Migalhas Quentes

Amil não pode aplicar reajuste por sinistralidade em contratos coletivos

Operadora de planos de saúde já interpôs recurso de apelação.

17/9/2012

O juiz de Direito Anderson Cortez Mendez, da 4ª vara Cível de SP, anulou cláusula contratual da Amil Assistência Médica Internacional que estipulava reajuste por sinistralidade em contratos coletivos por adesão celebrados pela operadora de planos de saúde com micro e pequenas empresas.

Tal cláusula permitia a alteração unilateral dos valores pagos para prestação dos serviços médicos sempre que a soma dos gastos do grupo ultrapasse o limite de 70% do total dos valores pagos pelo conjunto de participantes.

Além da declaração de nulidade, o juiz Anderson Cortez Mendez determinou que a Amil se abstenha de inserir essa cláusula nos futuros contratos celebrados, sob pena de incidência de multa no valor de R$ 5 mil por descumprimento; impôs à empresa a obrigação de fazer a revisão dos contratos com incidência somente dos índices da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar; e condenou a companhia a restituir os valores cobrados dos consumidores por contra do reajuste por sinistralidade, corrigidos desde a data do desembolso.

A Amil já interpôs recurso de apelação.

Veja a íntegra da decisão.

___________

Vistos. Cuida-se de ação civil pública proposta por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL S.A., alegando, em síntese, que os contratos coletivos por adesão estipulados pela ré prevêem reajuste da contraprestação devida, de forma unilateral, em decorrência do aumento da sinistralidade. Entretanto, quando aderentes dos pactos micro e pequenas empresas, a cláusula mostrar-se-ia abusiva, por implicar na exigência de vantagem manifestamente excessiva. Em conseqüência, pediu, nos contratos coletivos por adesão celebrados pela requerida com micro e pequenas empresas, a declaração de nulidade das cláusulas que estabelecem reajuste por sinistralidade; a imposição da cessação de inserção das cláusulas em tela nos futuros contratos, sob pena de imposição de multa no valor de R$5.000,00 por consumidor, e da revisão da contraprestação que devida, com a incidência somente dos índices da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS; assim como a condenação à devolução dos valores indevidamente cobrados, com correção monetária e juros, admitido seu abatimento com as contraprestações vincendas; e à publicação da sentença proferida. Recebida a petição inicial (fls. 02/34), que atribuiu à causa o valor de R$500.000,00, veio acompanhada de documentos, almejando a comprovação dos fatos em que a parte autora funda sua pretensão (fls. 35/700). O pedido de tutela de urgência foi indeferido (fls. 711/712). Interposto agravo de instrumento, foi-lhe deferido efeito ativo (fls. 724/725). Devidamente citado (fls. 730), a ré ofertou contestação (fls. 748/774), com documentos (fls. 775/816), sustentando, em suma, que o contrato tem natureza de coletivo empresarial, prevalecendo suas disposições, sem restrições impostas pelas normas expedidas da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS. A relação das partes é empresarial, não de consumo, afastada a hipossuficiência dos aderentes. Os reajustes por variação dos índices de sinistralidade encontram-se previstos nos contratos, revestindo-se de licitude e tornando-se imperativos para manutenção de seu equilíbrio econômico. A sentença proferida não teria abrangência nacional e eventual repetição deveria observar o prazo prescricional de três anos, aplicando-se o artigo 206, incisos IV e V, do Código Civil. A supressão do reajuste por sinistralidade, por fim, exigiria a imposição de pagamento aos aderentes de contraprestação consentânea com os planos individuais. Por conseguinte, requereu a improcedência da demanda. Houve réplica (fls. 818/829), manifestando as partes desinteresse na dilação probatória (fls. 831/832). É o relatório. FUNDAMENTO E DECIDO. I. DA IMPOSIÇÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO Conheço diretamente da demanda, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. Como ensina Cândido Rangel Dinamarco: “A razão pela qual se permite a antecipação do julgamento do mérito é invariavelmente a desnecessidade de produzir provas. Os dois incisos do art. 330 desmembram essa causa única em várias hipóteses, mediante uma redação cuja leitura deve ser feita com a consciência de que só será lícito privar as partes de provar quando as provas não forem necessárias ao julgamento” (Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2a ed., Malheiros, p.555). Conforme já decidiu, na mesma linha, o Excelso Supremo Tribunal Federal: “A necessidade de produção de prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do Magistrado” (RE 101171, Relator Min. FRANCISCO REZEK, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/10/1984, DJ 07-12-1984 p. 20990). É o caso dos autos, vez que desnecessária dilação probatória, porquanto as alegações controvertidas encontram-se elucidadas pela prova documental, não tendo o condão a prova oral ou pericial de trazer quaisquer esclarecimentos relevantes para seu deslinde. No mais, versa a demanda matéria de direito, tratando-se da interpretação do contrato, tendo em vista os ditames constitucionais e legais. Destarte, perfeitamente cabível que se julgue antecipadamente o mérito, sem olvidar que, nos termos do artigo 125, inciso II, do Código de Processo Civil, compete ao magistrado velar pela rápida solução do litígio, privilegiando a efetividade do processo, quando prescindível a instrução processual (cf. José Roberto dos Santos Bedaque, Efetividade do Processo e Técnica Processual, 2a ed., Malheiros, p. 32/34), e atendendo a garantia constitucional de razoável duração do processo (artigo 5o, inciso LXXVIII, da Constituição Federal). II. DA ABRANGÊNCIA TERRITORIAL DA SENTENÇA Não prospera a restrição dos efeitos do decisum aos “limites da competência territorial do órgão prolator”. Anote-se, nesse ponto, que não se confundem competência territorial com eficácia subjetiva da coisa julgada material. Ao passo que a competência territorial trata de regras da distribuição das demandas entre os diversos órgãos jurisdicionais, segundo critérios territoriais, sem sequer caráter impositivo[1], a eficácia subjetiva da coisa julgada material traduz-se na gama de sujeitos abarcados pela imutabilidade dos efeitos da decisão imposta na solução da lide. É evidente como corolário lógico da admissão da tutela coletiva pelo ordenamento jurídico, admitindo-se a legitimação extraordinária para a defesa de interesses de terceiros, sua extensão a todos os titulares dos direitos violados. Definitivamente, destoa do ideal de monopólio da jurisdição pelo Estado, com sua atribuição ao Poder Judiciário, a limitação da tutela jurisdicional a parcela dos sujeitos cujos direitos restaram violados, notadamente tomando em conta critério dissociado do conceito de jurisdição, o qual não se confunde com a competência de cada órgão jurisdicional. Com efeito, o artigo 16 da Lei no 7.347/85, com a redação determinada pela Lei no 9.494/97, merece, pois, interpretação consentânea com o princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional inserto no artigo 5o, inciso XXXV, da Constituição Federal (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). Empregar interpretação restritiva aos limites da coisa julgada, quando se trata da aplicação do dispositivo legal, implica em se admitir a mantença de lesão aos direitos coletivos, em sentido amplo, protegidos pela ordem jurídica em detrimento da soberania estatal, o que não pode ser admitido. A propósito, a lição de Hugo Nigro Mazzilli: “Enfim, não é a imutabilidade erga omnes da coisa julgada que será nacional, regional ou local. A imutabilidade da coisa julgada, quando obtida em ação civil pública ou coletiva, sempre alcançará todo território nacional enquanto decisão de soberania do Estado; o que poderá ter maior ou menor extensão é o dano, que, este sim, poderá ser nacional, regional ou local” (A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 19a ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 499). Finalmente, tratando-se de relação de consumo o objeto do processo, persiste a vigência do artigo 103, inciso III, da Lei no 8.078/90, estipulando que a coisa julgada, nas demandas visando à defesa de direitos individuais homogêneos, tem eficácia “erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores”. Nessa direção, trilha julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “Processo civil e direito do consumidor. Ação civil pública. Correção monetária dos expurgos inflacionários nas cardenetas de poupança. Ação proposta por entidade com abrangência nacional, discutindo direitos individuais homogênios. Eficácia da sentença. Ausência de limitação. Distinção entre os conceitos de eficácia da sentença e de coisa julgada. Recurso especial provido. A Lei da Ação Civil Pública, originariamente, foi criada para regular a defesa em juízo de direitos difusos e coletivos. A figura dos direitos individuais homogênios surgiu a partir do Código de Defesa do Consumidor, como uma terceira categoria equiparada aos primeiros, porém ontologicamente diversa. A distinção, defendida inicialmente por Liebman, entre os conceitos de eficácia e de autoridade da sentença, torna inóqua a limitação territorial dos efeitos da coisa julgada estabelecida pelo art. 16 da LAP. A coisa julgada é meramente a imutabilidade dos efeitos da sentença. Mesmo limitada aquela, os efeitos da sentença produzem-se erga omnes, para além dos limites da competência territorial do órgão julgador. O procedimento regulado pela Ação Civil Pública pode ser utilizado para a defesa dos direitos do consumidor em juízo, porém somente no que não contrariar as regras do CDC, que contem, em seu art. 103, uma disciplina exaustiva para regular a produção de efeitos pela sentença que decide uma relação de consumo. Assim, não é possível a aplicação do art. 16 da LAP para essas hipóteses. Recurso especial conhecido e provido” (REsp 411.529/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/06/2008, DJe 05/08/2008) III. DO MÉRITO A demanda é parcialmente procedente. Em que pese o contrato ter sido celebrado livremente pelas partes, o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda) comporta, no moderno direito obrigacional, atenuação pela incidência de normas de ordem pública e, em conseqüência, de natureza cogente, com a finalidade precípua de adequá-lo à sua função social. Nesse diapasão, a revisão dos contratos não pode mais ser procedida somente com base na teoria da imprevisão ou da onerosidade excessiva, admitindo a autonomia da vontade, notadamente nas relações jurídicas envolvendo partes sem o mesmo poder de barganha, relativização frente à legislação protetiva do contratante mais fraco. Destarte, segundo os preceitos de caráter constitucional e infraconstitucional reguladores dos contratos, inafastável a busca de seu equilíbrio (cf. STJ, AgRg no REsp 921.104/RS, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 22.05.2007, DJ 04.06.2007 p. 375). De outro lado, a melhor interpretação ao artigo 2o, caput, do Código de Defesa do Consumidor trata-se da aplicação do diploma legal em favor das pessoas jurídicas quando destinatárias finais do produto ou serviço, contanto verificada, in casu, sua vulnerabilidade diante do fornecedor. Nesse sentido, aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL . AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSUMIDOR. RELAÇÃO DE CONSUMO. CARACTERIZAÇÃO. DESTINAÇÃO FINAL FÁTICA E ECONÔMICA DO PRODUTO OU SERVIÇO. ATIVIDADE EMPRESARIAL. MITIGAÇÃO DA REGRA. VULNERABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA. PRESUNÇÃO RELATIVA. O consumidor intermediário, ou seja, aquele que adquiriu o produto ou o serviço para utilizá-lo em sua atividade empresarial, poderá ser beneficiado com a aplicação do CDC quando demonstrada sua vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica frente à outra parte. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg no Ag 1316667/RO, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 11/03/2011). Tratando-se de plano coletivo por adesão, o qual se diferencia do plano coletivo empresarial, os contratos sub judice reveste-se, evidentemente, da natureza de adesão, impossibilitando a discussão de suas cláusulas, donde decorre a vulnerabilidade da aderente, ensejando, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso concreto. A propósito, a Súmula no 469 do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde” (Súmula 469, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 06/12/2010). Com efeito, tomando em conta o instrumento do contrato ofertado pela empresa-ré à adesão no mercado de consumo, há previsão do reajuste por faixa etária, em conformidade à sua cláusula 21.1 e 22.1 (fls. 627 e 629/630), pela variação dos custos médicos, segundo sua cláusula 21.1.4 (fls. 628;629), bem como a estipulação de reajuste por sinistralidade, em sua cláusula 21.1.5 (fls. 629), o que se constitui no objeto do processo. A despeito da adequada discriminação dos seus índices no que toca ao primeiro (fls. 630), os últimos ficam ao alvedrio da administradora do plano de saúde (fls. 629), não podendo a parte aderente conhecer prévia e suficientemente o alcance da cláusula contratual. Frise-se, no entanto, que cabe ao fornecedor dar ciência prévia e efetiva ao consumidor do conteúdo da avença, bem como redigir o instrumento contratual de forma clara, sob pena de não obrigá-lo, em conformidade ao disposto pelo artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor. A propósito, a lição de Nelson Nery Junior: “O fornecedor deverá ter a cautela de oferecer oportunidade ao consumidor para que, antes de concluir o contrato de consumo, tome conhecimento do conteúdo do contrato, com todas as implicações conseqüenciais daquela contratação no que respeita aos deveres e direitos de ambos os contratantes, bem como das sanções por eventual inadimplemento de alguma prestação a ser assumida no contrato. Não sendo dada essa oportunidade ao consumidor, as prestação por ele assumidas no contrato, sejam prestações que envolvam obrigação de dar, fazer ou não fazer, não o obrigarão” (in Ada Pellegrini Grinover et alii, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 563). De mais a mais, o reajuste por sinistralidade da contraprestação pela administradora do plano de saúde no negócio jurídico estipulado tem natureza puramente potestativa, revestindo-se de nulidade, ex vi do artigo 122 do Código Civil, não podendo prevalecer. De fato, fica o reajuste, exclusivamente, ao arbítrio da ré, o que não há que ser admitido. Em conformidade a aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. PROCESSO CIVIL. CLÁUSULA PURAMENTE POTESTATIVA. ARTIGO 115 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. PROIBIÇÃO PELO SISTEMA JURÍDICO. ‘São lícitas, em geral, todas as condições, que a lei não vedar expressamente. Entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o ato, ou o sujeitarem ao arbítrio de uma das partes’ (Artigo 115 do Código Civil de 1916). As regras de locação não admitem cláusula que conceda a uma das partes benefício ou vantagem que a torne mais poderosa, ou ainda que a submeta ao arbítrio da outra” (AgRg no AgRg no Ag 652.503/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2007, DJ 08/10/2007 p. 377). Definitivamente, a interpretação das cláusulas do contrato em tela autoriza, irremediavelmente, a conclusão no sentido da impossibilidade do reajuste por sinistralidade, sobretudo quando se atém tratar-se a contratação de plano de saúde relação de consumo, bem como o vínculo contrato de adesão. As disposições contratuais, conseqüentemente, devem ser interpretadas de modo mais favorável aos contratantes, em conformidade ao artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor e ao artigo 423 do Código Civil, porquanto consumidores e aderentes a contrato de adesão. A propósito, voto proferido, em caso análogo, pelo eminente Juiz de Direito, Danilo Mansano Barioni: “O que afronta o bom senso e, sobretudo, avilta o disposto no art. 54, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor, é a manifesta inviabilidade de um consumidor de formação mediana, o que constitui certamente a maior parte da carteira de clientes da requerida, ter de se preocupar em descobrir o que é unidade de serviço (US) – tarefa das mais fáceis que lhe é imposta - e depois, para chegar ao que mais lhe afetará ao longo do contrato de execução continuada, desvendar complexa equação matemática, repleta de variáveis cuja aferição nem sequer imagina como descobrir para completar a equação. Ainda que consiga, terá de fazer contas de multiplicação com até quatro casas decimais, dentro de parênteses, para depois somar os resultados. Com todo o respeito aos que entendem contrariamente, a meu ver nem como piada se pode imaginar que tais estipulações atendem à determinação legal de clareza nas estipulações contidas nos contratos de adesão, com facilitação de sua compreensão pelo consumidor. Muito ao contrário, a equação matemática proposta é uma ode à prolixidade, e por nada pode ser justificada. O país tem moeda corrente, modo comum e mais adequado à fixação de preços de produtos e serviços, pois poderá ser facilmente compreendido por quem os adquire. Se a unidade de serviço (US) deverá ser convertida em dinheiro, e será, e se é definida inicialmente pela requerida, nos termos da cláusula 16, porque não defini-la em reais? Definida em reais, os reajustes poderiam ser feitos pelo índice oficial que mais se adequasse à variação dos preços dos serviços e produtos custeados pela seguradora, pois tais índices refletem também tais variações, sendo atualmente divulgado pela a ANS. O que importa assentar é que a requerida teria inúmeras formas menos complexas e obscuras para garantir um adequado reajuste aos prêmios pagos pelos segurados que não a esdrúxula equação, incompreensível à maioria das pessoas com escolaridade mediana. Com tal equação a requerida pretendeu qualquer coisa, menos estampar os critérios de reajuste dos prêmios pagos pelos segurados de forma clara e que lhes facilitasse a compreensão. Se é assim, e assim efetivamente é, as indigitadas cláusulas 16 e 17 do contrato de adesão firmado com a recorrida, e todas as outras de idêntico teor insertas nos demais contratos padronizados elaborados pela requerida para a venda de seus produtos, não podem prevalecer, seja porque incompreensíveis ao aderente, seja porque não justificadas por qualquer argumento plausível. Ressalto que tal invalidade abarca não somente os contratos celebrados após a vigência do Código de Defesa do Consumidor, mas todos os contratos celebrados, pois sobre o que não se compreende não pode haver exteriorização válida de vontade, e desta forma qualquer estipulação levada a cabo nestes termos é inválida por ofensa a pressuposto de validade de qualquer contrato, qual seja, o consentimento efetivo, e não meramente formal” (Colégio Recursal Central da Comarca da Capital, 7ª Turma Cível, Recurso Inominado nº 989.10.003003-3, j. em 28/05/2010). Diante da ilegalidade da estipulação do reajuste por sinistralidade, de rigor sua substituição pelos índices estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, os quais bem refletem a variação dos custos médico-hospitalares. Os valores cobrados a maior dos consumidores, assim, merecem restituição. Urge a consideração, nessa ordem de idéias, de que a correção monetária é devida, porquanto sua função precípua é recompor o poder monetário existente ao tempo do inadimplemento. Sua finalidade é manter atualizados os valores devidos, sem ocasionar qualquer forma de lucro ou prejuízo para as partes. Os índices da Tabela Prática de Atualização de Débitos Judiciais Egrégio do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo constituem fonte segura à atualização dos débitos e, portanto, devem ser aplicados. Ausente a comprovação da prévia constituição do devedor em mora, os juros são devidos a contar da citação, ex vi do artigo 405 do Código Civil. A prescrição, na ausência de disposição legal prevendo prazo específico, regula-se, conforme o caso, ou pelo artigo 205 do Novo Código Civil ou pelo artigo 177 do Código Civil de 1916. Mister a consideração, nesse passo, de que a obrigação de restituir as quantias indevidamente recebidas não se enquadra como pretensão à reparação civil (artigo 206, parágrafo 3o, inciso V, do Código Civil de 2002), tampouco se identifica com fato do serviço prestado (artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor). Entretanto, é imprescindível que o consumidor proceda à liquidação do montante que lhe é devido, na esteira do disposto pelo artigo 97 da Lei no 8.078/90, observando que, na sua inércia, é passível a execução coletiva do julgado, em consonância ao artigo 98 do mesmo diploma legal. Ao cabo, contudo, a publicação da sentença não ostenta esteio legal, bastando para lhe dar publicidade a publicação de editais na forma do artigo 94 do Código de Defesa do Consumidor. Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO formulado por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL S.A., para, nos contratos coletivos por adesão celebrados pela requerida com micro e pequenas empresas: a) declarar a nulidade da cláusula contratual que estipula em desfavor do consumidor reajuste por sinistralidade; b) impor a abstenção à demandada de inserir, nos contratos celebrados, disposição estabelecendo reajuste por sinistralidade, sob pena da incidência de multa, com fundamento no artigo 461, parágrafo 4o, do Código de Processo Civil, no montante de R$5.000,00, por descumprimento; c) impor à requerida a revisão da contraprestação que lhe é devida, com a incidência somente dos índices da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, sem prejuízo dos reajustes por mudança de faixa etária; d) condenar, genericamente, a ré, com substrato no artigo 95 do Código de Defesa do Consumidor, a restituir os valores cobrados dos consumidores, por conta do reajuste por sinistralidade, corrigidos da data do desembolso, consoante a Tabela Prática de Atualização de Débito Judiciais do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, e com juros moratórios de um por cento ao mês, consoante aos artigos 406 e 407 do Código Civil combinado com o artigo 161, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional, a contar da citação. Tendo sucumbido quase na integralidade da demanda, em consonância ao artigo 21, caput, do Código de Processo Civil, condeno, ainda, AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL S.A., ao pagamento das custas e despesas processuais. Uma vez ainda não efetivado, publique-se, em conformidade ao artigo 94 do Código de Defesa do Consumidor, edital para conhecimento dos interessados da propositura da demanda, possibilitando a intervenção como litisconsortes. Pendendo de julgamento agravo de instrumento, oficie-se ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com cópia da presente decisão (fls. 723/725). Com o trânsito em julgado, em conseqüência, resta extinto o processo, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, com resolução de mérito. Publique-se, registre-se, intime-se e cientifique-se o Parquet. São Paulo, 8 de maio de 2012. Anderson Cortez Mendes Juiz de Direito

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