Migalhas Quentes

Bancário que dava suporte emergencial por bip ganha direito a horas de sobreaviso

Decisão do TST considerou que o autor efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões.

23/5/2012

A 8ª turma do TST manteve acórdão do TRT da 4ª região e determinou o pagamento de horas de sobreaviso a bancário que portava bip para atender emergências técnicas. A decisão considerou que o reclamante efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões. Em 1º grau, as horas de sobreaviso haviam sido deferidas como horas extras.

Após decisão do TRT da 4ª região e do TST, a instituição financeira recorreu, sustentando que o empregado podia exercer normalmente suas atividades de lazer e que a condenação ao pagamento de horas de sobreaviso contraria a OJ 49, da SDI-1. A subseção, no entanto, não conheceu dos embargos da empresa.

Para a relatora dos embargos, ministra Delaíde Miranda Arantes, o entendimento do TST, expresso na OJ 49, é de que o uso do BIP, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, pois o empregado não permanece em sua residência aguardando convocação para o serviço. De acordo com ela, no caso em questão, o deferimento das horas de sobreaviso não se baseou “apenas pelo uso de bip, mas por considerar que o autor efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões".

___________

A C Ó R D Ã O

RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007

1 - HORAS EXTRAS. COMPENSAÇÃO DE JORNADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 85 DO TST. Caso em que a Turma, partindo da premissa fática revelada pela Corte Regional de que não houve a necessária demonstração de que o reclamante encontrava-se submetido a regime de compensação de jornada, aplicou o óbice da Súmula 126 do TST, no particular. Dessa forma, não é possível concluir pela contrariedade à Súmula 85 do TST, seja pelo óbice relativo ao reexame de matéria fática, seja porque não demonstrada a ocorrência de regime compensatório de jornada. Recurso de embargos não conhecido.

2 - DESCONTOS SALARIAIS. DEVOLUÇÃO. SEGUROS DE VIDA E CAIXA BENEFICENTE. Não se define contrariedade à Súmula 342 do TST e à Orientação Jurisprudencial 160 da SBDI-1, pois a Turma entendeu serem indevidos os descontos salariais efetuados, não em razão da ausência ou nulidade da autorização, mas diante da inexistência do fato que fundamenta a retenção de valores. Recurso de embargos não conhecido.

3 - HORAS DE SOBREAVISO. USO DE BIP. PLANTÕES. Não há contrariedade à Orientação Jurisprudencial 49 da SBDI-1, pois a Turma registrou, com base no conjunto fático delineado pela Corte Regional, que restou efetivamente caracterizado o regime de sobreaviso, não apenas em razão do uso de BIP, mas por considerar que o reclamante efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões. Recurso de embargos não conhecido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista n.° TST-E-RR-5958700-68.2002.5.04.0900, em que é Embargante BANCO BRADESCO S.A. e Embargado CARLOS JOSÉ GAUTÉRIO ARRUDA.

A 8.ª Turma não conheceu do recurso de revista do reclamado quanto aos temas -compensação de jornada-, -descontos salariais- e -horas de sobreaviso- (fls. 377/389).

O reclamado interpõe recurso de embargos. Sustenta que havia trabalho suplementar compensado. Assevera que os descontos salariais foram autorizados e apresentam-se como válidos. Alega que a autorização dos abatimentos na oportunidade da admissão não autoriza reconhecer a existência de nenhum defeito a macular o ato. Afirma que a utilização do BIP não configura sobreaviso. Indica contrariedade às Súmulas 85 e 342 do TST e às Orientações Jurisprudenciais 49 e 160 da SBDI-1 (fls. 394/397).

Impugnação não apresentada, conforme certidão à fl. 403.

Desnecessária a remessa dos autos à Procuradoria Geral do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2.º, II, do RITST.

É o relatório.

V O T O

1 - CONHECIMENTO

Atendidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passa-se ao exame dos intrínsecos do recurso de embargos, que se rege pela Lei 11.496/2007.

1.1 - HORAS EXTRAS. COMPENSAÇÃO DE JORNADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 85 DO TST

A 8.ª Turma não conheceu do recurso de revista do reclamado, quanto ao tema em epígrafe, aos seguintes fundamentos:

-O Tribunal de origem condenou o Reclamado ao pagamento de horas extras, consignando a inexistência de compensação de jornada e afastando a aplicação da Súmula nº 85 do TST. Eis os fundamentos:

'No fundamento da sentença impugnada consta textualmente: 'A compensação de horário, não prevista em norma coletiva não tem qualquer eficácia e nenhum sentido faz diante do convencimento quanto a efetiva duração do trabalho'.

No seu depoimento o reclamante admite que até 1995 as horas extras que apareciam no ponto eram compensadas e aquelas que não eram anotadas, não eram compensadas. Na contestação, o banco assegura que nas eventuais ocasiões em que houve jornada extra o 'Autor compensou as horas extraordinárias na forma da lei, ou recebeu o valor devido sob o código '43'.

Ora, o recorrente fala em compensação na forma da lei mas não há prova documental alguma quanto a qualquer regime compensatório. Além disso, somente se poderia admitir 'compensação' com as horas extras registradas e não pagas. Contudo, não há prova efetiva da compensação praticada e se esta poderia abranger a totalidade das horas extras prestadas. Como não há prova efetiva da referida compensação e tampouco como aferi-la, o depoimento do reclamante não pode prevalecer em benefício do recorrente, diante da jornada de trabalho reconhecida e do procedimento adotado pelo banco em não permitir o registro da jornada de trabalho efetivamente cumprida. Nega-se provimento.- (fls. 325)

O Reclamado interpõe Recurso de Revista sustentando a ocorrência de regime de compensação de jornada, inclusive admitida pelo Autor. Afirma que a aludida compensação está comprovada nos autos, devendo ser considerada para o cálculo de eventuais diferenças. Aduz que a inexistência de previsão do regime em norma coletiva não retira a eficácia da prática, que decorreu da vontade das partes. Pugna pela limitação da condenação ao adicional, caso se considere irregular a compensação, na forma da Súmula nº 85. Colaciona arestos à divergência.

O Tribunal a quo consignou que não havia nenhuma prova documental quanto à existência de regime compensatório. Entendimento diverso demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos. Óbice da Súmula nº 126.

Não há falar em restrição da condenação referente a horas extras somente ao adicional, uma vez que foi confirmada a inexistência de compensação de horas extras. Não evidenciada a compensação, não há falar na aplicabilidade do entendimento consubstanciado na Súmula nº 85.

Os arestos colacionados às fls. 358/359 não são aptos para comprovar divergência jurisprudencial, porque tratam de acordo de compensação de jornada, cuja existência foi afastada pelo Tribunal Regional. Os de fls. 359/360, que abordam a aplicabilidade da Súmula nº 85, são oriundos de Turma do TST ou são inespecíficos, pois a Corte de origem declarou a inexistência de compensação de jornada. Incidência do art. 896, 'a', da CLT e da Súmula nº 296, I, do TST.

Não conheço.- (fls. 385/386)

O reclamado sustenta que havia trabalho suplementar compensado. Indica contrariedade à Súmula 85 do TST.

A Turma, partindo da premissa fática revelada pela Corte Regional de que não houve a necessária demonstração de que o reclamante encontrava-se submetido a regime de compensação de jornada, aplicou o óbice da Súmula 126 do TST, no particular.

De fato, a análise de matéria fático-probatória não é permitida na instância superior, revelando-se soberana a Corte Regional quanto ao seu exame.

Dessa forma, não é possível concluir pela contrariedade à Súmula 85 do TST, seja pelo óbice relativo ao reexame de matéria fática, seja porque não demonstrada a ocorrência de regime compensatório de jornada.

NÃO CONHEÇO do recurso de embargos, no ponto.

1.2 - DESCONTOS SALARIAIS. DEVOLUÇÃO. SEGUROS DE VIDA E CAIXA BENEFICENTE

A 8.ª Turma não conheceu do recurso de revista do reclamado quanto aos descontos salariais, mantendo a decisão da Corte Regional que os considerou ilícitos. Registrou:

-O Eg. Tribunal a quo considerou ilícitos os descontos efetuados pelo Banco, pelo fato de a autorização ter sido efetivada quando da admissão do empregado. Eis os fundamentos:

'A decisão questionada deferiu a devolução dos descontos sob o argumento de que 'é irresistível a coação para o ato de adesão a seguro de vida e Caixa Beneficente quando coincidente com a admissão - face a necessidade de obtenção do emprego.'

Neste sentido, é de observar que os documentos de fls.107 a 109 foram firmados na data da admissão, 10/04/1991. Aquele referente à Caixa Beneficente dá conta que o recorrido já era e detinha a qualidade de sócio na data da admissão, o que é inviável aceitar-se. Já aqueles de fls.108/09 são apenas 'cartão proposta', devendo seguir-se prova evidente de que a proposta para o seguro fosse aceita pelo estipulante do seguro, no caso, 'Top Clube Bradesco', empresa do mesmo grupo do recorrente, com vinculação à Bradesco Seguros.

Não se verifica, no caso, a condição do recorrido como sócio da Caixa Beneficente e tampouco a aceitação do cartão proposta para seguro(fls.108). Esta 1ª Turma, apreciando a mesma matéria, no processo 00131.741/00-4, com decisão publicada em 18/2/2002, tendo como Relator o Juiz Leonardo M. Brasil, assim entendeu:

EMENTA: DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS. SEGURO DE VIDA. A autorização para realização de descontos efetuados no salário do empregado, quando efetivada no momento de sua admissão, configura-se em vício de consentimento. Entendimento predominante na Turma Julgadora que o desconto efetuado no salário do autor apresenta-se como abusivo e afronta ao disposto no artigo 462 da Consolidação. Ressalvado o voto vencido do Relator, o apelo não é provido no item.

Por conseguinte, também aqui não prospera o apelo. Nega-se provimento.- (fls. 328/329 - destaques acrescentados)

No Recurso de Revista, o Reclamado sustenta que o simples fato de a autorização ter sido efetuada quando da admissão do empregado não caracteriza, por si só, coação, não havendo prova da existência de vício de vontade. Afirma ser indevida a condenação com base em presunção. Indica contrariedade à Súmula nº 342 desta Corte. Colaciona arestos à divergência jurisprudencial.

Verifica-se que, diversamente do alegado, o acórdão regional não se fundamenta na mera presunção de coação decorrente do fato de a autorização dos descontos ter ocorrido no momento da admissão no emprego. Ao contrário, a Corte de origem, analisando os documentos dos autos, concluiu que, na verdade, não foi provada a condição de sócio da Caixa Beneficente e do seguro Top Clube Bradesco, para os quais eram feitos os descontos salariais.

Não provada a condição de sócio, são indevidos os descontos salariais efetuados, não em razão da ausência ou nulidade da autorização, mas, sim, em razão da inexistência do fato que fundamenta a retenção de valores.

A Súmula nº 342 do TST e os arestos colacionados são inespecíficos, nos termos da Súmula nº 296, I, desta Corte, por tratarem da autorização para descontos salariais, enquanto o acórdão recorrido firma-se na ausência de prova da adesão do Reclamante aos benefícios para os quais se destinavam os descontos.

Não conheço.- (fls. 381/382)

O reclamado assevera que os descontos salariais foram autorizados e apresentam-se como válidos. Alega que a autorização dos abatimentos na oportunidade da admissão não autoriza reconhecer a existência de nenhum defeito a macular o ato. Aponta contrariedade à Súmula 342 do TST e à Orientação Jurisprudencial 160 da SBDI-1.

Não se define contrariedade à Súmula 342 do TST e à Orientação Jurisprudencial 160 da SBDI-1, pois a Turma entendeu serem indevidos os descontos salariais efetuados, não em razão da ausência ou nulidade da autorização, mas diante da inexistência do fato que fundamenta a retenção de valores.

NÃO CONHEÇO do recurso de embargos, no particular.

1.3 - HORAS DE SOBREAVISO. USO DE BIP. PLANTÕES

A 8.ª Turma, no aspecto, não conheceu do recurso de revista patronal, consignando:

-Estes, os fundamentos do acórdão regional:

'O que se conclui dos fundamentos da defesa é que o reclamante era escalado para os plantões do BDN. Resta incontroverso, por óbvio, que o recorrido participava de plantões. Assim, o plantão significa estar à disposição. O aparelho BIP servia para chamados e havendo estes, o recorrido deslocava-se para resolver as situações para as quais escalado. Duas situações decorriam, portanto, dos plantões: a primeira, que o recorrido ficava à disposição do BDN; a segunda, quando acionado o BIP, exigia o deslocamento e trabalho do reclamante para resolver as emergências do BDN. Uma situação não exclui a outra, ou seja, o fato de estar de plantão (à disposição) não implicava a não prestação do trabalho, assim como a prestação do trabalho pelo o acionamento do BIP não implicava considerar que o autor não estava, antes, à disposição.

O recorrido só poderia ser acionado através do BIP se estivesse de plantão e plantão significa estar à disposição do banco. Neste sentido, correta a decisão de origem que considerou as horas de plantão no suporte do Banco Dia e Noite como de sobreaviso.

Argumento o banco recorrente, ainda, que as horas de sobreaviso não foram postuladas e que houve julgamento extra petita. Cita que a condenação é diversa do pedido formulado.

Sem razão. O sobreaviso analisado destacadamente na decisão e também assim destacado na contestação do banco, fls.90, é subitem da parcela horas extras. O pedido do recorrido, quanto às horas extras inclui as horas de plantões. Diante disso, adequado o procedimento do Juízo de 1º grau ao analisar o tema destacadamente e deferir tais horas como extras, como especificamente foi postulado. Veja-se que nos fundamentos da decisão, no item III, 2, fls.259/60, as horas de sobreaviso foram deferidas como horas extras, por aplicação analógica, na forma do art.224, §2º, da CLT. Fácil concluir, pois, que a sentença analisou e deferiu o que foi postulado, não havendo julgamento diverso do pedido e muito menos deferimento extra petita.

Nega-se provimento.' (fls. 327/328)

O Reclamado opôs Embargos de Declaração, alegando omissão, contradição e obscuridade do julgado no que se refere à questão do uso do Bip. O Tribunal Regional, entretanto, rejeitou o recurso, por entender que a reapreciação do mérito é vedada em sede de Embargos de Declaração.

O Réu, no Recurso de Revista, afirma ser inaplicável o art. 244, § 2º, da CLT aos bancários, mesmo que analogicamente, pois inexiste semelhança entre as tarefas desenvolvidas por essa categoria e pelos ferroviários. Sustenta que, mesmo utilizando o Bip, o empregado podia exercer normalmente suas atividades de lazer. Aduz, sucessivamente, que só devem ser pagas as horas efetivamente prestadas quando dos atendimentos dos chamados. Alega ofensa ao art. 5º, II, da Constituição Federal e contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 49 da SBDI-1. Colaciona arestos ao cotejo de teses.

A alegação referente à impossibilidade de aplicação analógica do art. 244, § 2º, da CLT não foi prequestionada, nos termos da Súmula nº 297 desta Corte.

O Tribunal Regional, com base no depoimento do próprio Reclamado, assentou que o Reclamante era escalado para os plantões no suporte do Banco Dia e Noite (BDN) e que portava um Bip para atender às emergências técnicas referentes a esse serviço. Concluiu, dessa forma, que o Autor só poderia ser acionado por meio do Bip se estivesse de plantão e que este significava estar à disposição do empregador.

Nesse passo, verifica-se que a Corte de origem entendeu caracterizado o regime de sobreaviso, não apenas em razão do uso de bip, mas por considerar que o Reclamante efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões. A verificação de contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 49, ante a alegação de que não havia restrição à liberdade de locomoção e de uso do tempo durante as escalas de plantão, demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, obstado pela Súmula nº 126 desta Corte.

Os arestos transcritos às fls. 347/348 tratam de situação fática diversa da discutida nos autos. Na hipótese, o Tribunal Regional entendeu comprovado que, durante as horas de plantão no suporte do Banco Dia e Noite, o Autor ficava totalmente à disposição do Banco. Aplicação da Súmula nº 296, I, do TST.

Não conheço.- (fls. 379/380)

O reclamado afirma que a utilização do BIP não configura sobreaviso. Indica contrariedade à Orientação Jurisprudencial 49 da SBDI-1, ao argumento de que o empregado era passível de contato no período do plantão.

O entendimento desta Corte é no sentido de que -o uso do BIP pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço- (Orientação Jurisprudencial 49 da SBDI-1).

Contudo, não há contrariedade ao verbete acima referido, pois a Turma registrou, com base no conjunto fático delineado pela Corte Regional, que restou efetivamente caracterizado o regime de sobreaviso, não apenas em razão do uso de BIP, mas por considerar que o reclamante efetivamente ficava à disposição do empregador quando era escalado para os plantões.

Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do recurso de embargos.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de embargos.

Brasília, 12 de abril de 2012.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

DELAÍDE MIRANDA ARANTES
Ministra Relatora

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