Tribunais de todo o país estão retomando a realização de audiências de custódia de forma presencial, seguindo protocolos de segurança sanitária enquanto mantêm o direito de apresentação do preso ao juiz em até 24 horas após a detenção.
Com o início da pandemia no Brasil em março, diversos tribunais optaram por suspender as audiências seguindo a recomendação CNJ 62/20, mas as atividades estão sendo retomadas no modo presencial gradualmente devido à relevância para a própria finalidade do instituto, como a identificação de eventuais casos de tortura e maus-tratos.
Tribunais de Justiça de Amapá, Mato Grosso do Sul, Pará, Rio de Janeiro e Roraima estão entre os que já retomaram a realização das audiências de custódia de forma presencial, totalmente ou parcialmente – seguindo protocolos locais e normativas das próprias cortes voltadas à prevenção à contaminação por covid-19. Outros sete tribunais também já estão elaborando planos para o retorno dessa atividade.
A retomada da realização presencial das audiências envolve mudanças nos procedimentos, como a adequação de salas, a instalação de divisórias entre as pessoas presentes e o distanciamento seguro, além de medidas sanitárias como aferição de temperatura, uso obrigatório de máscaras e a limpeza dos ambientes.
Ainda em março, o CNJ editou a recomendação 62/20, orientando tribunais e magistrados para adoção de medidas preventivas à propagação do novo coronavírus no sistema de Justiça Penal e socioeducativo. O texto considera que a manutenção da saúde das pessoas privadas de liberdade, especialmente devido à situação de confinamento e superlotação nos presídios brasileiros, é essencial para a garantia da saúde coletiva e da segurança pública.
Funcionamento
Em Roraima, por exemplo, as audiências de custódia foram retomadas na capital, Boa Vista. Para esse retorno, diversas medidas foram adotadas, como a instalação de divisórias de acrílico transparente nas salas, de modo a garantir um distanciamento social ainda mais seguro. Além disso, a temperatura dos participantes é aferida antes do início de cada audiência e kits com máscaras e álcool em gel são distribuídos. A cada intervalo do procedimento, há também higienização dos ambientes.
A titular da 1ª vara do Tribunal do Júri e da Justiça Militar do TJ/RR, juíza Lana Leitão, destaca que as audiências funcionam para a implementação completa da garantia de direitos assegurados na Constituição Federal. “O retorno das audiências de custódia é uma medida necessária, mas a prevenção vem em primeiro lugar. E o TJ/RR adota critérios fundamentais para esta retomada”, observou, ao assinalar que a audiência de custódia é essencial para qualquer pessoa que foi presa.
Em Marabá, no Pará, foi criada a chamada “sala limpa”, onde são realizadas as audiências presenciais, como explica o juiz titular da vara de Execuções Penais da comarca, Caio Berardo. Segundo o magistrado, o ambiente foi preparado para esta finalidade, e por isso passa por desinfecção com mais frequência. O TJ/PA emitiu portaria regulamentando o retorno das atividades presenciais e reiterando a vedação de videoconferência para as audiências de custódia.
O Judiciário do Rio de Janeiro também se adaptou para retornar o atendimento presencial das pessoas custodiadas. Antes da pandemia, eram cinco as salas para realização das audiências – elas foram reformadas e transformadas em três, garantindo o distanciamento necessário entre os presentes. Também estão sendo distribuídos equipamentos de proteção individual, além do estabelecimento de um novo protocolo de limpeza após cada sessão.
Como explica a juíza de Direito da 29ª vara Criminal da comarca da Capital Simone Rolim, os departamentos médico e de engenharia do tribunal trabalharam juntos para estabelecer os protocolos. Outra medida é a testagem rápida para covid-19 de quem ingressa no sistema prisional.
Prevenção
Com a suspensão das audiências de custódia como forma de prevenção à propagação do novo coronavírus, o CNJ trabalha em alternativas para o acompanhamento da situação de novas prisões, garantindo a saúde dos profissionais de Justiça Criminal e das pessoas sob custódia. Uma das medidas é o lançamento de um formulário online para preenchimento pelo Judiciário após a análise dos APF - Autos de Prisão em Flagrante. Já foram registrados mais de 70 mil APFs na plataforma.
Como explica o coordenador de ações de audiência de custódia do programa entre CNJ, PNUD Brasil e UNODC, Rafael Barreto Souza, a audiência de custódia é a garantia de um direito fundamental de toda pessoa presa em flagrante ser levada à presença do juiz para análise da legalidade da prisão e também de indícios de tortura e maus-tratos.
Em levantamento realizado em junho deste ano, o CNJ identificou que, desde o início da pandemia e com a suspensão das audiências de custódia, houve um decréscimo de 83% no percentual de relatos de tortura e maus-tratos no ato da prisão, em comparação com o dado pré-pandemia. Em março de 2020 foram registradas 11,9 mil audiências de custódia, com 1.033 casos de tortura apontados (8,67% do total). Já entre abril e maio de 2020 foram realizadas 10,5 mil audiências de custódia, com indicação de tortura e maus-tratos em apenas 150 casos (1,42% do total). Ao se comparar dados de abril 2019 com abril de 2020, a queda de relatos foi de 66%.
Informações: CNJ.
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