A Corte Especial do STJ analisa em processo cujo julgamento começou em 2015 se a execução coletiva de uma obrigação de fazer proposta por sindicato interrompe o prazo prescricional da execução individual de quantia certa de servidores.
Na sessão da Corte Especial desta quarta-feira, 21, proferiu voto-vista o ministro Mauro Campbell, acompanhando o voto do relator, ministro Humberto Martins, que negou provimento ao recurso da UFRS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em caso que na origem trata do reajuste salarial de professores.
Os ministros Herman Benjamin, Og Fernandes e Luis Felipe Salomão já haviam votado com a divergência do primeiro, dando provimento ao recurso.
Desídia
No voto-vista, o ministro Campbell assentou as seguintes premissas:
(i) um título executivo judicial pode conter em si obrigações de naturezas distintas e independentes;
(ii) os ritos executivos são específicos, tendo em vista as peculiaridades necessárias à satisfação da obrigação e, por isso, são autônomos;
(iii) o início de um rito executivo não significa automaticamente manifestação de vontade pela satisfação de todas as obrigações previstas no título executivo judicial;
(iv) para fins de transcurso do prazo prescricional, presume-se desídia do beneficiário do título executivo judicial coletivo quando esse não inicia a execução individual na parte que lhe aprouver, independentemente da existência de execução coletiva promovida por alguma entidade do art. 82 do CDC.
“Assim, não haverá transcurso de prazo prescricional para execução de pagar quando essa estiver vinculada ao cumprimento da obrigação de fazer, por ordem expressa prevista no título judicial original.
Excepcionalmente, o início da execução de uma obrigação específica pode interromper o prazo prescricional da execução de outra obrigação contida no título judicial. Isso ocorre quando uma questão essencial à satisfação das pretensões do credor pode ser objeto de discussão em mais de um rito executivo.
Nesse tipo de hipótese, a presunção de desídia do beneficiário de direito individual homogêneo fica afastada pelas próprias circunstâncias de fato presentes na execução coletiva”.
No caso concreto, o ministro seguiu o entendimento de que o prazo prescricional para a execução individual esteve interrompido durante a execução coletiva da obrigação de fazer proposta pelo sindicato dos professores, já que nela houve uma busca sobre a definição do valor devido pela Administração Pública.
Autor do voto divergente, o ministro Herman Benjamin teceu considerações acerca das ações em análise, ponderando que o intuito da ação coletiva “não foi transformar essas ações em exceção aos prazos prescricionais”. “Nós temos a rigor, por conta dessas ‘interrupções’ ou ‘suspensões’, uma execução individual que nunca termina.”
O ministro Campbell respondeu que houve, no caso, desídia do Estado na medida em que questionou a legitimidade do sindicato. Seguiu-se então debate no qual Herman criticou a existência de situações que levem a imprescritibilidade de obrigações disponíveis, em casos nos quais o devedor “somos todos nós”.
Campbell – “Eu não sou devedor.”
Herman – “Todos nós somos.”
Campbell – “Eu não sou devedor. Quando o Estado deixa de implementar o reajuste salarial, eu não sou devedor. É o Estado.”
Herman – “O Estado somos todos nós. O Estado não é a mãe Joana.”
Campbell – “Nem eu estou dizendo isso. Não é a mãe Joana, mas eu é que não me considero devedor.”
Herman – “Eu respeito, mas eu e todos nós que pagamos impostos...”
Foi quando o ministro Noronha interveio para criticar que os professores da Universidade são os únicos que ainda não receberam o reajuste salarial, direito reconhecido pela Corte e já recebido inclusive por magistrados e advogados da União: “É uma saída heterogênea para o Estado não pagar o que deve. Ele ficou de pagar uma obrigação e não pagou mais.” Mais adiante, Noronha foi categórico ao afirmar:
"O Estado tem a mesma obrigação do particular de adimplir, de cumprir com sua obrigação. Quem é condenado a pagar tem que fazê-lo no tempo e no modo e na forma fixados na sentença. Não se pode dar um tratamento beneficiário a um ente público. Não podemos criar aqui um poder público diferenciado no cumprimento de suas obrigações. Até pelo princípio da legalidade, o poder público tem que dar exemplo de comportamento."
O ministro Herman fez um resumo do voto divergente, destacando que a necessidade de liquidação para adimplemento do reajuste, a ser pago dali adiante, não interfere no curso do prazo prescricional da ação de obrigação de pagar, já que pretensões autônomas.
Em seguida, o ministro Napoleão votou também com o entendimento de que não houve a pretendida prescrição no caso:
“A origem do percentual é a mora administrativa em liberar para os servidores esse reajuste. A Administração da Universidade foi condenada, nem implantou nem pagou. Teve que ser acionada p cumprir a obrigação de implantar. Não se pode sinalizar para o setor público que sua desídia pode ser premiada com a prescrição, qualquer que seja o contexto em que isso ocorra.”
Após os votos dos ministros Noronha e Napoleão, acompanhando o relator e Campbell, o ministro Benedito Gonçalves ficou com vista.
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Processo: REsp 1.340.444