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Consumo e cidadania: para ser feliz é preciso consumir?

O professor de Direito do Consumidor, Rizzatto Nunes, afirma que cidadania e consumo se misturam e se confundem.

15/3/2018

Não estranhe se você notou uma Black Friday fora de época nesta semana. As promoções têm um porquê: nesta quinta-feira, 15, é comemorado o dia do consumidor e as lojas, claro, aproveitam este período para alavancar as vendas. A data, instituída pelo ianque John Kennedy em 1962, rememora um direito que avançou a passos largos desde que a CF de 88 foi promulgada.

O dia do consumidor foi coroado com o CDC, que há 28 anos colocou fim à velha frase muito escutada por quem ia às compras nos anos 80: "Vá se queixar ao bispo!". Em 1990, a lei 8.078/90 direcionou os consumidores à Justiça, caso eles se sentissem lesados por uma compra não exitosa.

Vale lembrar que a relação entre consumidor e fornecedor, nesse período, tinha muitos motivos para não dar certo. A razão? O cenário brasileiro. No início dos anos 90 o que se via era uma inflação de 1600% ao ano; um quadro em que 20% dos adultos eram analfabetos e botar a boca no trombone, ou melhor, na internet, não era uma possibilidade. Uma legislação específica sobre o consumo viria em um ótimo momento.

É o que explica o desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor, Rizzatto Nunes, neste vídeo. Veja:

Contudo, à época, o CDC não foi muito bem visto aos olhos dos empresários e comerciantes. Um dos pontos que tirou o sono dos fornecedores foi a publicidade, já que o Código estabeleceu penas mais rigorosas com relação a propaganda enganosa. A fala do presidente da Associação Brasileira das Agências de Propagandas da época mostra que a preocupação de outrora, hoje, nada mais é do que o básico para as empresas:

"As informações que chegam às agências são transmitidas pelos clientes e não temos condições de checar se são todas procedentes. Teríamos de dispor de laboratórios para checar se determinado produto alimentício tem mesmo aquela composição vitamínica ou se o pneu é realmente antiderrapante."

(Clique na imagem para ampliar)

(Fonte: O Estado de S. Paulo, 1990)

Como era muito novo, o Código precisou ser explicado. Ele veio, na verdade, para estimular a iniciativa privada e beneficiar as empresas eficientes, pois segundo Nélson Junior, procurador da Justiça da época, ele "afasta os picaretas do mercado".

(Clique na imagem para ampliar)


(Fonte: Jornal do Commercio, 1991)

A consolidação do CDC ao longo dos anos deixou o consumidor mais exigente e também mais consciente. O site Consumidor.gov.br, um serviço público que permite a interlocução direta entre consumidores e empresas, contabilizou mais de um milhão de reclamações finalizadas. Vale pontuar também que hoje a internet dá ao consumidor um poder de escolha mais assertivo. Sites como o Reclame Aqui ou até mesmo as redes sociais servem para dar feedback dos produtos comprados. As próprias empresas, inclusive, fazem páginas nas redes sociais para poder estreitar essa relação que vai além da troca de produto e capital.

Consumidores e cidadãos

As mudanças na maneira de consumir alteraram as possibilidades e as formas de exercer a cidadania. Isso é o que postula o antropólogo Néstor Canclini, em seu livro Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Para o autor, o ato de consumir está intrinsecamente ligado ao ato de pensar e de escolher e, por conseguinte, essas escolhas nos fazem cidadãos. Simplificando a tese: se consumimos pouco, pouco somos vistos como cidadãos.

"Devemos no perguntar se ao consumir não estamos fazendo algo que sustenta, nutre e, até certo ponto, constitui uma nova forma de ser cidadão." (p. 42)

Rizzatto Nunes endossa a ideia de que o capitalismo gera um sistema que transforma a vida do homem moderno em uma relação de consumo. Há o lado bom e o lado ruim disso, o professor explica:

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