A Corte Especial do STJ decidirá ação penal que tem como réu o governador do Amapá Waldez Góes, acusado de peculato-desvio, e o polêmico caso já tem votos divergentes.
A Corte vai decidir se condena o governador por reter na folha de pagamento dos servidores públicos os valores de empréstimos consignados, sem repassá-los às instituições financeiras conveniadas, utilizando-os para saldar outras dívidas públicas. A defesa apontou a crise financeira a justificar o ato.
Na sessão desta quarta-feira, 19, o ministro Noronha apresentou voto-vista divergindo do relator, o ministro Mauro Campbell.
Para Noronha, há de se considerar que “a retenção custou ao Estado despesa adicional” de cerca de R$ 6 milhões, e que “jamais o Estado poderia utilizar-se dos negócios particulares dos servidores como ato de sua disponibilidade”. Explicou S. Exa. que no empréstimo consignado o Estado não manipula dinheiro público e sim particular.
“É um negócio realizado entre particulares – servidores e bancos – e o Estado é apenas intermediário do dinheiro. Os valores não podem ser alcançados pelo administrador para outras finalidades que não o pagamento do empréstimo. Abrir aqui um precedente, vamos ter governador apropriando de milhões de reais de servidores. Qualquer dificuldade financeira, apropria. Gera-se uma anarquia no sistema financeiro nacional.”
Para Noronha, o administrador público traiu a confiança dos servidores, estando presentes os elementos caracterizadores do tipo.
“O crime consumou-se com a não transferência dos valores descontados na folha de pagamento dos servidores. O acusado (...) descumpriu os termos do convênio firmado com as instituições financeiras.”
O ministro chamou a atenção dos colegas para o fato de que tal prática afeta o mercado, na medida em que o risco para as instituições financeiras aumenta, até mesmo privando os servidores do benefício do consignado.
Na conclusão, aplicou pena de 6 anos e 9 meses de reclusão no regime semiaberto; também condenou o governador a pagar ao Estado do Amapá o valor de R$ 6,3 mi atualizados.
Ausência de provas
Após a divergência, o ministro Campbell fez a leitura integral do voto (já que não o havia feito na sessão em que Noronha pediu vista).
O voto do ministro considera que os recursos retidos na folha foram usados para saldar parte da dívida do ente estatal, não sendo possível afirmar que o réu tenha agido em proveito próprio ou alheio - a conduta pode ser alcançada por outra tipificação, mas não a do crime de peculato-desvio.
“Não há prova de que tenham sido preenchidos os requisitos exigidos para a configuração do crime de peculato-desvio previsto no art. 312, já que não há prova nos autos de que o desvio tenha sido feito em proveito próprio ou alheio e ilícito, circunstância também imprescindível para a consumação do delito.”
O ministro Benedito Gonçalves acompanhou o relator, e em seguida o ministro Raul Araújo pediu vista dos autos.
- Processo: APn 814