Justiça do Trabalho
Espera de 1h para revista de bolsas gera hora extra para funcionário
A 1ª turma do TST manteve sentença que reconheceu direito de funcionário ao recebimento de uma hora extra por dia, tempo em que permanecia à disposição do empregador para a realização da revista de bolsas e sacolas.
Segundo o auxiliar, diariamente os vigias gastavam em média uma hora para revistar todos os funcionários (quatro minutos por pessoa), e os ônibus que os transportavam só eram liberados após todos serem revistados. O transporte da empresa era a única forma de saída do local.
A sentença da vara de Macau/RN reconheceu que esse tempo gasto deveria ser considerado como à disposição da empresa, a quem interessava a revista, e integrado a jornada de trabalho e remunerado como extra, com adicional de 50%.
A Queiroz Galvão recorreu ao TRT da 21ª região, que manteve a condenação.
Por meio de recurso de revista, a empresa contestou alegando que o trabalhador não conseguiu comprovar o trabalho em jornada extraordinária. Entendeu que cabia à reclamada apresentar provas que desconstituíssem as alegações autorais e, tendo a única testemunha ouvida confirmado o tempo de revista declinado pelo autor, "mostra-se correta a decisão que deferiu o pagamento das horas extras, com as repercussões devidas, conforme reconhecido pelo decisum a quo."
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Processo Relacionado : 86700-91.2009.5.21.0021
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ACÓRDÃO
(1ª Turma)
GJCHCS/aqs/viv
MULTA PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO ÀS EXECUÇÕES NO PROCESSO DO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE. Encontra-se firmado nesta Corte superior entendimento no sentido de que a Consolidação das Leis do Trabalho traz regramento específico quanto à execução, resultando inaplicável a multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho. Em se tratando de recurso de revista interposto a decisão proferida na fase de conhecimento, afigura-se viável a veiculação do recurso de revista mediante demonstração de dissenso jurisprudencial, ou mesmo de violação do próprio dispositivo da lei processual civil, aplicado à hipótese com ele incompatível. Precedentes da Corte. Recurso de revista conhecido e provido.
HORAS EXTRAS. ÔNUS DA PROVA. O debate sobre a valoração da prova efetivamente produzida - ônus objetivo de prova - tende à reavaliação do conjunto probatório dos autos, o que, induvidosamente, não rende ensejo ao recurso de revista, em face de sua natureza extraordinária. Óbice da Súmula n.º 126 desta Corte superior. Recurso de revisa não conhecido.
HORAS DE PERCURSO. SUPRESSÃO. NORMA COLETIVA. ARTIGO 58, § 2º, DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. 1. Inadmissível transação de direito previsto em norma de caráter cogente, máxime com prejuízo para o empregado. 2. O pagamento de horas de percurso está assegurado pelo artigo 58, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que constitui norma de ordem pública. Sua supressão mediante norma coletiva, no período posterior ao advento da Lei n.º 10.243/2001, afronta diretamente o referido dispositivo e, portanto, sua validade não tem suporte no artigo 7º, XXVI, da Constituição da República. 3. Precedentes da Corte. 4. Recurso de revista não conhecido.
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. MATÉRIA FÁTICA. É insuscetível de revisão, em sede extraordinária, a decisão proferida pelo Tribunal Regional à luz da prova carreada aos autos. Somente com o revolvimento do substrato fático-probatório dos autos seria possível afastar a premissa sobre a qual se erigiu a conclusão consagrada pela Corte de origem, no sentido de que o reclamante, durante o exercício de suas atividades, estava exposto a agentes insalubres. Incidência da Súmula n.º 126 do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista não conhecido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Recurso de Revista n.º TST-RR-86700-91.2009.5.21.0021, em que é Recorrente QUEIROZ GALVÃO ALIMENTOS S.A. e Recorrido F.F.S.L.
O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região, por meio do acórdão prolatado às fls. 615/622, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela reclamada, mantendo sentença mediante a qual fora condenada ao pagamento de parcelas decorrentes de jornada extraordinária, horas in itinere e adicional de insalubridade, sendo reconhecida a aplicabilidade do artigo 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho.
Inconformada, interpõe a reclamada o presente recurso de revista, mediante as razões que aduz às fls. 628/660. Busca a reforma do julgado quanto aos temas -horas extras-, -horas in itinere- e -adicional de insalubridade- e -aplicabilidade do artigo 475-J do CPC ao Processo do Trabalho- esgrimindo com ofensa a dispositivos de lei e da Constituição da República, bem como divergência jurisprudencial.
O recurso de revista foi admitido por meio da decisão proferida às fls. 678/680.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Autos não submetidos a parecer da douta Procuradoria-Geral do Trabalho, à míngua de interesse público a tutelar.
É o relatório.
VOTO
I - CONHECIMENTO
1 - PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL.
O recurso é tempestivo (acórdão publicado em 21/3/2011, segunda-feira, conforme certidão lavrada à fl. 623, e razões recursais protocolizadas em 26/3/2011, à fl. 628). O depósito recursal foi efetuado no valor legal e as custas, recolhidas à fl. 589. A reclamada está regularmente representada nos autos, consoante procuração acostada à fl. 664.
2 - PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL.
MULTA PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO AO PROCESSO DO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE.
A Corte de origem negou provimento ao recurso ordinário interposto pela reclamada, confirmando a sentença no tocante ao entendimento no sentido da aplicabilidade prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil ao caso. Valeu-se, na oportunidade, dos seguintes fundamentos, consignados às fls. 621/622 - grifos no original:
2.4 - Multa do art. 475-J, do CPC
A recorrente sustenta que a penalidade inserta no art. 475-J do CPC é inaplicável ao processo trabalhista.
Não lhe assiste razão.
Tanto na execução trabalhista, quanto na execução fiscal (aplicada subsidiariamente) - Lei n.º 6.830/80 inexistem dispositivos que imponham ao devedor uma sanção, compelindo-o ao pagamento da dívida.
Através da execução trabalhista, busca-se conferir ao obreiro o pagamento das verbas inadimplidas pelo empregador. Devem, pois, ser adotados todos os mecanismos capazes de conferir celeridade à satisfação do julgado, principalmente se tais créditos são de natureza alimentar.
O estabelecido neste dispositivo legal, além de caminhar na direção de dar maior efetividade ao processo, é compatível com o processo do trabalho e preenche uma lacuna normativa. Não contraria a lógica da Consolidação das Leis do Trabalho, mormente dos artigos 876 a 892, o fato de que o juiz, de ofício ou a requerimento do credor, intime o devedor a pagar a quantia devida, no prazo assinalado, sob pena de sofrer, a condenação, um acréscimo de 10% (dez por cento).
Entendimento este em consonância com recente julgado da 1ª Turma do TST:
MULTA DO ART. 475-J DO CPC - APLICAÇÃO AO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - OMISSÃO LEGISLATIVA E COMPATIBILIDADE COM AS NORMAS TRABALHISTAS. Aplica-se ao Direito Processual Trabalhista, por força da autorização prevista no art. 769 da CLT, o comando do art. 475-J do CPC, que estabelece multa no percentual de 10% caso o devedor condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação não o efetue espontaneamente. A falta de previsão legal específica de penalidade por descumprimento espontâneo do título executivo judicial autoriza a incidência do art. 475-J do CPC nesta seara, pois não houve silêncio eloquente do legislador ordinário, de modo a concluir pela existência de regulação exaustiva da matéria pela legislação trabalhista e de inaplicabilidade desse preceito legal, nos termos do art. 769 da CLT. A norma prevista no art. 475-J do CPC amolda-se, perfeitamente, ao processo do trabalho. Agravo de instrumento desprovido. (TST. AIRR - 112340-15.2007.5.21.0006 Data de Julgamento: 10/03/2010, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 19/03/2010).
Não cumprindo espontaneamente a decisão, e depois de intimado na forma acima mencionada, não vejo óbice a que se aplique essa regra do processo civil.
Mantenho a aplicação da multa do art. 475-J do CPC.
O recurso não prospera.
Sustenta a reclamada, em suas razões de recurso de revista, que a multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil não é aplicável ao processo do trabalho, porquanto há procedimento específico para a fase executiva. Esgrime com ofensa aos artigos 2º e 5º, LIV, da Constituição da República, 876 a 892 da Consolidação das Leis do Trabalho e transcreve arestos para cotejo de teses.
O segundo aresto transcrito às fls. 651/652 autoriza o conhecimento da presente revista, porquanto perfilha tese diversa da esposada na decisão de origem, no sentido de que a multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil não se aplica ao processo do trabalho.
Ante do exposto, conheço do recurso de revista por divergência jurisprudencial.
HORAS EXTRAS. ÔNUS DA PROVA.
O Tribunal Regional manteve a condenação ao pagamento de horas extraordinárias. Valeu-se, na ocasião, dos seguintes fundamentos, aduzidos às fls. 617/618:
2.1 - Horas extras por tempo à disposição da empresa (revista)
O recorrente insiste na negativa de labor em sobrejornada, aduzindo que à luz do art. 818 da CLT, o reclamante não conseguiu provar a prorrogação da jornada de trabalho, razão porque referida parcela deve ser excluída da condenação.
Não lhe assiste razão.
O reclamante pleiteou na inicial o pagamento de uma hora extra por dia, pelo tempo que permanecia à disposição do empregador para realização de revista de bolsas e sacolas. Em depoimento disse: passava cerca de 01 aguardando a revista de todos os empregados que trabalhavam na empresa; (...); que a revista durava quatro minutos por pessoa; (...)
O preposto afirmou (...) que a revista de todos os empregados durava no máximo 15 minutos; que a revista consistia numa inspeção visual e em pesagem manual; (...)
A única testemunha ouvida, corroborou a alegação autoral, confira-se: (...); que a revista de todos os trabalhadores durava cerca de uma hora. (fls. 340/341).
A r. sentença (fls. 345/346) com base na prova documental, bem como na prova testemunhal, reconheceu que o tempo gasto na revista, é considerado tempo à disposição da empresa, porque do interesse desta. Consequentemente, do mesmo modo, ou seja, com base nas provas dos autos, deferiu uma hora extra, com o percentual legal de 50%, com as repercussões nos títulos indicados na inicial.
Nos termos do art. 818 da CLT c/c 331 cabia à reclamada apresentar provas que desconstituíssem as alegações autorais (art. 818, da CLT c/c art. 333 do CPC). Não tendo a recorrente se desincumbindo desse ônus. E tendo a única testemunha ouvida confirmado o tempo de revista declinado pelo autor, mostra-se correta a decisão que deferiu o pagamento das horas extras, com as repercussões devidas, conforme reconhecido pelo decisum a quo.
O recurso não prospera no particular.
Sustenta a reclamada, em suas razões de recurso de revista, que o reclamante não se desincumbira do ônus de comprovar o labor em jornada extraordinária. Alega que a -a jornada descrita nos cartões de ponto é a hora real de labor, confirmada pela testemunha e pelo autor- (fl. 635). Esgrimiu com afronta aos artigos 5º, LIV e LV, da Constituição da República, 818 da Consolidação das Leis do Trabalho e 333, I, do Código de Processo Civil, além de transcrever arestos com o objetivo de demonstrar o dissenso de teses.
Sem razão a reclamada.
Tendo em vista os princípios da aquisição processual e da livre apreciação das provas, conclui-se que as partes as produzem para o processo, cabendo ao juiz avaliá-las e daí extrair as consequências que entender pertinentes, nos termos do artigo 131 do Código de Processo Civil. A prova é composta de pelo menos dois elementos, o meio e a informação, que devem mostrar-se idôneos para o deferimento do pedido a que correspondem. Na hipótese, o Tribunal Regional, com base nos elementos de prova, notadamente a prova testemunhal e documental juntada aos autos, apurou a existência de horas a disposição da reclamada e não pagas ao reclamante.
Assim, o debate sobre a valoração da prova efetivamente produzida - ônus objetivo da prova - não se insere no contexto das violações das regras processuais pertinentes ao ônus subjetivo da prova, tendendo à interpretação ou à reavaliação do conjunto probatório dos autos - o que, induvidosamente, não rende ensejo ao recurso de revista, em face de sua natureza extraordinária. Incumbe soberanamente às instâncias ordinárias o exame da prova trazida aos autos, conforme, aliás, já assentou esta Corte superior na Súmula n.º 126, cuja incidência inviabiliza a aferição do alegado dissenso jurisprudencial.
Afigura-se, dessa forma, inócua a discussão acerca do ônus da prova, que só assume relevância quando inexistem elementos probatórios suficientes ao deslinde da controvérsia trazida a juízo. Não se cuida, na hipótese dos autos, de debate sobre a correta distribuição do ônus da prova, mas do mero reexame da prova efetivamente produzida. Não há falar, portanto, em violação dos artigos 818 da Consolidação das Leis do Trabalho e 333, I, do Código de Processo Civil.
O artigo 5º, LIV e LV, da Constituição da República, por derradeiro, não incide de forma direta na hipótese dos autos, que se exaure na exegese da legislação processual. Inviável, daí, o conhecimento do recurso de revista pelo permissivo da alínea c do artigo 896 consolidado.
Com esses fundamentos, não conheço do recurso de revista.
HORAS IN ITINERE.
O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário patronal, mantendo a condenação da reclamada ao pagamento de horas de percurso, adotando para tanto, os seguintes fundamentos, consignados às fls. 618/620:
2.2. - Horas in itinere
A recorrente insiste que o reclamante não faz jus ao pagamento das horas in itinere, uma vez que há previsão em norma coletiva, mais especificamente em sua cláusula sétima, que trata do transporte, no sentido de que o tempo dispendido no percurso não será remunerado como hora in itinere tampouco será considerado como à disposição da empresa, considerando a existência de transporte público regular.
Não lhe assiste razão, mais uma vez
A Constituição Federal passou a valorizar os ajustes realizados através de acordos e convenções coletivas (art. 7º, XXVI), contudo, pelo princípio da adequação setorial negociada as normas coletivas para incidirem sobre o grupo a que se destina precisa ou implementar um padrão superior ao estabelecido na norma geral ou transacionar sobre parcelas ditas de indisponibilidade apenas relativa.
Sobre o tema deve ser dito que o legislador, ao conferir prestígio às convenções e acordos coletivos, estabeleceu a possibilidade de o negociado poder superar o legislado, ou, ainda, no sentido de que essa disponibilidade de direitos deverá ser transacionada, levando-se em consideração os interesses da categoria profissional como um todo, em detrimento de qualquer interesse particular, devendo ser assegurado um patamar mínimo de direitos que já foram estabelecidos em norma cogente.
Isso significa que a norma coletiva não pode prevalecer quando concretizada através de ato de renúncia sem qualquer transação, sendo nulo o ato dirigido a esse despojamento.
Nesse sentido, decisão do TRT da 6ª Região:
Das horas in itinere. Acordo Coletivo. Renúncia de direitos. A cláusula sexta do Acordo coletivo trazido aos autos configura-se em evidente renúncia de direitos pelos obreiros, ao negar qualquer direito aos trabalhadores ao tempo de percurso, desde que não levou em consideração qualquer limite do tempo em que o trabalhador estaria sendo transportado, em função da distância da localidade em que foi apanhado e para onde seria levado nas diferentes frentes de trabalho, ou mesmo no tempo em que o obreiro teria que "esperar" aguardando o transporte, tanto na ida quanto no retorno, uma vez que é de conhecimento público que os engenhos da empresa estão situados em área rural com estradas vicinais de barro, que estão mais sujeitas às intempéries, podendo tornar-se intransitáveis de um dia para outro. Recurso Ordinário a que se dá parcial provimento. (RO 1181-2003-181-06-00-2 - TRT 6ª - 3ª t. - Juíza Zeneide Gomes da Costa - DOE/PE 24/06/2004).
Registre-se que o c. TST, através da Súmula 90, dispõe sobre as regras a serem observadas para a concessão das horas in itinere:
Súmula n.º 90 HORAS "IN ITINERE". TEMPO DE SERVIÇO.
I - O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho.
II - A incompatibilidade entre os horários de início e término da jornada do empregado e os do transporte público regular é circunstância que também gera o direito às horas "in itinere".
III - A mera insuficiência de transporte público não enseja o pagamento de horas "in itinere".
IV - Se houver transporte público regular em parte do trajeto percorrido em condução da empresa, as horas "in itinere" remuneradas limitam-se ao trecho não alcançado pelo transporte público.
V - Considerando que as horas "in itinere" são computáveis na jornada de trabalho, o tempo que extrapola a jornada legal é considerado como extraordinário e sobre ele deve incidir o adicional respectivo.
É inconteste que o local de trabalho não é servido por transporte regular público, e que a empresa fornece condução, conforme bem fundamentou a decisão a quo (fl. 344).
Assim, sendo o local de trabalho (Fazenda) de difícil acesso, localizado em sítio rural e que o transporte era fornecido pelo empregador, todas essas situações constituem requisitos enumerados na súmula para o recebimento da hora de percurso, o que impõe-se a manutenção da sentença, no particular.
Sustenta a reclamada, em seu recurso de revista, ser indevido o pagamento das horas in intinere, porquanto há previsão na convenção coletiva que isenta a empresa dessa obrigação, sendo que o obreiro em momento algum -apontou qualquer vício de validade daquela norma- (fl. 637). Argumentou que o reclamante não fez prova -de que não existia transporte público regular que lhe ofertasse o seu deslocamento de sua residência ao local de trabalho, fato suficiente para o indeferimento de horas in itinere- (fl. 637). Esgrimiu com afronta aos artigos 7º, XXVI, da Constituição da República e 58, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho. Transcreveu arestos para o confronto de teses.
Sem razão a agravante.
Verifica-se, que, não obstante o reconhecimento das normas coletivas albergado na Constituição da República, é inadmissível a flexibilização que resulte em supressão de direitos trabalhistas protegidos por normas de caráter cogente.
O pagamento de horas de percurso está assegurado pelo artigo 58, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que constitui norma de ordem pública, sendo o direito do obreiro, portanto, indisponível, ao contrário do que sustentado pela reclamada. A supressão de tal pagamento por meio de norma coletiva afronta diretamente o referido preceito e, portanto, não tem suporte nos artigos apontados pela reclamada.
Não se divisa, assim, ofensa ao artigo 7º, XXVI, da Constituição da República, porquanto não podem as partes transacionar direitos trabalhistas protegidos por norma de ordem pública.
Observem-se, nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte superior:
III) HORAS IN ITINERE. SUPRESSÃO POR MEIO DE ACORDO COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. O direito às horas in itinere, após o advento da Lei n.º 10.243/2001, encontra-se devidamente resguardado por norma de ordem pública e cogente, razão pela qual não pode vir a ser suprimido, seja por acordo individual, seja por acordo ou convenção coletiva. Ressalte-se que o referido entendimento encontra-se em consonância com a interpretação sistemática do art. 7.º, XXVI, da Constituição Federal com as demais normas que regem a questão, pois, embora o referido dispositivo arrole, entre os direitos do trabalhador, a necessidade de reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho, por certo tal direito não se volta contra o próprio trabalhador, no que se refere à verificação acerca do tempo em que se considera que esteve à disposição do empregador, tendo em vista, primeiramente, a avaliação perpetrada pela jurisprudência com base na análise dos termos do art. 4.º da CLT e posteriormente os expressos termos legais adotados pela Lei n.º 10.243/2001. Dessa feita, verifica-se que se mostra correto o entendimento da Turma, de que a norma coletiva que previa a supressão do direito às horas in itinere era inválida. Recurso de Embargos conhecido e desprovido (TST-E-RR-218200-63.2006.5.15.0052, SBDI-I, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, DEJT - 19/03/2010).
EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.496/2007. HORAS IN ITINERE. NORMA COLETIVA QUE PREVÊ A SUPRESSÃO DO DIREITO. INVALIDADE. PRINCÍPIO DA VALORIZAÇÃO SOCIAL DO TRABALHO. O pacto coletivo, também garantido pela Lei Maior, não empresta validade, por si só, à supressão ou diminuição de direitos trabalhistas indisponíveis. A flexibilização das condições de trabalho, em princípio possível em matéria de jornada de trabalho, não pode se sobrepor ao princípio da valorização social do trabalho (artigo 1º, IV, da CF). Nesse contexto, inviável o reconhecimento de norma coletiva que retira direitos mínimos do empregado. Acrescente-se, por fim, que o artigo 58 da CLT foi alterado pela Lei Complementar 123/2006, sendo acrescentado o § 3º, que passou a admitir a flexibilização de horas in itinere para empresas de pequeno porte e microempresas, e em situações fixadas na própria Lei, mas não autorizou a supressão do direito definido no parágrafo anterior. Recurso de embargos conhecido e desprovido (TST-E-RR-2354/2005-562-09-00, SBDI-I, Rel. Min. Horácio Raymundo de Senna Pires, DEJT - 27/11/2009).
HORAS IN ITINERE. SUPRESSÃO POR NORMA COLETIVA DE TRABALHO. INVALIDADE. A partir da inserção do § 2o ao art. 58 da CLT pela Lei 10.243, de 19 de junho de 2001, as horas in itinere foram alçadas ao patamar de norma de ordem pública, constituindo, pois, garantia mínima assegurada ao empregado. Como consequência, torna-se impossível a sua supressão por meio de negociação coletiva. Incide o óbice da Súmula 333 desta Corte e o art. 896, § 4o, da CLT. Recurso de Revista de que não se conhece (RR-2.198/2006-052-15-00.7, Rel. Min. João Batista Brito Pereira, DJ de 27/3/2009).
HORAS IN ITINERE - SUPRESSÃO POR NORMA COLETIVA - IMPOSSIBILIDADE. 1. A partir das alterações imprimidas ao artigo 58 da CLT pela Lei n.º 10.243/2001, as horas in itinere passaram a gozar do status de norma de ordem pública. Portanto, não podem ser objeto de supressão mediante negociação coletiva. Precedentes. 2. Na hipótese, tanto a norma coletiva, como o contrato de trabalho do Autor tiveram vigência após a entrada em vigor da Lei n.º 10.243/2001, sendo imperativo o reconhecimento da invalidade da disposição coletiva. (TST-E-RR-212600-61.2006.5.15.0052, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, SBDI-1, DEJT 3/10/2008).
Resulta inafastável, portanto, o trancamento do apelo, ante a constatação de que o recurso de revista veicula tema a cujo respeito o Tribunal Superior do Trabalho já exerceu sua função uniformizadora em termos contrários à pretensão recursal. Não há cogitar, assim, em afronta aos dispositivos legais e constitucionais invocados.
Por outro lado, tem-se que somente com alteração da moldura fática delineada nos autos é que se poderia modificar a decisão proferida pelo Tribunal Regional. Com efeito, consignou-se no acórdão que é -inconteste que o local de trabalho não é servido de transporte regular público,e que a empresa fornece condução, conforme bem fundamentou a decisão a quo-, assentando que, -sendo o local de trabalho (Fazenda) de difícil acesso, localizado em sítio rural e que o transporte era fornecido pelo empregador, todas essas situações constituem requisitos enumerados na súmula [n.º 90 do TST] para o recebimento da hora de percurso, o que impõe-se a manutenção da sentença, no particular- (fl. 620). Concluir diversamente do que foi decidido implica necessariamente o reexame de fatos e provas, procedimento inadmissível em sede de julgamento de recurso de revista, incidindo, na espécie, a Súmula n.º 126 do Tribunal Superior do Trabalho.
Com esses fundamentos, não conheço do recurso de revista.
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.
A Corte de origem, quanto ao tema em epígrafe, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela reclamada, assentando, para tanto, os seguintes fundamentos, declinados às fls. 621/622:
2.3 Adicional de Insalubridade
O reclamante na inicial pleiteia adicional de insalubridade, argumentando que no exercício de suas funções, laborava em locais alagados e encharcados, sem a devida utilização de equipamento de proteção individual. A reclamada nega a existência de insalubridade e sustenta a utilização dos EPIs adequados. Realizada a perícia, esta sofreu impugnação, (fls. 332-338).
A reclamada pretende a reforma da sentença a quo, sob o argumento de que o Juízo de piso ao deferir o pedido de adicional de insalubridade, interpretou de forma equivocada o laudo pericial, uma vez que pelo próprio laudo, restou devidamente comprovado que o recorrido desenvolvia suas atividades nos viveiros, sem qualquer risco específico.
Sustenta que sempre forneceu os equipamentos de proteção individual (EPIs), dentro dos parâmetros e critérios estabelecidos nas normas de segurança e higiene do trabalho do Ministério do Trabalho, além de realizar treinamentos de segurança, onde são ministradas palestras sobre segurança e saúde do trabalho. Pede provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido de insalubridade.
Não lhe assiste razão.
O referido laudo foi confeccionado a partir da análise in loco, onde foi realizada uma avaliação da qualidade do ambiente, bem como da quantidade de agentes nocivos à saúde do trabalhador.
A sentença de origem, com base nas provas constantes nos autos, inclusive, a prova técnica pericial (fls. 326-330), cujo laudo, foi esclarecedor de modo a auxiliar no convencimento do Juízo, concluiu que o reclamante laborou em condições de insalubridade, consequentemente, deferiu o pleito de adicional em grau médio, com os respectivos reflexos.
É bem verdade que nos exatos termos do art. 436 do CPC, de aplicação subsidiária (art. 769 da CLT), o Juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos, desde que estes estejam provados nos autos.
In casu, a recorrente não trouxe elementos ou provas aptas a desconstituir o decisum de primeiro grau, o que impõe-se a manutenção da sentença pelos próprios fundamentos.
Sustenta a reclamada, em suas razões do recurso de revista, que é indevido o adicional de insalubridade, pois inexiste risco na atividade desempenhada pelo obreiro. Alega que ficou comprovado que o reclamante recebia as devidas orientações sobre a função, além de fazer uso dos Equipamentos de Proteção Individual - EPI's. Assevera, ainda, que -cumpriu efetivamente todas as normas de segurança e higiene do trabalho, dando cumprimento a todos os Planos de Segurança e Saúde do Trabalho- (fl. 659). Argumenta, ao final, que o laudo pericial não especifica o tempo de exposição do reclamante ao agente insalubre, mas apenas atem-se -a um determinado momento de trabalho, quando em uma inspeção oficial, diligência ou perícia é necessário analisar todo o ciclo de trabalho ocorrido- (fl. 659). Esgrime com violação dos artigos 5º, LIV e LV, da Constituição da República, e 193 da Consolidação das Leis do Trabalho e com contrariedade à Súmula n.º 80 do Tribunal Superior do Trabalho. Transcreve arestos a fim de demonstrar o dissenso jurisprudencial.
Tem-se, todavia, que somente com a alteração da moldura fática delineada nos autos é que se poderia pretender modificar a decisão proferida pelo Tribunal Regional. O fato de ter a Corte de origem registrado, com base nas provas produzidas, notadamente a pericial, que o reclamante ativava-se em condições insalubres, impede alcançar-se conclusão diversa da esposada pelo Tribunal. Nesse sentido, consignou a Corte de origem que -a sentença de origem, com base nas provas constantes dos autos, inclusive, a prova técnica pericial (fls. 326-330), cujo laudo foi esclarecedor de modo a auxiliar no convencimento do Juízo, concluiu que o reclamante laborou em condições de insalubridade, consequentemente, deferiu o pleito do adicional em grau médio, com os respectivos reflexos- (fl. 621), assentando que -in casu, a recorrente não trouxe elementos ou provas aptas a desconstituir o decisum de primeiro grau, o que impõe-se a manutenção da sentença pelos próprios fundamentos- (fl. 621).
Conclui-se, assim, que o julgado teve por base os elementos de convicção constantes dos autos, em estrita consonância com as regras consubstanciadas no artigo 131 do Código de Processo Civil. O recurso investe, portanto, contra pressuposto fático consagrado no acórdão prolatado pelo Tribunal Regional, razão por que enfrenta o óbice da Súmula n.º 126 do Tribunal Superior do Trabalho. Nesse contexto, não há como vislumbrar maltrato aos mencionados dispositivos legais e constitucionais, tampouco divergência jurisprudencial.
Não houve discussão nos autos a respeito do fornecimento e uso dos equipamentos de proteção individual, não se reconhecendo, dessa forma, contrariedade à Súmula n.º 80 desta Corte superior, à míngua do indispensável prequestionamento. Hipótese de incidência da Súmula n.º 297 do Tribunal Superior do Trabalho.
Ante o exposto, não conheço do recurso de revista.
II - MÉRITO
MULTA PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO AO PROCESSO DO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE.
Cinge-se a controvérsia a determinar se o artigo 475-J do Código de Processo Civil é aplicável ao processo do trabalho, em face da previsão específica da Consolidação das Leis do Trabalho quanto à execução.
A Consolidação das Leis do Trabalho traz regramento específico quanto à execução no âmbito da Justiça do Trabalho. Dispõe a Consolidação, nos artigos 876 a 892, sobre a forma como se processará a execução nesta Justiça especializada, estabelecendo que o executado será citado para o cumprimento da decisão ou acordo, no modo e sob as cominações estabelecidas, ou para o pagamento, quando se tratar de condenação em dinheiro, da quantia devida no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de penhora (art. 880).
A disposição do artigo 475-J do Código de Processo Civil, por outro lado, traz regramento específico para o âmbito de sua aplicação, dispondo que o devedor deverá ser intimado para o cumprimento da sentença no prazo de quinze dias sob pena de acréscimo de dez por cento ao montante da condenação a título de multa.
Entende a douta maioria dos integrantes desta Corte superior que os dispositivos em comparação estão a disciplinar procedimentos diferentes para a execução. De acordo com o artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, as disposições do Código de Processo Civil somente poderão ser aplicadas no âmbito trabalhista nos casos omissos, o que, evidentemente, não se enquadra na presente hipótese, em que há regramento específico.
Diante disso, a determinação da Corte de origem, no sentido da aplicação do regramento civil na execução trabalhista, em detrimento das normas próprias e específicas da Consolidação das Leis do Trabalho, afronta o artigo 769 da referida Consolidação.
Nesse sentido, orientaram-se os seguintes precedentes deste colendo Tribunal Superior do Trabalho: RR-173640-62.1997.5.03.0027, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, 2ª Turma, DJU de 4/9/2009; RR-92600-33.2006.5.13.0005, Rel. Min. Rosa Maria Weber, 3ª Turma, DJU de 18/12/2009; RR-151100-30.2005.5.15.0116, Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen, 4ª Turma, DJU de 4/12/2009; RR-45740-43.2007.5.13.0003, Rel. Min. Kátia Magalhães Arruda, 5ª Turma, DJU de 18/12/2009; RR-117900-64.2007.5.09.0072, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, DJU de 26/6/2009; e RR-52400-50.2008.5.13.0025, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, DJU de 18/12/2009.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso de revista para declarar a inaplicabilidade do artigo 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista apenas quanto ao tema relativo à aplicação multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento para declarar a inaplicabilidade do artigo 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho.
Brasília, 14 de dezembro de 2011.
Hugo Carlos Scheuermann
Desembargador Convocado Relator
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