O juiz de Direito Francisco Antonio Alves De Oliveira, do 2º Juizado da Fazenda Pública do DF, julgou improcedente o pedido de um motorista que visava à anulação de ato de infração aplicado pelo Detran por condução de veículo sob efeito de álcool.
O autor alegou inexistir prova contundente a sustentar a verossimilhança da infração imposta, diante da ausência de perícia técnica, o que tornaria impossível, segundo ele, a aferição da quantidade de álcool no sangue e, consequentemente, a autuação e a incidência de multa.
O magistrado explicou que no caso do crime de embriaguez ao volante, o tipo penal prevê quantidade específica de concentração de álcool, exigindo-se prova técnica que indique a exata dosagem alcoólica no sangue. Na esfera administrativa, entretanto, o CTB contenta-se com a simples manifestação de sinais visíveis da embriaguez, tal como dispõe o artigo 277 da lei 9.503/97.
No caso sob análise, o julgador anota que as observações lançadas pelo agente de trânsito no auto de infração informam que o condutor confirmou que havia ingerido bebida alcoólica e que por essa razão não se submeteria ao bafômetro. O agente também atestou os indícios de que o motorista efetivamente estava alcoolizado: odor etílico e olhos avermelhados.
Na sentença, o magistrado explica ainda que a parte autora “não logrou demonstrar a alegada ilegalidade do ato administrativo impugnado, apesar de ter-se sido deferida oportunidade ampla para produção probatória". Alves De Oliveira ainda salientou não constar dos autos os fundamentos que levaram ao autor a negar-se à realização do exame do etilômetro, tendo argumentado, tão somente, que se utilizou de direito a ele conferido.
“À míngua de qualquer elemento de prova capaz de infirmar a presunção de legalidade de que goza o ato administrativo impugnado, forçoso é reconhecer a improcedência do pedido", afirmou o juiz. O motorista recorreu, mas a ação não foi conhecida, pois o autor não recolheu as custas necessárias.
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Processo: 2011.01.1.148638-0
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Circunscrição :1 – BRASILIA
Processo :2011.01.1.148638-0
Vara : 2302 - SEGUNDO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERALSENTENÇA
Dispensado o relatório (artigo 38, da Lei 9.099/95).
DECIDO
Inicialmente, cumpre destacar o teor do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil.
Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
Nos termos do dispositivo acima, caberia à parte autora demonstrar, mediante elementos de prova, o direito deduzido na inicial, inferindo, assim, a veracidade/legitimidade do conteúdo do ato administrativo impugnado.
O feito comporta julgamento antecipado, uma vez que as partes não requereram a dilação probatória (art.330, I, CPC).
Não existem questões preliminares a serem apreciadas, assim como não verifico a existência de nenhum vício que macule o andamento do feito. Presentes os pressupostos processuais e condições da ação. Passo a análise do mérito.
Discute-se nos autos a legitimidade e veracidade de auto de infração de trânsito por suposto amoldamento de conduta atribuída ao requerente na hipótese definida no artigo 165, do Código de Trânsito Brasileiro, qual seja, conduzir veículo sob efeito de substância alcoólica ou similar.
A parte autora sustenta que inexiste prova contundente a sustentar a verossimilhança da infração imposta. Extrai-se do relato inicial que funda-se o autor que a ausência de perícia técnica torna impossível a aferição da quantidade de álcool no sangue e, consequentemente, a autuação e a incidência de multa.
"Ab initio", faz-se necessário distinguir a hipótese prevista no artigo 165 do CTB, daquela prevista no artigo 306 do mesmo Diploma Legal. A primeira trata de infração administrativa, caso em que o condutor é surpreendido na condução regular, ou não, do veículo, mas encontra-se sob influência de álcool ou substâncias entorpecentes capazes de causar dependência química. O segundo caso diz respeito à condução de forma a expor a dano potencial a incolumidade de outrem, caso em que, além de caracterizar a infração administrativa, também constitui crime de embriaguez ao volante, fato penalmente coibido.
No caso do crime de embriaguez ao volante, o tipo penal prevê quantidade específica de concentração de álcool, exigindo-se prova técnica que indique a exata da dosagem alcoólica no sangue. Aqui a prova da ebriedade é essencial à configuração do tipo, tendo em vista a exigência inscrita no Código de Processo Penal de realização do exame de corpo de delito nos casos em que o crime deixa vestígio. Nesse contexto é que se mostra indispensável o exame pericial comprobatório do estado de embriaguez.
Na esfera administrativa, entretanto, o Código de Trânsito contenta-se com a manifestação de sinais visíveis da embriaguez. O estado alcoólico pode ser aferido por outros meios, tal como dispõe o artigo 277 da Lei 9.503/97. Confira-se:
Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.
§ 1º Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.
§ 2º A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.
§ 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
A Resolução n. 206/2006 do Conselho Nacional de Trânsito traz disciplina no mesmo sentido, prevendo que, em caso de recusa ao exame do etilômetro, deve a autoridade pública competente proceder aos demais meios para aferição de eventual ingestão de substância alcoólica ou entorpecente. Confira-se:
Art. 1º A confirmação de que o condutor se encontra dirigindo sob a influência de álcool ou de qualquer substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, se dará por, pelo menos, um dos seguintes procedimentos:
I - teste de alcoolemia com a concentração de álcool igual ou superior a seis decigramos de álcool por litro de sangue;
II - teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro) que resulte na concentração de álcool igual ou superior a 0,3mg por litro de ar expelido dos pulmões;
III - exame clínico com laudo conclusivo e firmado pelo médico examinador da Polícia Judiciária;
IV - exames realizados por laboratórios especializados, indicados pelo órgão ou entidade de trânsito competente ou pela Polícia Judiciária, em caso de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.
/BArt.
2º. No caso de recusa do condutor à realização dos testes, dos exames e da perícia, previstos no artigo 1º, a infração poderá ser caracterizada mediante a obtenção, pelo agente da autoridade de trânsito, de outras provas em direito admitidas acerca dos notórios sinais resultantes do consumo de álcool ou de qualquer substância entorpecente apresentados pelo condutor, conforme Anexo desta Resolução.
§ 1º. Os sinais de que trata o caput deste artigo, que levaram o agente da Autoridade de Trânsito à constatação do estado do condutor e à caracterização da infração prevista no artigo 165 da Lei nº 9.503/97, deverão ser por ele descritos na ocorrência ou em termo específico que contenham as informações mínimas indicadas no Anexo desta Resolução./b
§ 2º. O documento citado no parágrafo 1º deste artigo deverá ser preenchido e firmadopelo agente da Autoridade de Trânsito, que confirmará a recusa do condutor em se submeter aos exames previstos pelo artigo 277 da Lei nº 9.503/97.
Percebe-se que o ordenamento de trânsito cuidou, corretamente, de autorizar a constatação da ingestão alcoólica por outros meios que não o exame de sangue e do "bafômetro", como forma de vedar a impunidade administrativa daqueles que se recusassem à submeter-se aos testes.
No caso sob análise, as observações lançadas pelo agente de trânsito no auto de infração informam que o condutor confirmou que havia ingerido bebida alcoólica e que por essa razão não se submeteria ao bafômetro. Aquele também atestou os indícios de que efetivamente estava alcoolizado. Retratou o Relatório de Embriaguez sinais da ingestão de bebida alcoólica - odor etílico e olhos avermelhados. Além das descritas características consta expressamente do mencionado documento que a parte autora declarou ter feito a ingestão de álcool (fls. 145 e 146).
É de conhecimento notório que os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade, veracidade e legalidade que, por ser relativa, sucumbe na presença de provas em sentido contrário. Ocorre que, na espécie, a parte autora não logrou demonstrar a alegada ilegalidade do ato administrativo impugnado, apesar de ter-se sido deferida oportunidade ampla para produção probatória.
Em caso similar, no qual se discutiu a legalidade de ato administrativo, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios proferiu acórdão no mesmo sentido. Confira-se:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ANULATÓRIA. AUTO DE INFRAÇÃO E MULTA. CONDUÇÃO DE VEÍCULO SOB A INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL. AUTO DE CONSTATAÇÃO. CONSUMO DE BEBIDA ALCÓOLICA. DECLARAÇÃO DO PRÓPRIO DO CONDUTOR. NOTÓRIOS SINAIS DE EMBRIAGUEZ. I - O Auto de Constatação de Condução de Veículo Sob Influência de Álcool consigna que o próprio agravante declarou que ingeriu bebida alcoólica, motivo pelo qual recusou a se submeter ao teste de alcoolemia (bafômetro). Mesmo assim, o agente de trânsito apurou o estado de embriaguez a partir de sinais notórios apresentados pelo condutor do veículo. II - o ato administrativo goza de presunção de legalidade e legitimidade, a qual somente pode ser ilidida por intermédio de prova contundente em sentido contrário, inexistente na hipótese vertente. III - Negou-se provimento.
(20100020007161AGI, Relator JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, 6ª Turma Cível, julgado em 28/04/2010, DJ 06/05/2010 p. 110) JUIZADOS ESPECIAIS - FAZENDA PÚBLICA - APLICAÇÃO DA LEI 12.153/09 - RECURSO CONTRA DECISÕES ORDINATÓRIAS CAUTELARES E/OU ANTECIPATÓRIAS - INEXISTÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO - ADEQUAÇÃO PARA O RITO DA RECLAMAÇÃO - AÇÃO ANULATÓRIA DE PENALIDADE ADMINISTRATIVA (SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR) POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO (DIREÇÃO SOB EFEITO DO ÁLCOOL) - PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO QUE ATESTA ESTADO DE EMBRIAGUEZ ANTE A RECUSA DE REALIZAÇÃO DO TESTE DO "BAFÔMETRO" - NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA MANTIDA - RECLAMAÇÃO CONHECIDA E NÃO PROVIDA. 1. Enquanto não existir regulamentação do recurso previsto no artigo 4º da Lei 12.153/09 em sede dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, tal remédio deverá seguir o rito da Reclamação. 2. A despeito da licitude da recusa do condutor do veículo a realizar o teste de alcoolemia (bafômetro), é suficiente para comprovar a condução sob influência de álcool a averiguação realizada pela autoridade policial, em que apura se o condutor apresenta sintomas de embriaguez, como olhos vermelhos, sonolência, desordem nas vestes etc. 2. Em conformidade com o disposto no art. 273 do Código de Processo civil, para a concessão da tutela antecipada pretendida pelo Reclamante, há que se ter prova inequívoca capaz de convencer o magistrado da verossimilhança da alegação, além de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ao requerente, o que não ocorreu nos autos que se fundam somente no eventual tratamento não cortês que a autoridade policial deferiu ao autor. 3. O ato administrativo goza de presunção de legitimidade e de legalidade que somente pode ser afastada na fase inicial do processo com a demonstração inequívoca de sua ilegalidade, sem o que deve ser respeitado o regular transcurso da ação de conhecimento, quando então será possível discutir a qualidade do direito vindicado a partir de ampla dilação probatória. 4. Reclamação conhecida e não provida. (20100111742309DVJ, Relator GISELLE ROCHA RAPOSO, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DO DF, julgado em 19/10/2010, DJ 22/10/2010 p. 339)
ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. MULTA. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE. PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO.
1.No caso de recusa do condutor do veículo a submeter-se ao teste de alcoolemia ("bafômetro"), fazem prova do estado de embriaguez, a anotação no auto de infração sobre os sintomas ou impressões da autoridade policial, como fala prejudicada (enrolada) e olhos vermelhos, em conformidade com o art. 277 do CTB.
2.Mantém-se o indeferimento de pedido de antecipação de tutela para afastar a penalidade de suspensão do direito de dirigir, decorrente da direção de veículo sob influência de álcool, sem evidência de irregularidade no ato administrativo, que goza de presunção de legitimidade e veracidade, até prova em contrário.
3.Negou-se provimento ao agravo de instrumento.(20090020177677AGI, Relator SÉRGIO ROCHA, 2ª Turma Cível, julgado em 07/04/2010, DJ 28/04/2010 p. 59)ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAUTELAR INOMINADA. LIMINAR. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. ART. 165 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. DIRIGIR SOB A INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL. APLICAÇÃO DE PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. REALIZAÇÃO DE TESTE DE BAFÔMETRO OU DE EXAME DE SANGUE. DESNECESSIDADE. CARACTERIZAÇÃO PELO AGENTE DE TRÂNSITO MEDIANTE NOTÓRIOS SINAIS DE EMBRIAGUEZ. ATO ADMINISTRATIVO. PRESUNÇÃO LEGITIMIDADE. INEXISTÊNCIA DE PROVAS CAPAZ DE LEVANTAR QUALQUER SUSPEITA ACERCA DA HIGIDEZ DO ATO. RECURSO IMPROVIDO. 1. O recorrente impugna a veracidade do conteúdo da autuação ao afirmar que não estava embriagado no momento em que foi abordado pelos policiais, mas não apresenta qualquer prova capaz de levantar qualquer suspeita sobre a higidez do ato, que possa levar à sua invalidade. 2. Como se sabe, o ato administrativo goza da presunção de legitimidade, sendo ônus do administrado demonstrar que os fatos aduzidos pela Administração não correspondem à verdade. Tal presunção que só pode ser relativizada diante de situações em que o administrado tenha dificuldades ou mesmo esteja impossibilitado de fazer prova em contrário, o que há de ser constatado depois que a produção das provas de seu interesse sejam realizadas. 3.. Exsurge evidente a desnecessidade da realização de teste de bafômetro ou de exame de sangue para a caracterização da infração prevista no seu art. 165 do Código de Trânsito Brasileiro, sendo suficiente a presença de notórios sinais de embriaguez, atestada pelo agente de trânsito, nos termos do § 2º do Art. 277 do CTB. 4. Recurso conhecido e improvido. (20100020183294AGI, Relator ARLINDO MARES, 2ª Turma Cível, julgado em 15/12/2010, DJ 11/01/2011 p. 316)
Registra-se, ainda, que não constam dos autos os fundamentos que levaram ao autor a negar-se à realização do exame do etilômetro. Argumentou, tão somente, que se utilizou de direito a ele conferido.
Assim, à míngua de qualquer elemento de prova capaz de infirmar a presunção de legalidade de que goza o ato administrativo impugnado, forçoso é reconhecer a improcedência do pedido.
Diante do exposto, resolvendo o mérito na forma do artigo 269-I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial.
Sem custas ou honorários, na forma do artigo 55, caput, da Lei 9.099/95.
Não havendo outros requerimentos, após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de estilo.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Brasília - DF, terça-feira, 25/10/2011 às 10h59