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Associação de juízes paulistas e mato-grossenses rebate críticas do Estadão ao CNJ

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5/10/2005

 

Associação de juízes paulistas e mato-grossenses rebate críticas do Estadão ao CNJ

 

A Associação dos Juízes Federais do Estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul (Ajufesp) rebate editorial do jornal O Estado de S. Paulo, sob o título "Passo em Falso no CNJ", o qual critica o Conselho Nacional de Justiça e o Poder Judiciário. Para a Ajufesp, o jornal distorce informações, misturando posições ideológicas.

 

O editorial, publicado no dia 26 de setembro, afirma que, em três meses de funcionamento, o CNJ teria julgado apenas uma das 85 denúncias que recebeu. Para a entidade de classe dos juízes federais, contudo, há incorreções nesse raciocínio, que parte do desconhecimento da atividade judicial e do próprio controle externo.

 

__________

 

Confira a íntegra do editorial

 

Passo em falso no CNJ

 

Em três meses de funcionamento, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recebeu 85 denúncias de desvio de conduta contra juízes, mas julgou apenas uma delas.

 

E, mesmo assim, a primeira decisão do órgão especialmente criado para promover o controle externo do Poder Judiciário foi arquivar a denúncia, por 8 votos contra 6. O grave é que votaram a favor dessa decisão os representantes dos diferentes setores e instâncias da magistratura, enquanto os votos pela apuração das acusações e pela aplicação de uma punição administrativa foram dados pelos integrantes do CNJ escolhidos fora dos quadros da magistratura.

 

Essa demonstração explícita de corporativismo mostra como será difícil mudar a cultura profissional da magistratura, uma das condições fundamentais para a modernização daquele que é o mais anacrônico dos três Poderes. O mais ilustrativo, contudo, não é a contagem apertada desse julgamento nem a divisão interna do Conselho, mas, sim, a maneira como foram tratadas as demais 84 denúncias de desvio de conduta contra magistrados.

 

Ao recebê-las, o corregedor do CNJ, ministro Pádua Ribeiro, que é juiz de carreira, determinou o arquivamento das denúncias. Com isso, as 84 denúncias sequer foram submetidas à apreciação dos demais 14 integrantes do Conselho.

 

Aliás, a denúncia que chegou a ser apreciada pelo órgão também recebeu despacho de arquivamento e só foi julgada porque houve recurso apresentado ao plenário.

 

Esse processo diz respeito a uma denúncia de excessiva morosidade contra uma das Varas de Infância do Distrito Federal, num caso de adoção.

 

Quatro anos após o início da ação, ela ainda não havia sido julgada. Segundo Pádua Ribeiro, como essa denúncia trata de uma questão jurisdicional envolvendo a aplicação de leis e códigos, ela deveria ser julgada pelas vias processuais ordinárias. Por isso, propôs seu arquivamento. Ao endossar esse parecer, os demais integrantes do CNJ oriundos dos quadros da magistratura alegaram que não cabe a esse órgão substituir as instâncias próprias para a resolução de questões disciplinares, ou seja, as corregedorias dos tribunais.

 

Em termos concretos, o prevalecimento desse ponto de vista pode esvaziar uma das principais funções do Conselho, mantendo com isso o statu quo no âmbito da Justiça. Uma das razões que levaram à adoção do controle externo foi, justamente, a inépcia das velhas corregedorias judiciais. Por seu entranhado corporativismo, muitas delas, a pretexto de 'preservar a imagem da instituição', deixaram de aplicar punições severas no devido momento, o que acabou abrindo caminho para graves irregularidades no Poder Judiciário.

 

O caso mais conhecido é o da Justiça do Trabalho em São Paulo. Se a corregedoria do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) fosse eficiente e imune ao corporativismo, em seu papel fiscalizador e disciplinar, dificilmente a construção do Fórum Trabalhista Rui Barbosa teria se convertido no escândalo que levou uma CPI do Senado a investigar as atividades do responsável pelas obras, o juiz Nicolau dos Santos Neto, ex-presidente da Corte.

 

Para tentar evitar o precoce esvaziamento do CNJ, os integrantes do órgão escolhidos fora dos quadros da magistratura manifestaram-se contra o arquivamento da primeira denúncia por desvio de conduta formulada contra um juiz, mas acabaram sendo derrotados. Embora não se possa prever quais serão os desdobramentos desse julgamento, fica evidente que, se os representantes da magistratura no Conselho continuarem agindo com critérios exclusivamente corporativos, em matéria de questão disciplinar, estarão inviabilizando o controle externo.

 

Nunca é demais lembrar que esse controle foi aprovado pelo Congresso, cujos membros são escolhidos por voto direto do eleitorado. Ao investir contra essa importante experiência de modernização da Justiça, os juízes estão desprezando os interesses de quem os sustenta. A conseqüência dessa resistência pode ser a aprovação, no futuro, de reformas judiciais muito mais drásticas do que a aprovada em 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45.

 

Segue a íntegra da nota da Associação:

 

"Ajufesp rebate editorial do Jornal O Estado de S. Paulo

 

30/9 - A Ajufesp rebateu o editorial do jornal 'O Estado de São Paulo', a respeito do Conselho Nacional de Justiça e do Poder Judiciário. O artigo fez severas críticas ao CNJ, distorcendo informações e misturando posições ideológicas.

 

O editorial publicado no Jornal 'O Estado de S. Paulo', com o título 'Passo em Falso no CNJ', edição do dia 26 de setembro de 2005, é um caso típico de distorção da informação, quando misturada com posições ideológicas.

 

O texto informa que 'em três meses de funcionamento, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recebeu 85 denúncias de desvio de conduta contra juízes, mas julgou apenas uma delas. E, mesmo assim, a primeira decisão do órgão especialmente criado para promover o controle externo do Poder Judiciário foi arquivar a denúncia, por 8 votos contra 6."

 

E logo após o autor dá sua opinião sobre o fato, segundo a qual isso seria uma manifestação de corporativismo.

 

Mais à frente, insiste que 84 denúncias sequer teriam sido conhecidas pelo Conselho, porque arquivadas de início.

 

E o artigo segue na crítica às decisões do CNJ, apontando que sua conduta pode, no seu modo de ver, inviabilizar o controle externo: "A conseqüência dessa resistência pode ser a aprovação, no futuro, de reformas judiciais muito mais drásticas do que a aprovada em 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45".

 

Pois bem, a AJUFESP, entidade representativa dos magistrados federais nos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, deseja apontar que há incorreções nesse raciocínio, que parte de desconhecimento tanto da atividade judicial, como sobre o próprio controle externo.

 

O ministro corregedor do CNJ, Min. Pádua Ribeiro, tem a atribuição, segundo as normas internas do CNJ (Regimento Interno) de fazer triagem, para evitar processos inúteis e tem desempenhado tal função de forma corajosa, não subserviente a pressões de grupos de classe, econômicos, políticos, ou da mídia, que possam ter seus interesses contrariados por decisões judiciais. É claro que tal independência é dolorida para tais interesses.

 

Com tal postura, o Ministro Pádua Ribeiro tem preservado o espírito que ensejou a criação do CNJ pela Emenda Constitucional nº 45, evitando que haja, aí sim, desvio ou inutilização do Conselho com a apreciação de petições anônimas, caducas, reclamações por demora em casos em que já havia decisão definitiva (a demora se deve a fatores outros que não a conduta do magistrado) e reclamações contra o mérito (isto é, o conteúdo) de decisões judiciais, o que, neste último caso, seria verdadeira interferência na independência do Poder Judiciário.

 

Isso não é corporativismo, como injustamente prega o editorial; é bom-senso, empregado para evitar que o Conselho pare de funcionar, abarrotado por representações subjetivas, que expressam apenas sentimentos pessoais de desagrado com o conteúdo de decisões jurisdicionais, sem apontar fatos concretos a ser investigados.

 

Além do mais, já que se pretende apresentar à população uma avaliação da atuação do Conselho, pelo menos não deveriam ser omitidos, pelo editorial, dados importantes.

 

O primeiro desses fatos: embora o Conselho tenha maioria de membros magistrados, eles não formam um bloco compacto (a não ser por conhecerem a realidade desde dentro, o que é positivo): são provenientes de origens tão diversas, que isso lhes permite uma visão isenta e não corporativa em relação aos juízes eventualmente investigados. O controle, para estes últimos, é realmente "externo".

 

O outro fato omitido foi a estatística do CNJ, cuja Corregedoria tem trabalhado, e muito: entre junho de setembro de 2005, produziu 66 despachos, 60 decisões, 87 pareceres e 170 ofícios.

É preciso ressaltar que, nos debates que precederam a criação do controle externo do Judiciário, ficou claro que ele deveria ser utilizado para melhorar a administração do judiciário e fiscalizar a conduta pessoal dos juízes, mas tal atribuição nada tem a ver com a com a revisão indireta de suas decisões.

 

Ao abrir tal possibilidade, o CNJ passaria a ser mais uma instância judicial, estaria interferindo na independência de julgamento dos magistrados e o restante do Poder Judiciário se tornaria inútil.

 

Ele também não pode transformar-se em órgão de "caça às bruxas" ou de natureza intimidatória, para servir a interesses de natureza pessoal. Lembre-se que toda decisão judicial desagrada pelo menos uma das partes (quando não desagrada ambas, porque nenhuma das duas tenha inteira razão perante a lei). Assim, o juiz é um personagem sempre exposto ao espírito de revanchismo. Se a Corregedoria não fosse – como tem sido – muito criteriosa, não haveria mais isenção, nem imparcialidade, nem possibilidade de julgamento sério.

 

A verdadeira função do Conselho é cobrir as áreas que não estão sendo atendidas satisfatoriamente pelas corregedorias e não se superpor às funções delas. O CNJ também tem a atribuição de fazer a programação estratégica do judiciário e não pode ocupar todo o seu tempo com questiúnculas.

 

O caso do juiz Nicolau dos Santos Neto representa uma comparação indevida, porque ele estava em função administrativa (licitação) e não atuando como juiz. Se escândalo de tais dimensões ocorresse hoje, o CNJ naturalmente o apuraria.

 

Além disso, equivoca-se o editorialista, mostrando bastante desconhecimento sobre o assunto que aborda - quando trata do tema "Corregedoria", que não tinha competência para investigar o juiz Nicolau, pois ele era membro do Tribunal Regional do Trabalho, portanto magistrado de segundo grau. Às Corregedorias estão submetidos apenas os juízes de primeira instância, que atuam nas varas.

 

Por outro lado, é genérica e injusta a afirmação de que o Poder Judiciário é o "mais anacrônico" dos poderes. Quem apurou isso? Com base em que comparação? O editorialista já compareceu a todas as repartições do executivo ou do legislativo federal, estadual ou municipal para fazer a verificação ou tem algum levantamento estatístico em mãos? Tem idéia de como a população é tratada perante outros setores do serviço público? Já viu em que condições funcionam os hospitais do Estado? Já viu as filas da Previdência? Lê jornais? Acompanhou a sucessão de escândalos no Legislativo? Suas opiniões apressadas parecem indicar falta de contato com a realidade.

 

Enfim, se adotadas as condutas consideradas corretas pelo editorial em questão, o CNJ seria sobrecarregado com casos inúteis (a não ser do ponto de vista de interesses pessoais) e suas funções seriam desviadas (planejamento; casos estrepitosos) para a função de controle político das decisões judiciais. Na realidade, esse parece ser o desejo do editorialista, na medida em que ameaça com "reformas muito mais drásticas".

 

São Paulo, 30 de setembro de 2005.

 

Erik Frederico Gramstrup

Presidente da AJUFESP

 

Omar Chamon

Diretor"

 

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