O plenário do TSE retomou nesta sexta-feira, 9, o julgamento que discute a cassação da chapa Dilma-Temer nas eleições de 2014, sob acusações de abuso de poder político e econômico. É o quarto dia de julgamento do caso.
Na sessão desta manhã, o relator, ministro Herman Benjamin, votou pela cassação da chapa Dilma-Temer. O julgamento deve ser retomado às 14h30. com os demais votos.
"Existindo provas robustas da responsabilidade da chapa coligação 'Com a Força do Povo' por irregularidades nos gastos eleitorais efetivados na campanha eleitoral de 2014, reitero responsabilidade objetiva, reconheço a ocorrência de abuso de poder econômico, com as consequências do artigo 22, inciso XIV, da LC 64/90."
O artigo 22, inciso XVIX, da LC 64, estabelece que: "julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar".
O ministro Herman afirmou que, pelo que viu e leu, a chapa "não foi a única" a praticar as ilicitudes. Mas, segundo ele, houve candidatos profundamente afetados pelo abuso de poder político e econômico aqui apurados. "Não sei se são os representantes, mas eu não vou tratar desse tema."
O ministro não leu a parte da unicidade da chapa, mas disse que sua conclusão é favorável a unicidade.
"No Brasil, ninguém elege vice-presidente da República. Elege-se uma chapa, unida, para o bem e para o mal. Os mesmos votos que elegem o presidente elegem o vice-presidente."
Ao fim de seu voto, o ministro declarou: “Eu como juiz recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão.”
Julgamento
Na sessão de ontem, que durou quase nove horas, o ministro Herman apresentou as premissas do voto e ressaltou ver abuso de poder em chapa Dilma-Temer. Segundo o ministro, os políticos tinham ciência de que a campanha era abastecidas por dinheiro ilícito e que, por isso, precisam ser punidos. O relator afirmou que a campanha Dilma-Temer foi a que mais recebeu recursos de empreiteiras que tinham esquema com a Petrobras, entre elas UTC, OAS, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, e que, por isso, os dois disputaram o pleito daquele ano com "muito mais vantagem" que os demais candidatos.
Na abertura da sessão de hoje, o ministro Gilmar Mendes, presidente, pediu que os outros ministros façam poucas intervenções ao voto do relator para que o julgamento tenha maior celeridade.
O relator começou analisando a propina ou caixa 2 oriundas da Odebrecht, quarto ilícito analisado por ele. "Não há como se investigar financiamento ilícito de campanha no Brasil sem investigar a Odebrecht Mesmo que a Odebrecht não tivesse sido citada nominalmente, nós não teríamos como esquecer a matriarca da manada de elefantes.”
De acordo com o ministro, os valores reais recebidos pela campanha superam em muito os valores oficiais "A simples não declaração ou utilização como caixa 1, que foi exatamente o objeto da petição inicial, basta para a cassação dos mandatos", diz o ministro Benjamin. "Os valores eram impressionantes."
Herman Benjamin afirmou que Marcelo Odebrecht não herdou só uma empresa, "ele herdou uma cultura de propinas. E sofisticou esta cultura de propinas". Segundo o ministro, o executivo faz parte da "terceira geração de uma família que dominou os poderes constituídos do Brasil" e fez parte de um dos esquemas de corrupção "mais sofisticados do mundo".
O ministro também relatou a dinâmica das doações eleitorais entre Odebrecht e os partidos da base aliada. “Aqui tudo começa como caixa 1 e termina como caixa 2". Segundo ele, a compra do apoio de partidos da base aliada tinha como objetivo aumentar o tempo de horário eleitoral gratuito na TV.
O ministro citou trechos de troca de e-mails nos quais os executivos da Odebrecht ouvem de políticos que já não precisavam mais de doações para o caixa 2, mas para o caixa 1. "Nós temos a palavra do dono do dinheiro, a palavra dos que participaram da entrega do dinheiro e a documentação impossível de ser forjada da correspondência do dono do dinheiro e do gerente principal deste evento, que era o senhor Alexandrino Alencar e o Fernando Reis.”
Herman afirmou que não importa se os recursos foram efetivamente para compra do tempo de rádio e TV, o que importa é que esses recursos foram pedidos e recebidos de forma ilícita. "Houve uma triangulação comprovada, por caixa 2, em pleno período eleitoral entre partidos integrantes da coligação."
Em seu voto, o relator também examinou as doações da Odebrecht via caixa 2, feitos por meio do marqueteiro João Santana. De acordo com ele, os pagamentos a João Santana e Mônica Moura pelos trabalhos durante as campanhas eleitorais extrapolavam, às vezes, três anos, mas sempre eram feitos. Segundo Herman o casal João Santana e Mônica Moura poderia ser definido como “casamento de indústria e comércio".
"Por um lado, as campanhas do partido podiam contar com a excelência da empresa do seu João Santana e da senhora Mônica Moura, que, por sua vez, contavam com a segurança de receber os milionários valores de seus contratos pela Odebrecht, a qual por fim mantinha as portas e acesso aos gabinetes mais elevados do governo inteiramente livres."
O ministro afirmou que João Santana e Mônica Moura receberam recursos advindos de caixa 2 em uma conta na Suíça."Toda a sistemática era construída para evitar deixar rastro da ilicitude."
Embate sobre o voto“Há forte e suficiente lastro probatório acerca do recebimento de valores por via não contabilizada, caixa 2, por parte do casal João Santana e Mônica Moura.”
O ministro Admar Gonzaga questionou o relator por não ter compartilhado seu voto. Ele reclama que ele e outros ministros vêm consumindo muitas horas de seus dias de trabalho apenas na ação do julgamento da chapa Dilma-Temer e que seria ideal que o ministro Herman divulgasse seu voto. "Nós estamos com dificuldade."
O ministro Herman explicou que não compartilhou seu voto com os outros ministros porque: irá explicá-lo ponto a ponto; o TSE não tem a figura do revisor; e que seu voto tem de novidade é a lógica do raciocínio.
Ato contínuo, o ministro Fux defendeu a posição do relator, "nós sempre confiamos, em nossa bancada, nos dados trazidos por nossos relatores". “É razoável a prudência do relator em evitar de todas as formas, sem nenhuma imputação a nós, um eventual vazamento de um pronunciamento judicial de uma causa tão importante assim da República.”
O relator, então, afirmou que o ministro Admar estava querendo se prender ao acessório do acesso. "Vamos nos concentrar nos pontos importantes"."Se é para retirar o depoimento de Marcelo Odebrecht, (...) que se diga abertamente."
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Processos: AIME 761, Rp 846, AIJE 194.358