Migalhas Quentes

Ministro Fachin vota a favor de leis que proíbem uso de amianto

A análise da questão foi interrompida após pedido de vista do ministro Dias Toffoli

23/11/2016

O plenário do STF deu início nesta quarta-feira, 23, ao julgamento da ADF 109, que discute a constitucionalidade da lei 13.113/01, editada pelo município de SP, a qual proíbe o uso de elementos construtivos e equipamentos constituídos por amianto na construção civil.

Após voto do relator, ministro Edson Fachin, pela improcedência da ação, a análise da questão foi interrompida por pedido de vista antecipada do ministro Dias Toffoli. Fachin também proferiu voto nas ADIns 3.356, 3.357 e 3.937 – que já haviam sido iniciadas –, as quais também foram suspensas devido ao pedido de vista.

Segundo Fachin, é constitucional a legislação estadual que, em matéria de competência concorrente, regulamenta de forma mais restritiva a norma geral, diante do âmbito de atuação permitido por ela.

"Da mesma forma, revela-se constitucional a legislação municipal que, em matéria de competência local comum e suplementar, regulamenta de forma mais restritiva a norma geral, dentro do âmbito de atuação permitido por ela."

Caso

A ADPF, no caso, foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria. A Confederação alega nos autos que a lei paulistana proíbe o uso da substância "sem uma razão sustentável do ponto de vista científico, tanto que manteve o consumo do mineral nos demais ramos industriais, tais como têxtil e automotivo" Para a CNTI, esse fato demonstraria a violação ao princípio da livre iniciativa.

Diz ainda que a lei 9.055/95 disciplina o tema da utilização do amianto e, dessa forma, havendo norma geral em vigor, de âmbito federal, a disciplinar a matéria, "resta aos municípios, na hipótese, a possibilidade de suplementar a legislação federal no que couber, sem, no entanto, opor-se à sua eficácia – na prática, derrogar a norma federal".

Sustentações orais

Em sua estreia como procurador do município de SP, José Eduardo Cardozo falou na tribuna em situação peculiar. Conforme destacado, Cardozo era o presidente da Câmara Municipal de SP no momento em que a lei em discussão foi aprovada.

"Participei de todas as discussões com especialistas, com técnicos, e com juristas. A matéria foi amplamente debatida, e posso dizer a Vossas Excelências que eu me convenci claramente da constitucionalidade e da correção dessa norma legislativa."

Segundo o procurador, há certas matérias sobre as quais todos podem legislar, no âmbito de sua respectiva dimensão. Afirmou, ainda, que a competência, no caso, é concorrente, "e parece correto que o façam ajustando as diretrizes nacionais às realidades que são locais". "Por isso quero dizer que essa ação é improcedente."

Falando pela CNTI, Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, por sua vez, sustentou que a competência é Federal, e os Estados não poderiam legislar como legislaram. "Se há uma lei federal, como um Estado pode fazer uma lei proibindo o uso do amianto?"

O advogado Carlos Mário da Silva Velloso Filho (Advocacia Velloso), representando o Instituto Brasileiro de Crisotila, defendeu que há outras inúmeras substâncias que, tal como ocorre com o amianto crisotila, se mal manipuladas, trazem riscos à saúde humana.

"Aqui não se está pregando o não banimento sob a invocação do princípio da igualdade, da isonomia, quer-se apenas demostrar que a vida contemporânea reclama o uso controlado de substancias que, se mal manipuladas podem trazer risco a saúde, mas também, por outro lado, trazem inúmeros benéficos ao ser humano."

Pela Associação Nacional dos Procurados do Trabalho sustentou o advogado Gustavo Teixeira Ramos (Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados), que destacou que o banimento do amianto é questão de tempo.

Segundo o causídico, a União Europeia baniu seu uso em 2005, assim outros 69 países. "O Brasil caminha na mesma linha, mas o drama humano aqui é a questão do tempo, porque se esse banimento demora, surgem cada vez mais vítimas."

"Se requer que sejam julgados improcedestes da ADPF 109, assim como ADIns referentes a leis estaduais, para que não haja retrocesso social, em memória às vítimas de ontem, e em respeito às vítimas de hoje, e para fundamentalmente vítimas amanhã."

O advogado Mauro de Azevedo Menezes, da banca Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, ponderou, falando pela Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto, que o princípio da precaução deveria clamar alto pela constitucionalidade da lei municipal.

"Existe uma curva de adoecimentos que vai muito longe e pode ser muito mais elevada a depender da decisão a se tomar nestes casos por este Supremo Tribunal Federal."

Representando a Associação Brasileira das Indústrias e Distribuidores de Produtos de Fibrocimento, Oscavo Cordeiro Corrêa Netto afirmou não ver qualquer conflito entre a lei federal 9.055 e as leis estaduais e municipais.

"Ao proibirem o uso do amianto nos limites dos respectivos territórios, não contrariaram a lei federal, antes a complementaram dando maior atendimento à convenção 162 da OIT e até mesmo à Constituição Federal em matéria de proteção à saúde e ao meio ambiente."

Por fim, o vice-procurador-Geral da República, José Bonifácio Borges de Andrada, ponderou que a lei paulistana não é desarrazoada. Pelo contrário, "é muito razoável, muito defensável, e é preciso admitir que o município assuma o risco da sua decisão".

"O que o MP sustenta é que seja respeitada, com base no princípio constitucional da autonomia federativa, a decisão do município de são Paulo de adotar uma legislação que está na linha da melhor legislação do mundo sobre o assunto."

Relator

Do início da leitura de seu voto, Fachin afirmou partir de duas premissas. A primeira, de que Estado, DF e municípios, embora igualmente integrantes da República Federativa do Brasil, conforme o comando normativo do art. 1 da CF, não devem ter suas competências sufragadas a um papel secundário na federação brasileira, "o que levaria a um caminho diverso do determinado pelo texto constitucional".

"Retira-se a possiblidade se sufragar um papel secundário a esses entes, de que espaço sejam preenchidos para que seja atingido interesse regional ou local. Reduzida a importância no exercício de suas competências, reduz-se também a efetividade do exercício de tais atribuição para o atendimento do bem comum."

A segunda, diz respeito ao fato de que à compreensão do federalismo brasileiro pelo STF não pode ser "emudecida por intepretações" que, à luz das Constituições anteriores, neguem de antemão ver o tema da atribuição da competência aos entes da federação à luz das novas questões “que são postas para desafiar a experiência constitucional”.

Feitas estas considerações, o relator ponderou que, interpretando os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, é possível superar o conteúdo meramente formal do princípio e reconhecer um aspecto material, numa presunção de autonomia em favor dos entes menores, para edição de leis que resguardem seus interesses.

"Assim, e apenas quando a lei federal claramente indicar que os efeitos de sua aplicação devam ser suportados pelos entes menores, nesta hipótese, é possível também afastar a presunção de que no âmbito regional local, determinado tema deve ser somente disciplinado pelo ente maior."

Segundo o ministro, se um Estado é plural, não é possível a centralização de competência em um único ente, em detrimento de interesses locais e regionais, que se destaquem do âmbito de abrangência das normas gerais, “sobretudo quando se está em busca da defesa e proteção da saúde, tal como nestas ADIns”.

"Muito embora seja competência concorrente em relação à produção e consumo, proteção de meio ambiente e da saúde, parece-me que seria simplesmente inconstitucional que um efeito de uma legislação federal editada pela União pudesse aniquilar totalmente a competência de estados e municípios."

Para Fachin, isso apenas seria possível se a legislação federal indicasse de forma clara que os Estados não pudessem legislar sobre elas. “Não me parece ser o acontece nos presentes casos.”

O ministro concluiu que tanto a atuação legislativa municipal, quanto as estaduais, se deram “de forma consentânea com a ordem jurídica nacional e nos seus estreitos limites”.

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