Migalhas Quentes

Suspensa decisão de turma recursal que considerou capitalização de juros abusiva

Processo é suspenso até o julgamento final da reclamação pela 2ª seção.

27/11/2012

A ministra Isabel Gallotti admitiu reclamação apresentada por Aymoré Crédito Financiamento e Investimento S/A contra decisão de turma recursal que, em ação revisional de contrato de financiamento, ratificou a sentença para determinar a devolução de valores pagos por um consumidor de forma supostamente indevida.

Para a magistrada, a decisão traz aparente divergência com o entendimento consolidado do STJ. Por isso, determinou a suspensão do processo até o julgamento final da reclamação pela 2ª seção.

Segundo a empresa, a 1ª turma Recursal Mista de Campina Grande/PB validou a decisão de primeiro grau e determinou a devolução, em dobro, dos valores pagos por um consumidor, por considerar abusiva a cobrança de juros compostos, sem previsão contratual expressa. A Aymoré sustenta que, de acordo com os artigos 591 e 406 do CC, os juros não devem ser limitados se estiverem convencionados.

A empresa alega ainda que, em razão do artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/01, passou a ser admitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Assim, afirma, não se pode proibir a capitalização no contrato em discussão, com base na alegação de falta de pactuação expressa, pois o contrato discrimina as taxas mensal e anual de juros, de modo que, “pela mera verificação destas, resta consubstanciada a previsão de capitalização”.

A ministra Isabel Gallotti assinalou que a possibilidade do ajuizamento de reclamação com o objetivo de adequar decisões das turmas recursais dos juizados especiais estaduais às súmulas ou à jurisprudência dominante do STJ foi admitida pela Corte Especial.

A relatora observou que, em relação à capitalização de juros, à primeira vista, está caracterizada a divergência entre a decisão reclamada e a jurisprudência do STJ sobre o tema, o que autoriza o processamento da reclamação.

___________

RECLAMAÇÃO Nº 10.209 - PB (2012/0210572-0)

RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI

RECLAMANTE : AYMORÉ CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A

ADVOGADO : ANTÔNIO BRÁZ DA SILVA E OUTRO(S)

RECLAMADO : PRIMEIRA TURMA RECURSAL MISTA DE CAMPINA GRANDE - PB

INTERES. : R.S.S.

ADVOGADO : LUCÉLIA DIAS MEDEIROS DE AZEVEDO

DECISÃO

Trata-se de reclamação proposta por Aymoré Crédito Financiamento e Investimento S/a em face de acórdão proferido pela Primeira Turma Recursal Mista de Campina Grande - PB que ratificou a sentença que, em ação revisional de contrato de financiamento, determinou a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente pelo ora interessado, reconhecida a abusividade da cobrança de juros compostos, sem previsão contratual expressa.

Afirma o reclamante que o acórdão reclamado teria violado o art. 535, II, do CPC quando deixou analisar as questões propostas sob o enfoque da Lei 4.595/64.

Aponta, ainda, afronta aos arts. 3º e 35 da Lei 9.099/95 e 145 do CPC, por ter o magistrado de primeiro grau determinado a apresentação de planilha de cálculo pelo ora interessado, descartando o auxílio de perito.

Aduz que a sentença condenatória proferida no caso em apreço seria ilíquida, ferindo o disposto no art. 38 da Lei 9.099/95.

Defende que pelos arts. 591 c/c 406 do CC, não devem ser limitados os juros se estes estiverem convencionados.

Ao final, sustenta que, de acordo com o art. 5º da MP 2.170-36/2001, passou a ser admitida a capitalização de juros nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional com periodicidade inferior a um ano, não se podendo "cogitar vedação da capitalização no contrato em tela com fulcro em alegação de ausência de pactuação expressa, uma vez que o contrato discrimina expressamente a taxa mensal e a anual de juros, do que, pela mera verificação destas, resta consubstanciada a previsão de capitalização" (e-STJ FL. 12).

Assim delimitada a controvérsia, passo a decidir.

Cumpre, inicialmente, ressaltar que a Corte Especial, apreciando questão de ordem levantada na Rcl 3.752/GO, em razão do decidido nos EDcl no RE 571.572/BA (STF, Rel. Ministra Ellen Gracie), admitiu a possibilidade do ajuizamento de reclamação perante o STJ, objetivando, assim, adequar as decisões proferidas pelas Turmas Recursais dos Juizados Estaduais à súmula ou jurisprudência dominante nesta Corte.

A mencionada espécie de reclamação foi disciplinada pela Resolução 12/2009 - STJ. Ela não se confunde com uma terceira instância para julgamento da causa, e tem âmbito de abrangência necessariamente mais limitado do que o do recurso especial, incabível nos processos oriundos dos Juizados Especiais. Trata-se de instrumento destinado, em caráter excepcionalíssimo, a evitar a consolidação de interpretação do direito substantivo federal ordinário divergente da jurisprudência pacificada pelo STJ.

A 2ª Seção, no julgamento das Reclamações 3.812/ES e 6.721/MT, interpretando a citada resolução, decidiu que a jurisprudência do STJ a ser considerada para efeito do cabimento da reclamação é apenas a relativa a direito material, consolidada em súmulas ou teses adotadas no julgamento de recursos repetitivos (CPC, art. 543-C). Não se admitirá, desse modo, a propositura de reclamações somente com base em precedentes tomados no julgamento de recursos especiais. Questões processuais resolvidas pelos Juizados não são passíveis de reclamação, dado que o processo, nos juizados especiais, orienta-se pelos princípios da Lei 9.099/95. Fora desses critérios foi ressalvada somente a possibilidade de revisão de decisões aberrantes.

No caso em apreço, observo que, a princípio, ficou caracterizada, ao menos em relação a uma das questões apresentadas, a divergência entre o acórdão reclamado e o paradigma mencionado, mormente no que tange à capitalização de juros.

Em face do exposto, admito a reclamação, nos termos do art. 2º, I, da Resolução n. 12/2009 - STJ, determinando a suspensão do processo a que esta se refere, até o julgamento final da presente.

Oficie-se à Primeira Turma Recursal Mista de Campina Grande - PB, comunicando o processamento da presente reclamação e solicitando informações, nos termos do art. 2º, II, da citada Resolução.

Após, publique-se, na forma do inciso III do mesmo dispositivo, para as partes, caso julguem necessário, pronunciarem-se.

Brasília (DF), 19 de outubro de 2012.

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI

Relatora

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