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Judiciário não é "guardião de segredos sombrios", diz Moro ao liberar depoimentos da Lava Jato

Para o juiz Federal, não se trata de "vazamento" de informação.

13/2/2015

"A bem da ampla defesa e do princípio da publicidade dos processos", o juiz Federal Sérgio Fernando Moro autorizou nesta quinta-feira, 12, a divulgação de 63 novos depoimentos do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, provenientes de acordo de delação premiada no âmbito da operação Lava Jato.

Ao justificar a liberação, Moro esclarece que não se trata de "vazamento" de informação - mas de levantar o sigilo sobre prova em processo sobre o qual não foi decretado segredo de justiça - e afirma: "Não se presta o Judiciário para ser o guardião de segredos sombrios".

Esclarece também que o acesso só não foi viabilizado antes porque os depoimentos não estavam com o juízo, sendo recebidos apenas em 21/1. "Foi necessário examiná-los um a um ­ e são dezenas ­ para verificar se a divulgação não prejudicaria investigações em andamento."

________________

DESPACHO/DECISÃO

1. Relativamente ao pedido de Jayme Alves Oliveira Filho (evento 911), deve a Defesa apresentar extratos das contas e de outros documentos que demonstrem o caráter alimentar da mesma. O requerimento deve ser distribuído por dependência como incidente de restituição.

2. Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef celebraram acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal, em procedimento conduzido pela Procuradoria Geral da República, sendo o acordo homologado pelo eminente Ministro Teori Zavascki. Em 21/01/2015, este Juízo foi informado de decisão de "cisão processual" relativamente ao conteúdo dos depoimentos, sendo enviado parte deles.

Os depoimentos dizem respeito a supostos crimes praticados através do escritório de lavagem de dinheiro comandado por Alberto Youssef e por meio do qual teriam sido lavados recursos de crimes antecedentes praticados principalmente contra a Petróleo Brasileiro S/A ­ Petrobrás.

Esses crimes, apurados no âmbito da Operação Lavajato, são de competência deste Juízo, como já fundamentado anteriormente, entre outras razões pela prevenção, pois o primeiro crime investigado no escritório de lavagem de Alberto Youssef consumou­se em Londrina/PR (art. 71 do CPP) e porque também envolvem fatos havidos no âmbito da jurisdição desta Vara, como desvios havidos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas, no Paraná, e a aquisição de bens imóveis com dinheiro sujo em Curitiba e Londrina.

Inviável, como pretendem alguns, espalhar os processos e provas por todo o território nacional, inviabilizando a compreensão do todo, pulverizando provas e prejudicando a investigação e a persecução.

Permanecem com o Egrégio Supremo Tribunal os depoimentos que envolvem autoridades com foro privilegiado e outros relacionados.

Na assim denominada Operação Lavajato, foram proposta sem uma primeira fase cerca de dez ações penais e posteriormente outras seis, estas últimas contra dirigentes e empregados de empreiteiras supostamente envolvidos na trama criminosa.

As Defesas dos dirigentes e empregados das empreiteiras reclamam, cotidianamente, a este Juízo acesso aos depoimentos prestados na colaboração premiada. Impetraram, inclusive, habeas corpus e até reclamações pleiteando o acesso.
As ações penais em trâmite não foram propostas com base nos depoimentos prestados na colaboração premiada, mas, sim, com base em um acervo de provas documentais e periciais e, quanto às revelações de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, com base nos depoimentos por eles prestado na ação penal pública 5026212­82.2014.404.7000.

Ainda assim, como os depoimentos prestados no âmbito da colaboração premiada dizem também respeito a questões contidas nas imputações nas ações penais em trâmite, é necessário franquear às Defesas o acesso a essas provas.

O acesso só não foi viabilizado antes porque os depoimentos não estavam com este Juízo e, por outro lado, recebidos os depoimentos somente em 21/01/2015, foi necessário examiná­los um a um ­ e são dezenas ­ para verificar se a divulgação não prejudicaria investigações em andamento.

Assim, a bem da ampla defesa e do princípio da publicidade dos processos, é o caso de levantar o sigilo sobre os depoimentos recebidos do Supremo Tribunal Federal no âmbito do acordo de colaboração premiada.

Esclareço que não estão sendo liberados aqueles que envolvem autoridades com foro privilegiado ­ que não são de competência deste Juízo e ainda estão sendo examinados pela Procuradoria Geral da República e pelo Supremo Tribunal Federal, aqueles cuja publicidade no momento possa prejudicar investigações em andamento e aqueles não relacionados diretamente com lavagem de dinheiro de recursos da Petrobras.

Promova, portanto, a Secretaria o traslado para estes autos:

­ dos depoimentos de n.os 21, 26, 30, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 45, 46, 47, 48, 49, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 61, 64, 67A (e não o 67, já que a numeração nos termos foi repetida por engano), 69, 70, 71, 72, 74, 76 e 80 de Paulo Roberto Costa;

­ dos depoimentos de n.os 04, 05, 06, 07, 08, 09, 11, 12, 15, 19, 23, 27, 34, 36, 38, 39, 41, 42, 43, 46, 47, 48, 50, 51, 52, 54, 55 e 56 de Alberto Youssef.

Por oportuno, em virtude de certas incompreensões, esclareça­se que não se trata aqui de "vazamento", mas de levantar o sigilo sobre prova em processo sobre o qual não foi decretado segredo de justiça.

É a Constituição Federal que determina a publicidade dos processos judiciais e que o segredo de justiça constitui exceção (artigo 5º, LX).

Como se não bastasse, também estabelece categoricamente a publicidade do julgamento e das decisões judiciais (art. 93, IX).
A mesma Constituição também estabelece que a Administração Pública rege­se pelo princípio da publicidade, entre outros (art. 37, caput).

Seguindo os mandamentos constitucionais, o trato da coisa pública, aqui incluído o processo de supostos crimes contra a Administração Pública, deve ser feito com transparência e publicidade.

Não se presta o Judiciário para ser o guardião de segredos sombrios. Não havendo prejuízo à investigação, o que demanda avaliação circunstancial e caso a caso, devem ser seguidos à risca os mandamentos constitucionais, o que é também reclamado, no presente caso, pela Defesa das pessoas já acusadas por crimes relacionados aos desvios da Petrobras. Necessário, ademais, atender o disposto na Súmula vinculante nº 14 do Supremo Tribunal Federal.

Não existe aqui, antes que se interprete o contrário, qualquer crítica ao procedimento adotado no Egrégio Supremo Tribunal Federal, uma vez que os depoimentos ali mantidos ainda estão sob exame da Procuradoria Geral da Pública e daquela Suprema Corte e não se pode afirmar que há iguais condições de levantar o sigilo sobre eles no presente momento, já que, em qualquer investigação complexa, há naturalmente fases diferenciadas de amadurecimento do processo. Faço a observação apenas para evitar mal entendidos, sequer cabendo a este Juízo qualquer consideração a respeito do procedimento adotado na Suprema Corte.

Oportuno também ressalvar que a palavra de criminosos colaboradores deve sempre ser vista com desconfiança e que a publicidade ora conferida não significa aval deste Juízo quanto à veracidade das declarações. Os depoimentos devem ser amparados em prova de corroboração, o que ocorreu parcialmente, sem que se possa ainda emitir juízo conclusivo, em relação às ações penais propostas pelo Ministério Público Federal contra os dirigentes e os empregados das empreiteiras, os supostos corruptores. Quanto aos demais fatos, se forem colhidas eventualmente provas de corroboração, o destino será provavelmente o mesmo, a depender aqui da investigação e persecução a cargo da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.

Feito o translado, ciência ao MPF, às Defesas e à autoridade policial do teor deste despacho.

Curitiba, 12 de fevereiro de 2015

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