhou o voto da relatora das ações, ministra Cármen Lúcia. S. Exa. explicou que o exercício da prerrogativa do Poder Legislativo de sustar atos normativos do Executivo ocorre nas hipóteses expressamente previstas no texto constitucional (artigo 49, inciso V): quando o chefe do Poder Executivo extrapolar seu poder regulamentar ou os limites de delegação legislativa.
“Não pode o Legislativo cogitar de legitimidade da prática para sustar ato normativo do Executivo por discricionariedade ou pelo mérito do ato questionado”, afirmou.
No caso concreto, a relatora assinalou que o decreto cujos efeitos foram sustados foi expedido com base na lei distrital 2.615/00, cujo artigo 5º atribui expressamente ao Executivo o dever de regulamentar o diploma legal no prazo de 60 dias, em especial quanto ao recebimento de denúncias e representações, à apuração dessas denúncias e à garantia de ampla defesa dos infratores.
A ministra observou que parte dos dispositivos do decreto se limita a reproduzir o conteúdo da lei, e a outra parte apenas cumpre o que fora determinado pelo legislador distrital. A análise dos dispositivos, segundo a ministra, conduz à conclusão de que o governo do Distrito Federal não exorbitou de seu poder regulamentar. Nesse sentido, a suspensão dos efeitos do ato normativo pela Câmara Distrital configura intromissão desse órgão em competência privativa do chefe do Poder Executivo.
Retrocesso social
Ainda de acordo com a ministra, a justificativa do projeto de decreto legislativo fundamenta-se apenas em considerações genéricas sobre a necessidade de proteção à família, dissociando-se da matéria tratada na lei distrital. “A lei e sua regulamentação não prejudicam, sequer em tese, a proteção à família, antes reforçam-na, resguardando os integrantes da unidade familiar contra condutas discriminatórias em razão de sua orientação sexual”, ressaltou.
Ao proteger grupo vulnerável, a seu ver, a legislação distrital harmoniza-se com o objetivo fundamental da República de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Cármen Lúcia lembrou o julgamento conjunto do MI - Mandado de Injunção 4.733 e da ADO - Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26, quando o Supremo reconheceu o dever constitucional de punição de condutas discriminatórias em razão da orientação sexual e da identidade de gênero das pessoas.
“Ao sustar os efeitos do decreto, o objetivo da Câmara Legislativa do DF foi impedir a aplicação da lei distrital, impondo óbice à proteção das pessoas contra condutas discriminatórias em razão de sua orientação sexual”, afirmou. Essa prática, para a ministra, atenta contra os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade e implica inaceitável retrocesso social.
Leia o voto da relatora na íntegra.
Informações: STF.