Migalhas Quentes

Crime racial cometido pela internet deve ser processado no local do provedor do site

Conhecimento do grupo étnico ofendido é irrelevante para consumação do tipo penal e, por conseguinte, para fixar a competência.

3/11/2014

A 1ª turma do TRF da 3ª região negou provimento a recurso a respeito da competência para processar e julgar crime racial.

O MPF interpôs recurso em sentido estrito contra decisão do juízo da 2ª vara Federal de Dourados/MS que declarou sua incompetência para processar e julgar o crime previsto no artigo 20, parágrafo 2º, da lei 7.716/89.

Segundo a denúncia, o acusado publicou um artigo em sua coluna no site do de um jornal referindo-se à população indígena Guarani-Kaiowá de maneira pejorativa, utilizando-se de termos impróprios e ofensivos.

O juízo de 1º grau entendeu que nos crimes de ofensas publicadas na internet a competência territorial se firma pelo local em que se localiza o provedor do site onde foi publicado o texto calunioso. No caso em questão, uma vez que o site do jornal é hospedado em servidor localizado no município de Belo Horizonte/MG, este seria o local em que o crime teria se consumado, motivo pelo qual determinou a remessa dos autos àquela Subseção Judiciária.

O MPF, em seu recurso, alega que se deve aplicar a teoria do resultado, firmando-se a competência do local onde o crime foi consumado.

A 1ª turma, ao analisar o caso, observa que a prática que se apura, publicação de conteúdo preconceituoso contra toda uma etnia, constitui crime de mera conduta e, portanto, teria se consumado no momento em que publicada a matéria, sendo irrelevante que o grupo étnico ofendido tome conhecimento de seu conteúdo ou veiculação.

Não se pode confundir o crime do artigo 20 da Lei 7.716/80 com o crime de injúria racial, previsto no artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal, que se consuma quando a ofensa chega ao conhecimento da vítima.

“Ademais”, diz a Turma, “caso se admitisse a tese esposada pelo Ministério Público Federal, eventuais ofensas contra os índios Guarani-Kaiowá perpetradas em qualquer lugar do país, já teriam a competência previamente fixada tão-somente em virtude da região habitada pela etnia, o que é desarrazoado.”

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DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO

Edição nº 175/2014 - São Paulo, segunda-feira, 29 de setembro de 2014

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

PUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF

Subsecretaria da 1ª Turma

Acórdão 11923/2014

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0001358-60.2013.4.03.6002/MS

2013.60.02.001358-3/MS

RELATOR: Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA

RECORRENTE: Justica Publica

RECORRIDO(A): W.P.R.N.F.

ADVOGADO: MG088459 JOSE BERNARDO DE ASSIS JUNIOR e outro

No. ORIG.: 00013586020134036002 2 Vr DOURADOS/MS

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DO ARTIGO 20, § 2º DA LEI 7.716/1989. CONSUMAÇÃO NO MOMENTO EM QUE PUBLICADA A MATÉRIA. COMPETÊNCIA FIXADA EM RAZÃO DO LUGAR EM QUE A ETNIA OFENDIDA TOMOU CONHECIMENTO DO ARTIGO VEICULADO: DESCABIMENTO. RECURSO IMPROVIDO.

1. Recurso em sentido estrito interposto contra a decisão que declarou a incompetência do Juízo da 2ª Vara Federal de Dourados/MS para processar e julgar denúncia oferecida pelo MPF dando o réu como incurso no artigo 20, § 2º, da Lei 7.716/1989.

2. A prática que se apura, publicação de conteúdo preconceituoso contra toda uma etnia, constitui crime de mera conduta e, portanto, teria se consumado no momento em que publicada a matéria, sendo irrelevante que o grupo étnico ofendido tome conhecimento de seu conteúdo ou veiculação.

3. A interpretação pretendida pelo Ministério Público Federal somente teria sentido se a imputação fosse de injúria racial, previsto no artigo 140, § 3º do Código Penal, que se consuma quando o ofendido toma conhecimento da declaração ofensiva.

4. O conhecimento do grupo étnico ofendido acerca da matéria veiculada é irrelevante para a consumação do tipo penal e, por conseguinte, para a fixação da competência.

5. Caso se admitisse a tese esposada pelo Ministério Público Federal, eventuais ofensas contra os índios Guarani-Kaiowás perpetradas em qualquer lugar do país, já teriam a competência previamente fixada tão-somente em virtude da região habitada pela etnia, o que é desarrazoado.

6. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso em sentido estrito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 16 de setembro de 2014.

MARCIO MESQUITA

Juiz Federal Convocado

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