Migalhas Quentes

Empresa dona de Americanas.com e Submarino deve pagar R$3 mi por danos morais

MPT constatou irregularidades na jornada de trabalho.

11/7/2012

A 1ª vara do TRT da 2ª região condenou a B2W Global do Varejo, proprietária das marcas Americanas.com e Submarino, a pagar R$ 3 mi por danos morais coletivos por cometer irregularidades na jornada de trabalho dos funcionários.

A ACP foi ajuizada pelo MPT em Osasco após a constatação de que a empresa vinha descumprindo com as normas que garantem a salubridade do trabalho prestado pelos seus empregados, exigindo que estes trabalhassem além dos limites máximos de jornada diária e semanal, sem gozar intervalo intrajornada e interjornadas legais, em domingos e feriados, gerando, com isso, lesão a direitos desta coletividade de trabalhadores.

A empresa argumentou que esse cenário acontecia muito pontualmente, que em determinados meses teria sofrido dificuldades grandes no que se refere à distribuição dos seus produtos, em razão do aumento nas vendas pelo comércio eletrônico, o que levou a configuração de dificuldade de logística. Alegou também que os funcionários aceitaram e recebiam pelo trabalho extra.

O juiz do Trabalho susbtituto Mauro Volpini Ferreira condenou a B2W Global do Varejo, entre outros, a:

A indenização de R$3 mi será revertida ao FAT.

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Número Único: 00008570620115020511 (00857201151102004)

Comarca: Itapevi Vara: 1ª

Data de Inclusão: 22/06/2012 Hora de Inclusão: 17:21:45

PROCESS0: 0000857-06.2011.5.02.0511

REQUERENTE: - MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

REQUERIDA: - B2W GLOBAL DO VAREJO

JUIZ: MAURO VOLPINI FERREIRA

Sentença prolatada em 22.06.2012 as 11:00 horas

Nesta data e horário abriu-se a audiência para a apreciação do processo em questão. Apregoadas as partes, verificou-se à ausência de ambas. Profere-se a decisão abaixo.

I- RELATÓRIO

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face B2W GLOBAL DO VAREJO, pleiteando a condenação da requerida em obrigação de respeitar a duração do trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros constitucionais de 44 horas semanais e 8 horas diárias sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada não respeitar esta determinação legal e, para cada dia em que for constatado o descumprimento; não prorrogar injustificadamente a jornada normal de labor dos seus empregados além do limite legal de duas horas diárias, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada for prorrogada além do limite legal e, para cada dia em que for constatado o descumprimento, excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da CLT que sejam devidamente comprovadas; conceder a seus empregados cujo trabalho contínuo exceda de seis horas, um intervalo para repouso ou alimentação de, no mínimo um hora, na forma estabelecida no art. 71 da CLT, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido intervalo na forma legal; conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11 horas consecutivas entre duas jornadas de trabalho, na forma estabelecida no art. 66 da CLT, sob pena de multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido intervalo na forma legal; conceder a seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas consecutivas, na forma estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº 605/59, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal; conceder a seus empregados descanso nos feriados civis e religiosos de acordo com a tradição local, excetuados os casos, devidamente comprovados, em que a execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas, conforme art. 70 da CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e Decretonº 27;048/49, sob pena de multa de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso, nos termos da legislação própria, sendo que as multas deverão serem revertidas ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Ainda, buscou a condenação da requerida no pagamento de indenização por danos coletivos no valor de R$5.000,00.

Atribuiu à causa o valor de R$5.000.000,00 (fls. 27).

Juntou documentos (um volume apartado).

Primeira proposta de conciliação rejeitada.

Decisão concedendo a antecipação de tutela às fls. 24.

A requerida apresentou defesa escrita (fls. 51/70), argüindo preliminarmente a ilegitimidade ativa do requerente e, no mérito, afirmou que os fatos teriam ocorrido de forma sazonal negou os direitos pretendidos pela reclamante.

Juntou documentos (14 volumes apartados).

Manifestação às fls. 79/101 com os documentos de fls. 102/111.

Às fls. 112/116 petição do requerente informando o descumprimento da decisão de antecipação de tutela com os documentos de fls. 118/145.

Não foram produzidas provas de audiência (fls. 39).

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1. DAS MEDIDAS SANEADORAS

1.1. Da petição de informação

Observo às fls. 112/116 petição do requerente informando o descumprimento da decisão de antecipação de tutela com os documentos de fls. 118/145, sendo que, por equívoco da Secretaria desta Vara, a mesma não foi concluída para despacho. Assim, neste ato conhecimento de tal peça e, portanto, garantindo o contraditório, determino a intimação da requerida para que, no prazo de dois dias, se manifeste sobre as informações mencionadas. Após a expiração do prazo, deverá a Secretaria concluir os presente autos imediatamente para análise do requerido, devendo ainda, verificar as causas da não conclusão desta petição procedendo as alterações necessárias para que isso não mais ocorra.

2. DEFESA INDIRETA DE PROCESSO

2.1. PEREMPTÓRIAS (preliminares)

2.1.1. Da ilegitimidade ativa

Arguiu a requerida a ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para a propositura desta ação, afirmando não se tratarem de direitos difusos, tampouco a direitos coletivos em sentido estrito,posto que, embora determináveis os interessados, estes não compartilham com a empresa , uma mesma relação jurídica indivisível, pois como é cediço, o contrato de trabalho possui natureza bilateral, perfazendo-se entre cada empregado e a empresa, uma relação jurídica distinta. Acrescentou que os direitos declinados na inicial seriam verdadeiros direitos heterônomos, direitos individuais ao quais não perfazem objeto da ser tutelado por esta espécie de ação coletiva.

Sem nenhuma razão a requerida, pois de acordo com o disposto no art. 129, III da Constituição Federal de 1988, é função do requerente promover ação civil pública para a proteção de outros interesses difusos e coletivos.

Ainda, fixa o inciso III do art. 83 da Lei Complementar nº 75/93 ser atribuição do Ministério Público do Trabalho promover a ação civil pública no âmbito na Justiça do Trabalho, para a defesa de interesses coletivo, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos, bem como, define o inciso II do art. 81 da Lei nº 8.078/90 que interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica de base.

Sem dúvida que a violação de direitos como os arguidos pelo requerente, geram pretensões individuais a cada um daqueles trabalhadores, no entanto, não podemos perder de vista que, quando isso ocorre com a coletividade de empregados da uma empresa como a reclamada, surge concomitantemente a violação dos interesses coletivos consistentes no direito de trabalhar em um ambiente salubre. Ocorre que salubridade do meio ambiente de trabalho não decorre tão somente a inexistência de agentes físicos ou químicos, ou sua anulação por meio de EPI's, mas também de pessoas que não estejam submetidas a condições abusivas de trabalho que levam a fadiga, ao erro e finalmente ao aumento da ocorrência de acidentes.

Desta forma, considero o requerente parte legítima para compor o pólo passivo da presente ação, rejeitando, por conseguinte, a presente preliminar.

3. DO MÉRITO

3.1. DEFESA INDIRETA DO MÉRITO

3.2. DEFESA DIRETA DO MÉRITO

3.2.1. Dos fatos

Arguiu o requerente, que a requerida vem descumprindo com as normas que garantem a salubridade do trabalho prestado pelos seus empregados, exigindo que estes trabalhe além dos limites máximos de jornada diária e semanal, sem gozar intervalo intrajornada e interjornadas legais, em domingos e feriados, gerando, com isso, lesão a direitos desta coletividade de trabalhadores.

A requerida se defendeu (item U.1- fls. 58) argumentando que em determinados meses, mais precisamente no mês de agosto de 2010 (auge da crise) teria sofrido dificuldades grandes no que se refere à distribuição dos seus produtos, em razão do grande acréscimo de vendas ocorrido, nessa modalidade de comércio eletrônico, o que levou a configuração de dificuldade de logística. Ainda, esclareceu que para solucionar o problema, foram contratados como empregados, mais de 2.500 trabalhadores que eram terceirizados, sanando os problemas constatados pelo requerente relativos aos meses de junho, julho e agosto/2010, os quais não mais ocorreram.

Assim, como bem pode ser visto, a requerida não negou os fatos articulados pelo requerente na presente ação, mas tão somente, deduziu causa impeditiva do direito pretendido, qual seja, que as violações descritas pelo requerente não mais ocorreriam e, portanto, não haveria razão da propositura da presente ação.

Em primeiro lugar é necessário observar que a presente ação não versa apenas sobre obrigações de fazer e não fazer, mas também o requerente pleiteou a condenação da requerida no pagamento de indenização por danos morais coletivos, em face do qual, a situação de ter cessado as violações de direitos dos trabalhadores da requerida não teriam qualquer relevância, exceto como parâmetro balizador de eventual indenização a ser arbitrada, quando analisada pelo seu viés pedagógico.

Em relação aos demais pedidos, entendo que a requerida igualmente não tenha razão, pois ainda que na atualidade não estejam havendo quaisquer violações de direitos dos seus empregados, em sua própria inicial aquela declarou que o problema é sazonal, ou seja, sempre se repete em uma época do ano. Assim, se evidenciado o descumprimento de normas como arguido pelo requerente, o fato de no momento isso não estar ocorrendo, não afasta o interesse processual, pois conforme a reclamada reconheceu, o problema é sazonal.

Ainda, apenas para não se argumentar que este juízo deixou de conhecer a questão no todo, explico que o argumento de que o problema foi resolvido com a contratação dos trabalhadores terceirizados não é prova de que as violações não continuaram a ocorrer, pois não há nos autos qualquer prova de correlação entre as atividades econômicas da requerida e o número de trabalhadores que atuam em sua atividade, sem o que, impossível reconhecer que o número um pouco maior ou menor representa de fato, diminuição de carga a ser distribuída a cada empregado que não mais justificasse as violações cometidas no assim denominado auge da crise.

3.2.2. Dos descansos semanais remunerados e feriados

Arguiu o requerente ter sido verificado trabalhadores que laboravam por 27 dias consecutivos, sem nenhum descanso, como por exemplo, o caso da operadora de estoque Sra. Maria Rubia Damasceno Assunção e da Supervisora II Marluce Pereira de Brito.

O requerida se defendeu argüindo que o art. 7º, XV da C.F. prevê a concessão de repouso semanal remunerado apenas preferencialmente aos domingos, admitindo-se a concessão do repouso semanal remunerado submetido a negociação. Ainda, acrescentou que o disposto na Lei nº 605/49 é no mesmo sentido.

Com razão a requerida em relação ao trabalho aos domingos, no entanto, não se apercebeu que o requerente não deduziu argumentação divergente, mas pelo contrário, apenas afirmou que aquela não estaria observando a concessão de descanso semanal de 24 horas consecutivas, como bem pode ser visto pelo pedido elencado sobre a letra e (fls. 20). Tanto é assim, que a causa de pedir não aponta o fato de que algum trabalhador não teria gozado descanso semanal em domingo, mas sim que existem trabalhadores que teriam trabalhado por até 27 dias consecutivos sem que houvesse dia reservado ao descanso. Acrescento que o fato das CCT autorizarem a realização de trabalho em dias de domingos, feriados nacionais e religiosos, de forma alguma elide o direito do trabalhador ao descanso semanal, o qual deve ser concedido em outro dia. Ressalto, que a lei que regulamente o direito ao descanso semanal, tem como objeto a salubridade do trabalho prestado, pois é inegável que a ausência de descansos aumenta os riscos relacionados com aspectos psicofísicos, tais como fadiga, familiares (por ausência no convívio familiar), e sócio-econômico (decorrente da maior probabilidade de ocorrência de acidentes de trabalho pela fadiga) e, portanto, sua violação é admitida de forma extraordinária, mas não de forma reiterada como a requerida vem impondo a seus funcionários.

No tocante aos feriados prevê o art. 8? Lei nª 605/49:

Excetuados os casos em que a execução do trabalho foi imposta pelas exigências técnicas das empresas, é vedado o trabalho em dias feriados civis e religiosos, garantida, entretanto, aos empregados a remuneração respectiva, observados os dispositivos dos arts. 6? e 7? desta Lei.

É necessário explicar que a requerida não se enquadra nas situações que o art. 7º do Decreto º 27.048/49 expressamente autoriza o trabalho nos feriados e, portanto, o trabalho realizado nestes dias é ilegal.

Assim, a argumentação da requerida sobre a autorização para a possibilidade do empregado trabalhar em domingos e feriados é estéril, pois apenas tentar desviar a atenção para o foco real da questão, qual seja, a violação ao direito ao descanso semanal por 24 horas do trabalhador.

3.2.3. Do intervalo intrajornada

Em relação a esta questão, a requerida se defendeu argumentando que o requerente teria afirmado não ter verificado a existência de marcação de ponto do intervalo intrajornada, e que tal fato não ensejaria a conclusão de que seus trabalhadores não gozassem o mesmo.

Neste ponto, entendo que realmente a requerida tenha razão, pois o§2º do art. 74 da CLT não exige sua anotação, mas tão somente sua prévia assinalação. Assim, o fato dos empregados da reclamada não registrarem o horário do intervalo não tem como efeito gerar a presunção de que não estaria usufruindo do mesmo.

3.2.4. Das horas extraordinárias

No tocante a esta questão, observo que a requerida inicia sua defesa argumentando com a legalidade da exigência de horas extraordinárias até o limite de 10 horas, no entanto, tal defesa é estéril, pois em momento algum o requerente pleiteou que aquela não mais exigisse dos seus empregados trabalho em horas extraordinárias, mas pelo contrário, a causa de pedir deduzida diz respeito à violação do limite imposto pelo art. 59 da CLT, qual seja, de superação do horário normal no máximo por mais duas horas. Como pode ser visto, o requerente demonstra que existem trabalhadores da requerida que laboram até 7 horas a mais do que a jornada normal, atingindo 77horas semanais de trabalho, o que ao meu ver, é um absurdo.

Lembro, que o fato da requerida argumentar estar pagando o trabalho realizado em horas extraordinárias com o adicional devido, de forma alguma afeta o pedido formulado pelo requerente, pois este não busca o cumprimento de direitos individuais dos empregados da reclamada e sim, o cumprimento de normas de salubridade e segurança do trabalho despendido por aqueles. Se por um lado a realização de trabalho em horas extraordinárias gera o direito a contraprestação deste com o adicional legal ou convencional fixado, de outro é inegável que a extrapolação aos limites impostos pela CLT a esta prática, levam ao desgaste físico do trabalhador em inegável violação de direito coletivo, ou seja, ao direito de ter uma jornada digna que não ofenda a capacidade física do trabalhador, além da qual teremos a extenuação destes, com perda da capacidade de concentração e conseqüente majoração das falhas humanas que resultam em acidentes individuais, quando não, coletivos. Um trabalhador em situação de fadiga, não expõe somente sua integridade física em risco, mas também a dos demais colegas, situação esta que não representa violação de direito individual, mas sim de direito coletivo ao meio ambiente de trabalho salubre.

Refutado o primeiro argumento da requerida, passo a analisar o subseqüente.

Arguiu a requerida em sua defesa, que o labor extraordinário constatado pelo requerente teria decorrido de situação de necessidade imperiosa e/ou inexecução de tarefa que acarrete em prejuízo, situações autorizadas pelo art. 61 da CLT.

Ora, pela própria argumentação da requerida, qual seja, de que teria sofrido dificuldades grandes no que se refere à distribuição dos seus produtos, em razão do grande acréscimo de vendas ocorrido, nessa modalidade de comércio eletrônico, o que levou a configuração de dificuldade de logística, pode ser visto que a situação não se enquadra no disposto no art. 61 da CLT. Uma leitura mais atenta deste artigo demonstra que o legislador autorizou a superação do limite máximo de trabalho em uma jornada para situações imperiosas, explicando em sequência, que esta se refere a situações de força maior ou para atender a realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto.

Em relação à primeira hipótese, é óbvio que o aumento de vendas por ventura realizado pela requerida assim não pode se enquadrado, pois se este resolveu vender além da sua capacidade de exercício de atividade, o fez por vontade própria, pois poderia ter limitado as vendas. Assim, se a ganância levou a requerida a vender além de sua capacidade, isso não pode ser considerado força maior.

No tocante à segunda hipótese, explica Arnaldo Süssekind que quanto aos serviços inadiáveis, como emana do próprio texto legal, são aqueles cuja realização imediata se torna imperiosa para evitar o perecimento de um bem econômico ou o prejuízo manifesto que certamente adviria de sua inexecução. Neles não podem ser incluídas situações deliberadamente criadas pelo empregado com o fim de obter a prestação do trabalho extraordinário, senão as que decorrem das próprias exigências da produção ou aquelas tendentes a preservar o bom andamento dessa mesma produção. São destarte, situações que de muito se aproxima do conceito de força maior, dela se diferenciando, apenas, no que concerne à intensidade dos requisitos essenciais à sua existência Assim, fica claro que a situação arguida como justificadora do trabalho extraordinário, não se enquadra nesta hipótese, pois se realmente houve aumento expressivo de vendas fato este nem mesmo comprovado por óbvio isso decorreu da vontade da requerida ou falta de habilidade na condução de sua atividade, o que nem de perto se aproxima da situação extraordinária fixada na lei.

Em relação ao intervalo interjornadas, observo que a requerida incluiu tal questão neste mesmo item, no entanto, não deduziu uma palavra sequer sobre o mesmo, em face do que, concluo não haver justificativas para que seja descumprido este direito dos trabalhadores.

Passo a analisar as condições normais autorizadoras da superação do limite de jornada.

Em relação à jornada, o art. 57 da CLT expressamente fixa que a duração normal do trabalho dos empregados em qualquer atividade não deveria exceder a 8 horas diárias, a não ser que fixado expressamente outro limite. Já o art. 59 da CLT fixa que a duração normal do trabalho, ou seja, de 8 horas ou outra expressamente fixada, poderá ser acrescida de horas suplementares até o limite de duas horas, mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho, devendo ficar claro que a necessidade da formalização por escrito se dava, inclusive, pelo fato do §1º deste artigo exigir que naquele constasse o valor da hora suplementar, o qual não poderia ser menor do que 50%. Lembro, que o caput do art. 59 da CLT exige a formalidade apenas para a prorrogação da jornada nada falando sobre a compensação em face do que, entendo que esta pode ser realizada independente de autorização expressa, bastando, portanto, a existência do acordo de prorrogação, o qual, por conseqüência lógica, atua como autorizador da compensação.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, acabou a liberdade das partes poderem fixar jornada contratual normal além das 08 horas, tendo sido fixado no art. 7º, XIII, como direito do trabalhador a duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Como bem pode ser visto, o legislador constitucional acabou revogando não somente a liberdade dos contratantes fixarem jornada contratual normal com duração além de 8 horas diárias, mas também criou um segundo critério, qual seja, a redução do limite semanal para 44 horas. Mas não foi só, pois também acabou fixando a possibilidade de compensação por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, casos estes em que não haveria necessidade da existência de acordo individual ou contrato coletivo - ambos escritos - firmados com os empregados, mas tão somente a autorização em documentos normativos.

Em relação ao número máximo de horas que podem ser admitidas além da jornada normal, registro evolução de meu entendimento, pois, anteriormente, defendia que as normas constitucionais em relação a normas infraconstitucionais restritivas, não poderiam ser interpretadas ampliativamente e, portanto, quando estas afirmam a existência de um direito, não podemos tirar de tal declaração a negação de outros que pré-existiam, exceto se houvesse conflito entre os mesmos. Nessa linha de raciocínio, como o legislador celetista fixou a possibilidade de superação da jornada normal no máximo por duas horas, tinha o entendimento que o fato do legislador constitucional ter admitido o direito à compensação de horas, não teria representado a possibilidade de superação da hora normal sem nenhum limite e, portanto, concluía que o limite de 10 horas diárias fixadas na CLT não tenha sido derrogado pela Constituição Federal de 1988. Ocorre que o C. TST há muito tem decidido pela legalidade das jornadas de 12 x 36, 12 x 12, 12 x 24 e até da semana espanhola de 24 x 72 (OJ 323 da DSI-I), sob o argumento de que as mesmas favorecem o trabalhador, o qual acaba tendo maior tempo ao seu dispor. Entretanto, alguns ainda argumentavam pelo abuso deste tipo de jornada, as quais atentariam a salubridade do trabalhador pelo excesso de horas de trabalho. Ocorre que, com o advento da Lei nº 11.901/2009, a qual dispõe sobre a profissão de bombeiros, tal discussão caiu por terra.

O art. 5º da citada lei, prevê expressamente a jornada de 12 x 36 horas. Ora, se o legislador expressamente considera, ainda que especificamente para aquela profissão, que tal jornada seja cabível, devemos aplicar o brocardo ubi eadem ratio ibi edem jus, ou seja, onde houver o mesmo fundamento haverá o mesmo direito e, portanto, por analogia não mais podemos admitir o argumento de que tal jornada seria abusiva em relação à salubridade do trabalhador.

Assim, evoluindo sobre o tema, passei a entender que a previsão constitucional da possibilidade de prorrogação e consequente compensação da jornada por outros meios que não os previstos na CLT, ou seja, por acordo ou convenção coletivos do trabalho, gerou a possibilidade desta prorrogação não mais se ater ao mínimo fixado na CLT, não se tratando de derrogação de tal limitação, a qual continua a ser aplicável, mas apenas para as hipóteses de prorrogação previstas na CLT (acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho), e sim de criação de uma nova ordem sobre as prorrogações, as quais, por exigir a intervenção sindical, a qual confere maior proteção a negociação, não mais estaria submetida a limites diários, pois não previsto na Constituição Federal.

Em sequência história, foi acrescentando o § 2º no art. 59 da CLT, o qual criou o popularmente chamado banco de horas, autorizando a dispensa do acréscimo de salário em relação às horas suplementares, desde que implementadas as condições de existência, quais sejam:

- de autorização por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho;

- a não superação do limite diário de 10 horas;

- que o excesso de horas em um dia fosse compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não se excedesse no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas.

É evidente, portanto, que o denominado banco de horas não é admissível por acordo individual escrito ou contrato coletivo e, portanto, somente a modalidade de prorrogação com compensação semanal permaneceu possível por meio de tais autorizações.

Assim, em resumo, atualmente temos:

1. Sistema de prorrogação com pagamento ou compensação semanal o qual exige:

a) autorização por acordo individual escrito, contrato coletivo, acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva

de trabalho;

b) não superação do limite diário de 10 horas;

c) compensação semanal ou pagamento de adicional de no mínimo 50%.

2. Sistema de prorrogação fixo sem compensação, o qual exige:

a) fixação por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho da jornada diária especial.

b) jornada total mensal mais benéfica ( menor do que 220 horas).

Peculiaridade: - Não há limitação da jornada diária até o máximo de 10 horas, bem como, não se aplica a hora noturna reduzida, a qual acabaria inviabilizando a jornada, bem como, devem ser considerados remunerados os domingos e feriados trabalhados que caem na escala do empregado

3. Sistema de prorrogação com pagamento ou compensação anual o qual exige:

a) autorização por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho;

b) não superação do limite diário de 10 horas;

c) compensação anual ou pagamento de adicional de no mínimo 50%.

Desta forma, em situações de normalidade, poderão os empregados da requerida superarem o limite constitucional de jornada diária e semanal, desde que atendendo as condições fixadas para cada tipo de sistema acima descrito.

3.2.5. Das obrigações de fazer

Assim, foram analisadas todas as objeções deduzidas pela requerida como justificadoras da incontroversa situação constatada pelo requerente, sendo uma a uma afastada, com exceção do intervalo intrajornada, ficando configurada, portanto, a situação de violação dos direitos da coletividade de trabalhadores daquela de prestaremserviços dentro dos limites impostos pelo legislador na manutenção da salubridade do meio ambiente de trabalho.

Desta forma, acolho os seguintes pedidos formulados pelo requerente, condenando a requerida nas seguintes obrigações:

- respeitar a duração do trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros constitucionais de 44 horas semanais e 8 horas diárias, podendo prorrogar a jornada até o limite de duas além da jornada contratada, desde que atenda as condições impostas nos três sistemas autorizadores de prorrogação e compensação de jornadas explicadas no item 3.2.4 desta fundamentação, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada não respeitar estas determinações e, para cada dia em que for constatado o descumprimento, excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da CLT que sejam devidamente comprovadas;

- conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11 horas consecutivas entre duas jornadas de trabalho, na forma estabelecida no art. 66 da CLT, sob pena de multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido intervalo na forma legal;

- conceder a seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas consecutivas, na forma estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº 605/59, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal;

- conceder a seus empregados descanso nos feriados civis e religiosos de acordo com a tradição local, excetuados os casos, devidamente comprovados, em que a execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas, conforme art. 70 da CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e Decreto nº 27.048/49, sob pena de multa de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso, nos termos da legislação própria, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal.

3.2.6. Do dano moral coletivo

Pretende o requerente a condenação da requerida no pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$5.000.000,00, tendo em vista as violações supra analisadas.

A requerida se defendeu argumentando que não existem razões éticas, técnicas e de fato, para sua condenação, pois não comprovada a violação de direitos coletivos (lado sensu), pelo fato de jamais ter praticado humilhações, maus tratos, pressões psicológicas e rigor excessivo no ambiente de trabalho, bem como, por nunca ter havido tratamento discriminatório ou desrespeitoso por parte de qualquer pessoa de empresa.

Com o devido respeito que a requerida é merecedora, os argumentos deduzidos dizem respeito a violações de direitos individuais, os quais não foram deduzidos pelo requerente como causa de pedir. O que o requerente afirmou foi que a repetição de atos ilegais, conforme os praticados pela ré, faz criar no inconsciente coletivo a passividade diante de situações injustas e à margem do ordenamento jurídico, levando toda coletividade a concluir, de forma desanimadora, que a conduta reprovável é impune, e, portanto, aceitável.

Concordo com o requerente, pois a conduta da requerida de violar tantos direitos de seus trabalhadores, gerando situação absurda de desgaste físico e psicológico, sem contar o aumento dos riscos da ocorrência de acidentes, apenas sob o argumento de que isso seria decorrência de uma situação de aumento de atividade é, no mínimo, absurda, pois se a requerida resolveu vender além de sua capacidade, isso decorreu de sua ganância desenfreada ou mau gerenciamento, não podendo os trabalhadores serem punidos por este descalabro. Lembro, que a situação gerada por esta empresa já é de conhecimento notório, tanto é assim que foi punida com a determinação Judicial de suspensão temporária de suas atividades, bem como, com a obrigação de pagar multa no valor de R$1.744.000,00, por violação do direito dos consumidores em face de atrasos na entrega das transações realizadas . Como pode ser visto, a reprovável atitude da requerida lesou direitos não somente de seus clientes, mas também, como constatado nesta ação, do universo coletivo de seus trabalhadores, em face do que, entendo que tal situação exija realmente punição exemplar, principalmente pelo viés didático de tal medida, para que atingindo o único interesse que norteia a requerida, qual seja, o lucro, esta aprenda que este realmente pode e deve ser almejado dentro do sistema capitalista em que vivemos, mas que sua busca deve ser pautada pela observância aos fundamentos da República Federativa deste país, conforme previsto no art. 1º da Constituição Federal de 1988, em especial à dignidade da pessoa humana e aos valores sociais do trabalho. Por estes fundamentos e diante da capacidade econômica da requerida, a qual fatura mais de quatro bilhões por ano segundo os jornais econômicos, decido condená-la a pagar indenização por dano moral coletivo ora arbitrado em R$3.000.000,00 (três milhões de reais) revertidos ao FAT.

3.2.7. Das explicações complementares

Desde já, deixo absolutamente claro às partes, meu entendimento de que o recurso ordinário possui efeito translativo e, portanto, não é necessário que o julgador ao fundamentar a decisão tomada tenha que responder a cada um dos argumentos expostos, bastando que tenha encontrado fundamento suficiente. Assim, não há que se falar em pré-questionamento, exigência esta somente dos recursos excepcionais. Da mesma forma devem as partes observar, que o argumento de equivocada interpretação de provas, não gera omissão ou contradição, sendo passível de ataque, tão somente, por meio de recurso ordinário.

Este entendimento, inclusive, já se encontra sedimentado no C. TST por meio de Súmula:

393. RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. ART. 515, §1º, DO CPC. (redação alterada pelo Tribunal Pleno na sessão realizada em 16.11.2010)

O efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, que se extrai do §1º do art. 515 do CPC, transfere ao Tribunal a apreciação dos fundamentos da inicial ou da defesa, não examinados pela sentença, ainda que não renovados em contrarrazões. Não se aplica, todavia, ao caso de pedido não apreciado na sentença, salvo a hipótese contida no §1º do art. 515 do CPC.

Tais explicações têm por finalidade advertir as partes do entendimento deste juízo a fim de evitar a provocação de incidentes manifestamente infundados (art. 17,VI do CPC).

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, rejeito a preliminar de ilegitimidade de parte e, no mérito, julgo procedentes, EM PARTE, os pedidos formulados pela reclamante MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, condenando a reclamada B2W GLOBAL DO VAREJO condenando-a cumprir as seguintes obrigações:

- respeitar a duração do trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros constitucionais de 44 horas semanais e 8 horas diárias, podendo prorrogar a jornada até o limite de duas além da jornada contratada, desde que atenda as condições impostas nos três sistemas autorizadores de prorrogação e compensação de jornadas explicadas no item 3.2.4 desta fundamentação, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada não respeitar estas determinações e, para cada dia em que for constatado o descumprimento, excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da CLT que sejam devidamente comprovadas;

- conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11 horas consecutivas entre duas jornadas de trabalho, na forma estabelecida no art. 66 da CLT, sob pena de multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido intervalo na forma legal;

- conceder a seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas consecutivas, na forma estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº 605/59, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal;

- conceder a seus empregados descanso nos feriados civis e religiosos de acordo com a tradição local, excetuados os casos, devidamente comprovados, em que a execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas, conforme art. 70 da CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e Decreto nº 27.048/49, sob pena de multa de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso, nos termos da legislação própria, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal.

Ainda, condeno a requerida no pagamento de indenização por dano moral coletivo ora arbitrado em R$3.000.000,00 (três milhões de reais), revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador.

Custas pela requerida no valor de R$60.000,00, calculadas sobre o valor da condenação ora arbitrada em R$3.000.000,00.

Mantenho a tutela antecipada, em face do que, deverá à Secretaria cumprir o determinado no item 1.1.

Notifiquem-se as partes, sendo que o requerente pessoalmente. Cumpra-se. Nada mais.

MAURO VOLPINI FERREIRA

Juiz do Trabalho Substituto

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