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Projeto que dá autonomia ao Banco Central pode ser votado hoje no Senado

Propostas semelhantes estão em discussão no Congresso Nacional desde a década de 90 e nunca se chegou a um consenso para aprová-las.

3/11/2020

Propostas que dão autonomia ao Banco Central para executar a política monetária, ou seja, determinar a quantidade de moeda em circulação, a oferta de crédito e as taxas de juros na economia brasileira para controlar a inflação, estão em discussão no Congresso Nacional desde a década de 1990 e nunca se chegou a um consenso para aprová-las.

Divergências a respeito da função do Bacen e do que a economia e o país podem ganhar ou perder com diretores tendo mandato fixo nunca foram apaziguadas entre os dois campos opostos.

Para os favoráveis à garantia de mandato com prazo determinado para o presidente e os diretores do Banco Central, a autonomia impedirá trocas de dirigentes pela simples vontade presidencial ou por pressões político-partidárias e eleitorais. Também acreditam que dará segurança jurídica às decisões econômicas e evitará cenários como os de presidentes da República concorrendo à reeleição que não permitem ao BC elevar juros, causando instabilidade no mercado antes de renovar seu mandato, por exemplo.

Já os que são contra a tese defendem que o desalinhamento institucionalizado entre a diretoria do banco e o Executivo gera prejuízos ao país, já que o governo perde a capacidade de estimular o crescimento da economia em épocas de crises, como a que o mundo vive com a pandemia de covid-19, utilizando a política monetária em sintonia com a política fiscal (arrecadação de receitas e execução de despesas buscando crescimento com baixo desemprego, estabilidade de preços e distribuição de renda). Além disso, o Bacen poderia passar a se submeter aos interesses do mercado financeiro.

Sede do Banco Central em Brasília(Imagem: Rodrigo Oliveira/Caixa Econômica Federal)

Tornar o Banco Central autônomo foi uma das promessas de campanha do então candidato a presidente da República, Jair Bolsonaro, em 2018. Outros candidatos como Fernando Haddad defendiam a ação autônoma do BC, mas sem aprovar legislação específica para isso, mais ou menos o que já ocorre hoje.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, decidiu pautar o PLP 19/20 para esta terça-feira, 3, para que a maioria finalmente decida o destino da instituição.

O PLC 19/20 dá autonomia, não independência ao BC: sendo autônomo, ele ainda tem algum grau de subordinação ao governo Federal, sendo independente, pode implantar políticas monetárias sem discussão prévia com nenhuma esfera de poder.

Mandato

A presidência do Banco Central, hoje ocupada pelo economista Roberto Campos Neto, e os outros oito integrantes da diretoria colegiada são indicados pelo presidente da República e passam por sabatina e aprovação no Senado Federal. Mas o Executivo pode demiti-los quando quiser, sem precisar de justificativas. Esse é o principal ponto a ser alterado pelo PLP 19/19 – Complementar. Ao estabelecer um mandato fixo para os diretores, o Bacen ganha autonomia em relação ao governo Federal, apesar de ainda precisar se submeter ao CMN - Conselho Monetário Nacional. No entanto, a ideia está longe de ser consensual.

Na opinião do consultor legislativo Benjamin Tabak, que acompanha o andamento do PLP 19/19 no Senado, hoje o Bacen já opera com bastante autonomia, mas essa atuação fica à mercê do governante da vez. Por isso, é importante assegurá-la em lei.

“O Banco Central já atua com autonomia de fato para realizar sua política monetária. O PLP 19/2019 garante a autonomia de direito. A autonomia de direito ajuda a reduzir as pressões políticas sobre as decisões do Banco Central. Os países desenvolvidos já têm bancos centrais com autonomia de direito. Essa autonomia é essencial para que o Bacen possa desenvolver suas atividades livres de potenciais pressões e aumenta a credibilidade da política monetária. Ainda que, atualmente, exista essa autonomia, nada garante que os próximos governos a manterão. Ao solidificar a autonomia em lei, fica mais difícil que governos futuros retrocedam nesse aspecto.”

A autonomia, acrescentou Tabak, permite que a entidade possa atingir o objetivo de controlar a inflação e sinaliza de forma positiva ao mercado, aos investidores e à população que buscará atingi-lo de forma adequada, mesmo com eventual troca de governo com ideologias distintas.

Já para o economista Bruno Moretti, o Bacen não deveria atuar com autonomia em relação ao governo Federal, principalmente num contexto de crise econômica, quando o governo precisa usar instrumentos monetários e fiscais combinados para estimular a retomada do crescimento e a geração de emprego e renda. Por isso, para ele, a proposta não deveria ser aprovada.

Vácuo

O PLP 19/19 é de autoria do senador Plínio Valério. Segundo ele, a proposta preenche uma lacuna, já que o governo Bolsonaro demorou para enviar ao Congresso a sua proposta (PLP 112/19 – Complementar, que aguarda análise na Câmara dos Deputados e é mais ampla).

Ao contrário da proposta do Executivo, que também trata de autonomia administrativa e financeira do Bacen, o PLP 19/20 aborda somente a autonomia da política monetária da instituição.

Pelo texto de Plínio Valério, o Bacen deixaria de ser vinculado ao ministério da Economia e se tornaria uma autarquia especial, sem estar vinculado a ninguém. Os mandatos da diretoria seriam de quatro anos, com uma recondução permitida, e a dispensa de um diretor antes do fim do período só seria possível em casos de condenação judicial ou desempenho insuficiente. Nessa última hipótese, o Senado precisaria concordar com a decisão.

Esses mandatos, propositadamente, não deverão corresponder ao do chefe do Executivo. O presidente do BC tomaria posse no início do terceiro ano de mandato do presidente da República, de modo que as gestões não coincidam totalmente. Os demais integrantes do colegiado também terão mandatos distribuídos no tempo, segundo a proposta: a cada ano, dois tomariam posse. O presidente do Bacen deixaria de ter status de ministro, já que o presidente da República tem o poder de nomear e demitir um ministro a qualquer tempo.

Para Plínio Valério, é fundamental aprovar rapidamente o projeto, que já teve a análise adiada em outubro e coloca o país em paridade com outras nações desenvolvidas cujos bancos centrais são independentes. Segundo o senador, os parlamentares passaram os últimos sete meses da pandemia votando matérias para distribuir dinheiro público e não foram capazes de analisar a autonomia do Bacen “para dar segurança jurídica e trazer investimentos” ao Brasil.

Fonte: Agência Senado.

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