Queimadas
SP proíbe por tempo indeterminado da prática da queima da palha de cana-de-açúcar em todo o Estado
Surpreendendo a todos, o respeitado secretário estadual do Meio Ambiente, José Goldemberg, em ato aprovado pelo Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais (DEPRN) e que será publicado no Diário Oficial de hoje, proibiu a queima da cana-de-açúcar em SP.
O ato, que teve por base o art. 14 do Decreto nº. 47.700 de 2003, determina a suspensão por tempo indeterminado da prática da queima da palha de cana-de-açúcar em todo o Estado, considerando os baixos índices de umidade relativa do ar que vêm sendo registrados.
Artigo 14 - O Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais - DEPRN, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental - CETESB e a Polícia Ambiental determinarão a suspensão, parcial ou total, da queima quando:
I - constatados e comprovados risco de vida humana, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis;
II - a qualidade do ar atingir comprovadamente índices prejudiciais à saúde humana, constatados segundo o fixado no ordenamento legal vigente;
III - os níveis de fumaça originados da queima, comprovadamente comprometam ou coloquem em risco as operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de transporte.
Queimadas em foco
A equipe do Migalhas resolveu entrar na discussão em torno das queimas realizadas nos canaviais.
Com efeito, o assunto passou a ganhar mais importância após o surgimento da Lei Estadual nº. 11.241, de 2002, que dispõe sobre a eliminação gradativa da queima da palha da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, e altera as disposições da Lei nº. 10.547, de 2000.
Regulamentada pelo Decreto nº. 47.700, de 2003, a lei apresenta, em seu artigo 2º, a tabela de eliminação gradativa do atual processo de cultivo, que deverá ser totalmente substituído até 2031. A partir daí, só poderá existir o cultivo mecanizado da cana crua.
A Lei também diferenciou, para o efeito da progressão qüinqüenal da eliminação da queima, as áreas mecanizáveis. Como é mais difícil substituir o atual sistema de queima nessas áreas, elas têm um prazo maior para eliminar essa prática.
Nunca é demais lembrar o teor da auspiciosa Lei nº. 6.938/81, que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente e deixa explícito que todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e que ele é um patrimônio público a ser assegurado e protegido.
Mas se a queima causa tantos danos ao meio ambiente e prejudica a saúde das pessoas que estão próximas ao local em que a fumaça se propaga, por que, então, queimar a palha da cana-de-açúcar ?
Quem responde essa inquietante pergunta são os cortadores de cana de Cravinhos, interior de São Paulo. Marlene, 41, mãe de três meninas, conta que cortar a cana verde, ou seja, sem queimar, faz com que o rendimento do trabalho caia e que o funcionário não receba o que está esperando.
A indignação é grande, já que cortar a cana verde é mais trabalhoso e o que se paga é igual quando se corta a queimada, – no caso, R$ 2,50 a tonelada. Por isso os cortadores entraram em um acordo com plantadores para que eles adotassem o sistema de queima.
Os usineiros concordam em aceitar a palha da cana-de-açúcar queimada, por que os empregados conseguem aumentar a sua produtividade.
Após a queima, o corte deve ser efetuado sem muita demora. Normalmente, a cana é queimada à noite, e logo pela manhã os cortadores já chegam para o corte. E isso se dá, segundo apuramos, porque conforme o tempo passa, a cana perde o peso – perde o suco - e, conseqüentemente, seu valor.
Marlene insiste que se o agricultor quiser, ele pode aumentar o valor pago pela cana. Ela se diz frustrada quando fala que enquanto recebe R$ 2,50 pela tonelada, o agricultor recebe quase 5 vezes mais pelas Usinas.
E, por mais paradoxal que possa parecer, para que melhore as condições de trabalho é preciso continuar a queima da palha da cana-de-açúcar, facilitando assim o corte, e aumentando significativamente o valor pago pela tonelada cortada.
No entanto, não se pode olvidar que é preciso a contrapartida de fornecer aos cortadores a proteção necessária – máscaras, caneleiras, óculos - de modo que estes não sofram nenhum tipo de acidente durante o trabalho.
A análise do comércio exterior mostra que o açúcar vem ocupando o primeiro lugar nas exportações do agronegócio paulista e, entre janeiro e setembro de 2005, o valor das exportações ultrapassou US$ 2 bilhões.
Mesmo com esses índices que, de uma maneira ou de outra, são favoráveis para o país, a insatisfação é geral. Os cortadores não se conformam com o tanto que trabalham e com o pouco que recebem, mas não deixam de trabalhar para não ficarem sem o seu sustento de cada dia. Os ambientalistas, por sua vez, provam o quanto a queimada causa malefícios gerais.
Caso a proibição da queima da Cana seja derrubada, ela ainda perdurará por muitos anos, até que pela progressão da área seja, enfim, eliminada.
No entanto, mesmo que não totalmente proibida, algumas ações - se não podem melhorar o meio ambiente - podem imediatamente fazer com que as queimadas não sejam um martírio para os cortadores. Como por exemplo, a obrigatoriedade do uso de certos materiais, que minimizem os danos causados na saúde destes valentes trabalhadores, cujos calos nas mãos fazem a riqueza agrícola do país.
Como tentamos mostrar, além da questão ambiental, a queimada da cana traz ainda uma discussão social que não pode ser deixada de lado.
Documentário
Aguarde alguns instantes até abrir um quadro negro, e depois passe o mouse sobre ele para ver um inédito documentário de Migalhas sobre as queimadas da cana.
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Ps. Para ler a íntegra das leis e dos decretos basta clicar sobre seus números.
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