A execução, na esfera cível, da condenação penal só é possível se a sentença for definitiva. Assim, se o julgamento da apelação da defesa reconhece a ocorrência de prescrição retroativa do crime, deixando de ingressar no mérito, não há vinculação das esferas. Decisão unânime é da 4ª turma do STJ.
De acordo com os autos, uma menina de 13 anos foi atropelada por um carro cuja motorista não era a proprietária. A vítima do atropelamento não foi socorrida devidamente pela motorista e sofreu fratura exposta na tíbia direita, ficando com a musculatura comprometida e sofrendo redução de dois centímetros no comprimento do membro, além de redução na movimentação do pé.
O pai da garota ajuizou ação contra o plano de saúde, o proprietário do carro e a motorista, apresentando provas que entendeu pertinentes à comprovação da conduta ilícita da motorista, das lesões corporais e do nexo de causalidade entre ambos.
O plano de saúde foi excluído do processo por ilegitimidade ativa, tendo pleiteado o ressarcimento do valor despendido com o referido tratamento, cerca de 81,89% do total dos gastos. A motorista foi condenada administrativamente pelo departamento de trânsito local e na esfera criminal.
De acordo com o processo, a sentença "submeteu, assim, a ré ao regramento do art. 303, caput, da Lei 9.503/97, c/c o art. 65, I, do Código Penal, fixando a pena em seis meses de detenção e oito meses de suspensão para dirigir veículo automotor, com substituição, ao final, da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, consistente em prestação pecuniária".
Na apelação criminal, o TJ/MG acolheu a prefacial da pretensão punitiva, em sua forma retroativa com base nos fatos de que a motorista tinha menos de 21 anos na época dos fatos.
Condenação sem efeito
Resolvida a questão penal, o processo civil voltou a correr. O magistrado julgou improcedentes os pedidos formulados pela autora na inicial indenizatória, entendendo que "o evento danoso ocorreu por culpa exclusiva da vítima, não havendo nem sequer falar em concorrência de culpas." A garota estaria andando na pista de rolamento no momento do acidente e a motorista estaria dentro do limite de velocidade.
O autor apelou da decisão. Para TJ/MG, agora na esfera cível, a existência do crime e sua autoria estariam resolvidas pela ação penal. Por isso, não seria possível reabrir a discussão sobre esses pontos.
O ministro Raul Araújo, relator no STJ, entendeu que o reconhecimento da prescrição retroativa pelo TJ/MG tornara prejudicial o exame do mérito da condenação em primeira instância. Dessa forma, essa condenação, que não se tornou definitiva, não vincula a esfera cível.
"Com efeito, não houve reconhecimento definitivo no juízo criminal da autoria e da materialidade delitiva. Quanto a esses pontos, não houve trânsito em julgado da sentença penal condenatória", afirmou o relator.
Araújo esclareceu que a prescrição retroativa afeta a própria pretensão punitiva e não somente a executória. Assim, nenhum efeito da condenação, mesmo acessório, perdura.
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Processo relacionado: REsp 678.143
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