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Primeiro catedrático negro das Arcadas terá nome em auditório da Faculdade de Direito da USP

Homenagem a José Rubino de Oliveira eterniza seu nome como representante da luta histórica de negros e negras.

6/10/2020

O ano de 2020 foi marcado por protestos antirracistas ao redor de todo o mundo. Em maio, mesmo em meio à pandemia do coronavírus, ativistas foram às ruas entoando o mote “Black Lives Matter” (vidas negras importam), uma campanha contra a violência direcionada às pessoas negras. A onda de protestos teve início após triste episódio envolvendo a morte de homem negro, Geroge Floyd, morto asfixiado por um policial branco, nos Estados Unidos.

Se em pleno ano de 2020, o Brasil tem dificuldades para vencer o preconceito racial, imagine a luta enfrentada pela população negra no período escravagista brasileiro. Naquela época, poderia parecer inimaginável um negro cursar Direito na principal faculdade do país.

Mas a perseverança de José Rubino de Oliveira ajudou a mudar essa realidade. José Rubino foi o primeiro negro catedrático da Faculdade de Direito do Largo S.Francisco. Para o centro acadêmico XI de Agosto, trata-se de um dos nomes mais corajosos que já pisou na 1ª academia de direito do Brasil. 

(Imagem: Acervo do Museu Paulista da USP)

Hoje, mais de 150 anos após ingressar naquela faculdade, José Rubino recebe uma homenagem póstuma nas Arcadas. Seu nome será eternizado em auditório do primeiro andar, como representante na luta histórica de negros e negras. Será o "Auditório Professor Rubino de Oliveira". A homenagem foi aprovada por unanimidade na sessão da Congregação da Faculdade de Direito da USP.

A iniciativa do Centro Acadêmico XI de Agosto resgatou a história do homenageado e deu início à coleta de assinaturas. Foram quase mil alunos apoiando.

Mais do que o reconhecimento ao primeiro negro catedrático da instituição, a nominação é uma recognição à luta daqueles que trabalharam e trabalham para mudar a história do Brasil.

Auditório Rubino de Oliveira

A Faculdade de Direito da USP é conhecida por ter em seu edifício diversos quadros de antigos professores expostos, além de salas nomeando diversos deles.

De todas as salas nomeadas, apenas duas são destinadas a mulheres e apenas três para figuras históricas negras, Pedro Lessa, Luiz Gama e Cesarino Jr.

O auditório a receber o nome do professor, localizado no primeiro andar da faculdade, tem nomeação ainda mais simbólica: ele teve reforma financiada pela família do banqueiro Pedro Conde, ex-proprietário do banco BCN. 

A família, por sua vez, esperava ver o nome do banqueiro estampado no auditório - o que não seria possível, pelo princípio da impessoalidade. Diante do imbróglio, a faculdade acabou por devolver a doação. 

Foi então que os acadêmicos do XI de Agosto se mobilizaram para que o primeiro professor negro do Largo S.Francisco nomeasse o local.

História

Nascido em Sorocaba, em 1837, órfão de pai, foi alfabetizado pela padrasto e passou a infância na pobreza, exercendo o ofício de seleiro. Para ter acesso à educação, matriculou-se em um seminário, e lutou para ser aluno das Arcadas. Formou-se no Largo São Francisco em 1864, aos 27 anos. E foi 15 anos depois, em 1879, após mais de dez tentativas – que não foram suficientes para fazê-lo desistir –, José Rubino venceu o concurso para a cátedra de Direito Administrativo.

À época, dividiu seu saber com os colegas como Ruy Barbosa, Luiz Gama, Rodrigues Alves e Joaquim Nabuco. Trocou talento com o poeta Castro Alves. E nunca negou sua cor, como muitos faziam.

Para a causa abolicionista, advogou nos tribunais com grande êxito, conseguindo libertar muitos escravos. Rubino morreu em 1891, apenas três anos após a promulgação da Lei Áurea, que deu liberdade formal dos negros no Brasil em 1888.

Reconhecimento

Para o professor José Vicente, advogado e reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, o gesto da faculdade de Direito da USP representa "importante, devida, justa e oportuna homenagem a uma das mais importantes personalidades jurídicas e negras de sua época". "Foi um extraordinário jurista e competente professor, que, ao longo de sua trajetória, lustrou a mente e preparou o caminho vitorioso de seus alunos", destacou, afirmando que o registro homenageia a presença dos poucos negros no espaço do conhecimento jurídico. Assista.

"Rubino é exemplo de dedicação, de vitória. Ultrapassou obstáculos em um tempo que o preconceito atingia dimensões gigantescas. Além de ser um administrativista à frente do seu tempo", acentuou o diretor da FDUSP Floriano de Azevedo Marques Neto, ao comentar a decisão e o apoio expresso dado, entre outros, pelos professores Nina Ranieri, Alberto do Amaral Jr., Marcos Augusto Perez, Eduardo Vita Marchi, Fernando Dias Menezes e José Levi Mello do Amaral.

O professor Vita Marchi, Direito Civil e diretor da FDUSP entre 2002 e 2006, aplaude a iniciativa. Entusiasta de ações afirmativas de cotas sociais para negros na USP, o docente conta que também foi um dos proponentes para dar nome a Sala Ceranino Júnior, primeiro catedrático negro de Direito do Trabalho na Faculdade do Largo de São Francisco. "A nominação do auditório Rubino de Oliveira é momento histórico não só para a FDUSP como para São Paulo e para o Brasil. É a história de nossa escola, contada por aqueles que ajudaram e ajudam a construir a democracia brasileira."

Para Letícia Chagas, presidente do XI de Agosto, a homenagem é mais um passo para dar visibilidade aos negros e negras que também construíram a história do país, em todos os campos. Agora, afirma, as alunas e os alunos têm a oportunidade de conhecer sua história. "O reconhecimento ajuda a dar relevância às pessoas negras que participaram da criação e desenvolvimentos da nossa faculdade."

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