A 1ª Turma Recursal da JF/PR manteve a condenação à União de indenizar em R$ 20 mil o juiz Marcos Josegrei da Silva, da operação Carne Fraca, em decorrência de declarações do ministro Gilmar Mendes, no desempenho de suas funções públicas.
Nesta quinta-feira, 7, a turma julgou o recurso da União contra a sentença da juíza Federal Giovanna Mayer, da 5ª vara de Curitiba. A sentença foi reformada apenas quanto à incidência dos juros sobre o valor da condenação.
A União sustentou no recurso que as hipóteses de responsabilidade civil do Estado por ato jurisdicional devem estar expressamente previstas em lei e que o direito alegado pelo autor não se enquadra em nenhuma delas. Assim, o ato judicial somente poderá gerar direito à reparação de danos se incorrer em erro judiciário ou quando o magistrado, no exercício de suas atribuições, praticar ato procedendo com dolo ou fraude.
“Conduta temerária”
No julgamento do recurso na turma, a relatora Márcia Vogel Vidal de Oliveira rechaçou a tese da União. Conforme a relatora, a controvérsia diz respeito ao abalo moral decorrente de comentários ofensivos feitos por ministro do STF durante duas sessões de julgamento realizadas naquela Corte.
“O magistrado da Suprema Corte proferiu o seu voto mencionando que as investigações teriam por objeto a venda de "carne com papelão", aproveitando a oportunidade para dirigir uma série de palavras ofensivas ao autor, condutor da Operação, visando desqualificar não apenas o seu trabalho, mas, sobretudo, a sua pessoa. Buscou-se, assim, humilhar o magistrado de primeiro grau.
Não se pode ignorar que o próprio autor, mais de um ano antes, já havia esclarecido publicamente que as investigações não tinham nenhuma relação com a utilização de substâncias impróprias na carne, ao contrário do que estava sendo divulgado pelos meios de comunicação até então.”
A relatora considerou que havia HC em julgamento no STF no âmbito da operação Carne Fraca, de modo que Gilmar Mendes “já tinha ciência (ou ao menos deveria ter) de que a informação acerca da utilização de substâncias impróprias na carne não correspondia à realidade e ao objeto do processo”.
“Ademais, também é possível admitir que a conduta temerária do excelentíssimo Ministro faz incidir a hipótese prevista no inciso LXXV do art. 5º da CF/88, ocorrendo o "erro judiciário" no tocante ao registro naqueles autos da infundada versão acerca da mistura de "papelão à carne" como objeto das investigações da "Operação Carne Fraca".”
Assim, afirmou Márcia de Oliveira, como o juiz Marcos Josegrei da Silva teve a sua honra violada por um agente público da União, é de se reconhecer o seu direito à reparação de danos.
“É evidente que as críticas realizadas pelo excelentíssimo Ministro do STF ao autor foram desrespeitosas e feitas à margem de conteúdo ou técnica jurídica, extrapolando a linguagem formal que deve ser adotada nas manifestações do Poder Judiciário. Além disso, percebe-se que as observações feitas pelo agente estatal, com menção expressa ao nome do autor, foram de cunho estritamente pessoal.
As palavras ofensivas não foram direcionadas à atuação profissional do autor como magistrado, mas diretamente à sua pessoa, para o fim de contrangê-lo publicamente, atingi-lo em sua dignidade. Não há como considerar os termos "ignorante", "sem qualificação", "imbecilizado", "analfabeto voluntarioso", "estrupício", "inimputável" como direcionados apenas à atuação profissional do autor.”
Por fim, concluiu a relatora, o valor da condenação não mereceu reparo, pois “as ofensas ocorreram em dois momentos diversos, foram televisionadas e tiveram ampla divulgação”. A decisão da 1ª turma Recursal foi unânime.
- Processo: 5040456-74.2018.4.04.7000
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