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Negado pedido de resposta do deputado Vicentinho na revista VEJA

A 5ª turma Cível do TJ/DF deu provimento a recurso da Editora Abril e afastou condenação que obrigava a revista Veja a publicar resposta do deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho. O deputado ingressou com ação indenizatória e pedido de direito de resposta por conta de matéria jornalística intitulada "Terror e Poder - Com base em reportagem de VEJA, deputados abrem investigação sobre atividades de extremistas islâmicos no Brasil", da edição 2.212 da revista VEJA, de 13/04/11, alegando que o conteúdo da matéria o associa a atos de terrorismo.

11/10/2011



Imprensa

Negado pedido de publicação de resposta do deputado Vicentinho na revista VEJA

A 5ª turma Cível do TJ/DF deu provimento a recurso da Editora Abril e afastou condenação que obrigava a revista Veja a publicar resposta do deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho. O deputado ingressou com ação indenizatória e pedido de direito de resposta por conta de matéria jornalística intitulada "Terror e Poder - Com base em reportagem de VEJA, deputados abrem investigação sobre atividades de extremistas islâmicos no Brasil", da edição 2.212 da revista VEJA, de 13/04/11, alegando que o conteúdo da matéria o associa a atos de terrorismo.

Em antecipação de tutela, o juiz de Direito Enilton Alves Fernandes, da 13ª vara Cível de Brasília/DF, determinou a publicação do texto de resposta na edição imediatamente seguinte da revista VEJA, sob pena de multa diária de R$ 2 mil.

A Editora Abril interpôs AI, provido por unanimidade pela 5ª turma Cível. O desembargador Angelo Passareli, relator, considerou a liberdade de imprensa um sobredireito e, em consagração à amplitude do direito-dever de informar dos veículos de comunicação, invocou em sua decisão trechos da ADPF 130 (clique aqui), que retirou do ordenamento jurídico pátrio a antiga lei de Imprensa.

Consideraram a irreversibilidade da medida imposta, concluindo que "mantida a decisão de primeiro grau e publicado informe na próxima edição de VEJA, a título de direito de resposta do Agravado, tal provimento será irreversível, ainda que decretada a improcedência dos pedidos iniciais por meio de sentença e a publicação desta em momento posterior não terá o condão de aniquilar os efeitos deletérios da eventual publicação do direito de reposta sem que tenha se esgotado o devido processo legal".

A defesa da Editora Abril foi patrocinada pelas advogadas Juliana Akel e Cláudia Pinheiro David, do escritório Lourival J. Santos Advogados.

Veja abaixo a decisão.

___________

Órgão 5ª Turma Cível

Processo N. Agravo de Instrumento, Agravo Regimental no(a) Agravo de Instrumento 20110020172422AGI

Agravante(s) EDITORA ABRIL S/A E OUTROS

Agravado(s) VICENTE PAULO DA SILVA E OUTROS

Relator Desembargador ANGELO PASSARELI

Acórdão Nº 539.967

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGR CONTRA DECISÃO QUE DEFERIU PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. NÃO-CABIMENTO. LIBERDADE IMPRENSA. DIREITOS DA PERSONALIDADE. PUBLICAÇÃO EM SEMANÁRIO DE CIRCULAÇÃO NACIONAL. OFENSA. DIREITO DE RESPOSTA EM SEDE DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. DECISÃO REFORMADA.

1 – Não cabe Agravo Regimental de decisão que deferiu o pedido de efeito suspensivo a Agravo de Instrumento, haja vista a inexistência de previsão legal, pois, a teor do que prescreve o parágrafo único do artigo 527 do Código de Processo Civil, “A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar”.

2 - Nos termos do voto do Ministro Relator, Carlos Britto, exarado na ADPF nº 130/DF, “as relações de imprensa e as relações de intimidade, vida privada, imagem e honra são de mútua excludência, no sentido de que as primeiras se antecipam, no tempo, às segundas; ou seja, antes de tudo prevalecem as relações de imprensa como superiores bens jurídicos e natural forma de controle social sobre o poder do Estado, sobrevindo as demais relações como eventual responsabilização ou conseqüência do pleno gozo das primeiras.”.

3 – Não é razoável, em sede de antecipação dos efeitos da tutela, determinar que a editora de semanário de circulação nacional publique texto do suposto ofendido, a título de direito de resposta, se nem sequer foi constatada a existência de ofensa injusta à honra e imagem do postulante, o que somente poderá ser verificado durante o trâmite processual regular, assegurados o contraditório e a ampla defesa.

4 - A irreversibilidade da medida desautoriza a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do art. 273, § 2º, do CPC. Precedentes.

Agravo Regimental não conhecido.

Agravo de Instrumento provido.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ANGELO PASSARELI - Relator, JOÃO EGMONT - Vogal, LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ANGELO PASSARELI, em proferir a seguinte decisão: NÃO SE CONHECER DO AGRAVO REGIMENTAL. CONHECER DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DAR PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 5 de outubro de 2011

Certificado nº: 44 36 5B 26

05/10/2011 - 19:43

Desembargador ANGELO PASSARELI

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por EDITORA ABRIL S/A, contra a r. decisão encontrada por cópia às fls. 100/101, proferida pelo MM Juiz de Direito da Décima Terceira Vara Cível, nos autos da Ação de Indenização, Feito nº 2011.01.1.112467-9, a qual lhe moveu VICENTE PAULO DA SILVA, ora Agravado.

A decisão objurgada foi lavrada nos seguintes termos, in verbis:

“Recebo a emenda.

Os requisitos para a antecipação dos efeitos da tutela estão expressos no art. 273 do CPC: prova inequívoca, verossimilhança da alegação e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

No caso em tela, entendo presentes tais requisitos.

A ‘prova inequívoca’ - suficiente para o juízo de cognição sumária, próprio da presente fase processual -, bem como a verossimilhança das alegações do autor, encontram arrimo nos documentos apresentados com a peça de ingresso. Com efeito, consta nos autos a matéria reputada ofensiva, extraída da página da revista Veja na internet, na qual não consta tenha a manifestação do requerente quanto aos fatos alegados, sendo certo que a ética no jornalismo recomenda que se dê publicidade à versão das partes envolvidas (artigos 9.º, 10 e 12 do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, acessado no sítio eletrônico da Associação Brasileira de Imprensa, nesta data: https://www.abi.org.br/paginaindividual.asp?id=450).

Há, ainda, nos documentos aportados pelo requerente, comentários dos leitores, postados no site da Revista Veja (fls. 31/61), denotando a repercussão negativa da matéria em sua imagem.

O decurso do tempo entre a publicação da matéria supostamente ofensiva e a resposta do ofendido, caso esta fique reservada ao trânsito em julgado de eventual decisão condenatória, conduz ao fundado receio de dano de difícil reparação. Isso porque a versão dos fatos das pessoas citadas na matéria deve ser assegurada de preferência no próprio texto ou, não sendo possível, tão próximo quanto possível da divulgação dos acontecimentos noticiados. Desse modo, não apenas se preserva a imagem daqueles, mas também se assegura a plenitude do direito à informação.

Acrescenta-se que não há perigo de irreversibilidade do provimento antecipado (requisito negativo estatuído pelo art. 273, § 2.º, do CPC). Vindo a ser julgado improcedente o pedido do autor, conquanto não se possa apagar o que já restou publicado, o requerente poderá arcar com os custos do texto que fizer publicar, bem como poderá a requerida dar igual publicidade à sentença de improcedência.

Em vista do exposto, DEFIRO o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar à requerida que conceda ao autor o direito de resposta à matéria intitulada ‘Terror e Poder’, publicada em 11/4/2011. A resposta deve ser publicada na edição da Revista Veja imediatamente seguinte à intimação da ré, com o igual destaque concedido àquela matéria, na mesma seção, com fonte idêntica, devendo o requerente limitar-se a fazer afirmações objetivas, vedando-se a emissão de opiniões depreciativas ou acusações ao requerido. Para o caso de descumprimento da obrigação, fixo pena de multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Publique-se. Cite-se. Intimem-se.

Brasília - DF, segunda-feira, 22/08/2011 às 11h33.”

Narra a Agravante que o Agravado lhe moveu Ação de Indenização em virtude da publicação de reportagem intitulada “Terror e Poder – Com base em reportagem de VEJA, deputados abrem investigação sobre atividades de extremistas islâmicos no Brasil”, na edição nº 2212 da Revista VEJA (13/05/2011), na qual foi noticiada a história do tunisiano Manar Skandrani, que é acusado de ser ligado a extremistas próximos a Osama Bin Laden, e a sua amizade com o Deputado Federal Vicentinho, ora Agravado.

Afirma que a matéria absteve-se de imputar qualquer acusação ao Agravado, relatando apenas a sua amizade com o tunisiano Manar Skandrani, tendo publicado, até mesmo, a opinião do Agravado sobre as acusações que existem contra seu amigo.

Obtempera que, por ser o Agravado pessoa pública, Deputado Federal, tinha não só o direito, mas o dever de informar à sociedade os laços de amizade existentes entre o agente público e o tunisiano monitorado pela INTERPOL, com fundamento no art. 5º, IV, IX, XIV e art. 220, ambos da Constituição Federal.

Diz que o próprio Agravado confirmou os fatos narrados na reportagem e que, mesmo sem ter a obrigação de fazê-lo, o jornalista Leonardo Coutinho, entrou em contato com o Agravado previamente à publicação da reportagem para ouvir a sua versão dos fatos, a qual afirma que coincide com o que foi publicado.

Sustenta a irreversibilidade da medida antecipatória dos efeitos da tutela, pois, caso julgada improcedente a ação originária, as partes não poderão retornar ao status quo ante.

Alega a impossibilidade material de cumprimento do provimento exarado na decisão do MM Juiz a quo, pois o Agravado ainda não apresentou o texto da resposta.

Assevera que para que o direito de resposta seja exercido é necessário que haja agravo e que aquele seja proporcional a este.

Requer a concessão do efeito suspensivo, para reformar a decisão agravada, afastando por completo a decisão que concedeu a antecipação dos efeitos da tutela e, no mérito, a confirmação da medida eventualmente deferida.

Preparo regular (fl. 158).

De acordo com a decisão de fls. 162/169, o efeito suspensivo vindicado foi deferido.

O MM Juiz prestou informações à fl. 175, noticiando o cumprimento do estatuído no art. 526 do CPC pela Agravante.

O Agravado interpôs Agravo Regimental às fls. 176/214, postulando a reforma da decisão que concedeu o efeito suspensivo em favor da parte Agravante.

Contrarrazões às fls. 216/260.

O Agravado sustenta, em síntese, que já está suportando lesão grave e de difícil reparação, pois está sendo rechaçado em razão da matéria que o vincula ao terrorismo internacional, e que postula não a censura do editorial, mas apenas a realização de justiça, devido ao efeito devastador que a reportagem causou em sua vida pessoal.

Transcreve a reportagem que reputou lesiva a sua imagem.

Requer o desprovimento do Agravo de Instrumento.

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador ANGELO PASSARELI - Relator

Inicialmente, não conheço do Agravo Regimental interposto pelo Agravado às fls. 176/214, por ausência de previsão legal, haja vista a inexistência de previsão legal para tanto, pois, a teor do que prescreve o parágrafo único do artigo 527 do Código de Processo Civil, “A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar.”.

Esse é o entendimento deste eg. Tribunal de Justiça, in verbis:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDEFERIMENTO DE EFEITO SUSPENSIVO. AGRAVO REGIMENTAL. NÃO CABIMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. LOCALIZAÇÃO DE BENS INFRUTÍFERA PELO CREDOR. QUEBRA DE SIGILO FISCAL DO DEVEDOR. POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA.

- A Lei n. 11.187, de 19.10.2005, afastou a possibilidade de interposição de agravo regimental das decisões liminares proferidas pelo relator, ao preconizar, no novo parágrafo único do art. 527 do CPC: ‘a decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar’.

- Constatando-se a inviabilidade da localização de bens do devedor de alimentos pela via extrajudicial, cabível, como medida excepcional, a quebra de sigilo fiscal do executado, para a garantia da prestação jurisdicional eficaz e tempestiva, na forma como estabelecida pelo inciso XII do art. 5º da Constituição Federal.

- Agravo regimental não conhecido. Agravo de Instrumento improvido. Unânime.”
(20090020100406AGI, Relator OTÁVIO AUGUSTO, 6ª Turma Cível, julgado em 09/09/2009, DJ 23/09/2009 p. 134)

“AGRAVO REGIMENTAL E AGRAVO DE INSTRUMENTO. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. DECISÃO IRRECORRÍVEL. CONTA POUPANÇA MANTIDA JUNTO AO BANCO BAMERINDUS DO BRASIL S/A. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SOB O REGIME DE LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL.

1. Não merece conhecimento agravo regimental interposto contra decisão de relator que defere ou indefere pedido de atribuição de efeito suspensivo ao agravo de instrumento. Reza o parágrafo único do art. 527 do CPC que a decisão liminar, proferida no caso do inciso III do citado preceptivo legal, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar.

2. Esta egrégia Corte de Justiça já decidiu que ‘O HSBC Bank Brasil S/A - Banco Múltiplo é parte legítima para figurar no pólo passivo das demandas que se destinam a recompor saldo de conta-poupança de aplicadores do Banco Bamerindus do Brasil S/A, em razão da compra dos ativos e assunção de direitos e obrigações deste’ (20070110457047APC, Relator OTÁVIO AUGUSTO, 6ª Turma Cível, julgado em 15/04/2009, DJ 29/04/2009, p. 101).

3. A relação jurídica controvertida submete-se às normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento jurisprudencial consolidado na súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça.

4. A inversão do ônus da prova ‘não é direito subjetivo do consumidor, mas uma possibilidade processual, condicionada à hipossuficiência ou à verossimilhança de suas alegações, apreciadas de acordo com o prudente arbítrio do Magistrado’ (20060110986993 APC, Relator HUMBERTO ADJUTO ULHÔA, 3ª Turma Cível, julgado em 06/02/2008, DJ 28/02/2008, p. 1825).” (20090020040266AGI, Relator WALDIR LEÔNCIO C. LOPES JÚNIOR, 2ª Turma Cível, julgado em 10/06/2009, DJ 05/10/2009 p. 93)

“AGRAVO REGIMENTAL MANEJADO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO - IMPOSSIBILIDADE - VEDAÇÃO LEGAL - RECURSO NÃO CONHECIDO.

Na nova dicção do artigo 527, Parágrafo único, do Código de Processo Civil, a decisão liminar proferida em sede de Agravo de Instrumento somente é passível de reforma no momento do julgamento do recurso, salvo se o Relator a reconsiderar.”
(20090020109031AGI, Relator LECIR MANOEL DA LUZ, 5ª Turma Cível, julgado em 02/09/2009, DJ 21/09/2009 p. 121)

Quanto ao Agravo de Instrumento, estando presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Pretende a Agravante, em síntese, reforma da decisão de Primeiro Grau que, nos autos da Ação de Indenização, Feito nº 2011.01.1.112467-9, na qual o MM Juiz assegurou ao Agravado o direito de resposta, relativamente à matéria intitulada “Terror e Poder – Com base em reportagem de VEJA, deputados abrem investigação sobre atividades de extremistas islâmicos no Brasil”, na revista VEJA, a ser publicada na próxima edição, sob pena de multa cominatória diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais), seja suspensa até o julgamento de mérito do presente Agravo.

Com efeito e conforme consignado na decisão que deferiu o efeito suspensivo ao presente Agravo, a Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67) foi declarada não recepcionada pela Constituição Federal no julgamento, pelo Excelso Pretório, da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 130/DF, em razão do reconhecimento da incompatibilidade material insuperável entre os diplomas legal e constitucional.

Para tanto, os votos majoritários acompanharam a posição encabeçada pelo Ministro Relator, que indicou serem os direitos que dão conteúdo à liberdade de imprensa bens da personalidade qualificados como “sobredireitos”, de modo que “no limite, as relações de imprensa e as relações de intimidade, vida privada, imagem e honra são de mútua excludência, no sentido de que as primeiras se antecipam, no tempo, às segundas; ou seja, antes de tudo prevalecem as relações de imprensa como superiores bens jurídicos e natural forma de controle social sobre o poder do Estado, sobrevindo as demais relações como eventual responsabilização ou conseqüência do pleno gozo das primeiras.” (excerto da ementa).

Assim, concluiu-se que “primeiramente assegura-se o gozo dos sobredireitos de personalidade em que se traduz a ‘livre’ e ‘plena’ manifestação do pensamento, da criação e da informação. Somente depois é que se passa a cobrar do titular de tais situações jurídicas ativas um eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios.” (excerto da ementa).

Fincadas em tais premissas estão, em síntese, as seguintes conclusões do voto do eminente Relator ADPF nº 130/DF: a imprensa é instância máxima de formação da opinião pública, para tanto, assiste-lhe o direito de expor os fatos que repute relevantes para a sociedade, em perfeita sintonia com as fontes nas quais buscou a informação, zelando pela legitimidade destas, não lhe sendo oponível, por si só, a versão oficial dos fatos, uma vez que é seu dever expô-los da maneira como entender pertinente para demonstrar o interesse, ideia ou consequência inseridos naquela, ainda que em desconformidade com a conclusão última dos agentes atingidos, porquanto é direito subjetivo da coletividade ser informada de forma multitudinária, para que cada cidadão possa exercer os direitos inerentes à cidadania de forma consciente, na medida em que a informação possui capacidade emancipadora, ressaltando-se o fato de que, aquele que se coloca como ator social de relevância, no exercício de função pública de destaque, está sob permanente vigília da sociedade e, portanto, da imprensa, atraindo contra si, pela aparência de ilegalidade ou ilegitimidade de seus atos, fortes suspeitas de comportamento antijurídico.

Ocorre que, embora o agente público, por exercer função dotada de relevância, operando a condução dos negócios do Estado, estar sob permanente vigília da sociedade e, dessa forma, da imprensa, que possui importante papel formador da consciência pública no Estado Democrático de Direito, para que haja a responsabilização civil por eventuais abusos ou excessos perpetrados sob o manto da liberdade de imprensa, deve haver a comprovação da ofensa injusta, o que somente poderá ser feito com o regular trâmite da Ação de Indenização em curso na Décima Terceira Vara Cível da Circunscrição Judiciária de Brasília.

Da mesma forma ocorre com o direito de resposta. Não é razoável, em sede de antecipação dos efeitos da tutela, determinar que a Editora Agravante publique texto do Agravado, a título de direito de resposta, em virtude da publicação da matéria “Terror e Poder – Com base em reportagem de VEJA, deputados abrem investigação sobre atividades de extremistas islâmicos no Brasil”, se nem sequer foi constatada a existência de ofensa injusta à honra e imagem do Agravado, o que somente poderá ser verificado durante o trâmite processual regular.

A despeito de o Agravado alegar em suas contrarrazões que já está sofrendo lesão de grave e difícil reparação e que a protraição do lapso temporal para a divulgação do direito de resposta irá lhe causar dano irreversível, ao contrário da Agravante, que poderá publicar, como editora, eventual sentença de improcedência, a constatação da ocorrência de eventual lesão a direito da personalidade o Agravado só poderá ser efetivamente constatada com o regular trâmite processual, mediante fase de instrução processual, se assim entender necessário o Magistrado de Primeiro Grau.

Isso porque, como dito linhas acima, na linha do entendimento esposado pelo colendo STF, na ADPF nº 130/DF, as relações de imprensa antecedem no tempo as relações de intimidade, diante da sua mútua exclusão, pois aquela funciona como forma de controle social do poder estatal. Assim, caso seja constatada ofensa a direitos da personalidade, à intimidade do Agravado em decorrência da malfadada reportagem, advirá o seu direito de responsabilização do agente ofensor.

Entendimento contrário implicaria a negação de tudo aquilo quanto foi exposto pelo Excelso Pretório na ADPF nº 130/DF, especialmente de que a liberdade de imprensa assegurada pela Constituição Federal é plena, essencial para formação da opinião dos cidadãos, principalmente em relação àqueles que lidam com a coisa pública, como uma espécie de mecanismo de controle social, e que os direitos da personalidade que dão conteúdo à liberdade de imprensa, quando no embate com direitos relativos à intimidade, precedem-nos, sobrevindo as demais relações surgidas do conflito no campo da responsabilização civil.

Não se está, aqui, a negar o direito de resposta, ou à responsabilização civil da Agravante, caso o Agravado faça jus.

Em que pese não mais haver regulação legal do direito de resposta, este não foi extirpado do ordenamento jurídico, visto que foi assegurado expressamente no art. 5º, V, da Constituição Federal, bem como no art. 14 do Pacto de São José da Costa Rica (Decreto nº 678/92), carecendo de regulamentação legal para que os indivíduos que porventura sentirem-se ofendidos ou tiverem dados inverídicos divulgados a seu respeito possam exercê-lo.

Na esteira da lição esposada pelo Ministro Carlos Britto na ADPF nº 130/DF, “o direito de resposta/retificação traduz, como sabemos, expressiva limitação externa, impregnada de fundamento constitucional, que busca neutralizar as conseqüências danosas resultantes do exercício abusivo da liberdade de imprensa, pois tem por função precípua, de um lado, conter os excessos decorrentes da prática irregular da liberdade de comunicação jornalística (CF, art. 5º, IV e IX, e art. 220, § 1º) e, de outro, restaurar e preservar a verdade pertinente aos fatos reportados pelos meios de comunicação social”.

O que se está a expor é que o direito de resposta, assim como a responsabilização civil, deve exsurgir após a devida comprovação da ofensa injusta irrogada por meio de matéria jornalística, o que não pode ser feito num juízo perfunctório de delibação em sede de antecipação dos efeitos da tutela, pois, nesse momento processual, o Magistrado não conta com elementos de prova satisfatórios para a formação do seu convencimento, pois a parte contrária nem sequer pode se pronunciar sobre os fatos narrados na inicial, em atentado aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Ademais, valendo-se mais uma vez do percuciente voto do Ministro Carlos Britto na ADPF nº 130/DF, assegura-se ao jornalista, como decorrência da liberdade de expressão, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável ou em tom contundente, contra qualquer pessoa, mesmo que autoridade pública.

Sobre o assunto, calha transcrever trecho do voto acima referido, in verbis:

“Ninguém desconhece que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão penal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revela-se inspirada pelo interesse público e decorra da prática legítima de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5º, IV, c/c o art. 220).

Não se pode ignorar que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.

A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer parcela de autoridade no âmbito do Estado, pois o interesse social, fundado na necessidade de preservação dos limites ético-jurídicos que devem pautar a prática da função pública, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar os detentores do poder.

Uma vez dela ausente o ‘anumis injuriandi vel diffamandi’, tal como ressalta o magistério doutrinário (CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY, ‘A Liberdade de Imprensa e os Direitos da Personalidade’, p. 100/101, item n. 4.2.4, 2001, Atlas; VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR, ‘A Proteção Constitucional da Informação e o Direito à Crítica Jornalística’, p. 88/89, 1997, Editora FTD; RENÉ ARIEL DOTTI, ‘Proteção da Vida Privada e Liberdade de Informação’, p. 207/210, item n. 33, 1980, RT, v.g), a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, especialmente às autoridades e aos agentes do Estado, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade.

(...)

Vê-se, pois, que a crítica jornalística, quando inspirada pelo interesse público, não importando a acrimônia e a contundência da opinião manifestada, ainda mais quando dirigida a figuras públicas, com alto grau de responsabilidade na condução dos negócios do Estado, não traduz nem se reduz, em sua expressão concreta, à dimensão de abuso da liberdade de imprensa, não se revelando suscetível, por isso mesmo, em situações de caráter ordinário, à possibilidade de sofrer qualquer repressão estatal ou de se expor a qualquer reação hostil do ordenamento positivo, tal como pude decidir em julgamento monocrático proferido nesta Suprema Corte:

‘Liberdade de imprensa (CF, art. 5º, IV, c/c o art. 220). Jornalistas. Direito de Crítica. Prerrogativa constitucional cujo suporte legitimador repousa no pluralismo político (CF, art. 1º, V), que representa um dos fundamentos inerentes ao regime democrático. O exercício do direito de crítica inspirado por razões de interesse público: uma prática inestimável de liberdade a ser preservada contra ensaios autoritários de repressão penal. A crítica jornalística e as autoridades públicas. A arena política: um espaço de dissenso por excelência.’ (Pet 3.486/DF, Rel. Min. Celso de Mello)

É certo que o direito de crítica não assume caráter absoluto, eis que inexistem, em nosso sistema constitucional, como reiteradamente proclamado por esta Suprema Corte (RTJ 173/805-810, 807-808, v.g.), direitos e garantias revestidos de natureza absoluta.

Não é menos exato afirmar-se, no entanto, que o direito de crítica encontra suporte legitimador no pluralismo político, que representa um dos fundamentos em que se apóia, constitucionalmente, o próprio Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, V)”

Assim, patente a relevância da fundamentação da Agravante, pois a concessão do direito de resposta em sede de antecipação dos efeitos da tutela acaba por tolher a plena liberdade de imprensa assegurada pela Carta Magna.

Por outro lado, o art. 273, § 2º, do CPC é categórico ao dispor que “não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado”.

In casu, mantida a decisão de Primeiro Grau e publicado informe na próxima edição de VEJA, a título de direito de resposta do Agravado, tal provimento será irreversível, ainda que decretada a improcedência dos pedidos iniciais por meio de sentença e a publicação desta em momento posterior não terá o condão de aniquilar os efeitos deletérios da eventual publicação do direito de reposta sem que tenha se esgotado o devido processo legal.

Não há como concordar com a fundamentação contida na decisão agravada sobre a reversibilidade da medida, a qual se encontra vazada nos seguintes termos:

Acrescenta-se que não há perigo de irreversibilidade do provimento antecipado (requisito negativo estatuído pelo art. 273, § 2.º, do CPC). Vindo a ser julgado improcedente o pedido do autor, conquanto não se possa apagar o que já restou publicado, o requerente poderá arcar com os custos do texto que fizer publicar, bem como poderá a requerida dar igual publicidade à sentença de improcedência.”

A questão não se resume ao aspecto monetário como quer fazer crer o douto magistrado que lançou a decisão nos autos; a irreversibilidade é patente e a palavra vertida não mais poderá ser recolhida.

Nesse diapasão, a irreversibilidade da medida desautoriza a antecipação dos efeitos da tutela. A esse respeito, confira-se os seguintes julgados desta Corte de Justiça, in verbis:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO -ANTECIPAÇÃO DE TUTELA -DECRETAÇÃO DE DESPEJO -- IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA -POSSIBILIDADE - NÃO CONCESSÃO - DECISÃO CORRETA

1)- Mostrando-se irreversível a tutela antecipada pedida, não pode ser ela concedida.

2)- Irreversível seria determinar despejo, em antecipação de tutela, quando sustenta o locatário ter contrato válido, na hipótese de o pedido ser julgado improcedente, uma vez que teria ficado o inquilino privado do uso do bem, e tempo não se tem como repor.

3)- Recurso conhecido e improvido.”

(20090020102779AGI, Relator LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS, 5ª Turma Cível, julgado em 22/10/2009, DJ 29/10/2009 p. 100)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. CEMITÉRIO CAMPO DA ESPERANÇA. TARIFAS. REAJUSTE ANUAL DOS PREÇOS. TUTELA ANTECIPADA. NÃO PREENCHIMENTO DE REQUISITO. AUSÊNCIA DO PERIGO DA DEMORA. IRREVERSIBILIADE DA MEDIDA ANTECIPATÓRIA.

Não preenchendo o requisito do perigo da demora para a concessão da medida antecipatória com vistas à determinação de realização de ajustes das tarifas promovidas pelo concessionário de serviços de cemitério no Distrito Federal, o seu improvimento é medida impositiva, nos termos do art. 273 do Código de Processo Civil.

Tendo em vista ter a medida antecipatória caráter patentemente irreversível, resta impossibilitado o provimento do agravo, em respeito ao parágrafo segundo do artigo supracitado.”

(20090020152777AGI, Relator NATANAEL CAETANO, 1ª Turma Cível, julgado em 27/01/2010, DJ 01/03/2010 p. 45)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE CONHECIMENTO - INDEFERIMENTO TUTELA ANTECIPADA - CONVERSÃO DE LICENÇA-PRÊMIO EM PECÚNIA - DISCUSSÃO ACERCA DA INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA - AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTOS LEGAIS - DANO NÃO VERIFICADO - IRREVERSIBILIDADE.

01.Não obstante a constatação da verossimilhança das alegações, em razão da existência de jurisprudência favorável à tese defendida pelos Agravantes, não vislumbro a presença de receio de dano irreparável ou de difícil reparação, tendo em vista que a concessão da tutela antecipada mostra-se irreversível, além do que, ao final, em caso de procedência do pedido, os Recorrentes farão jus ao recebimento das verbas pleiteadas, devidamente corrigidas e acrescidas de juros legais.

02.Recurso desprovido. Unânime.”

(20090020120369AGI, Relator ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, julgado em 14/10/2009, DJ 26/10/2009 p. 138)

Com essas considerações, não conheço do Agravo Regimental interposto pelo Agravado e dou provimento ao Agravo de Instrumento, para, reformando a decisão agravada, indeferir a antecipação dos efeitos da tutela vindicada pelo Autor/Agravado, consistente na publicação de texto na revista “Veja”, a título de direito de resposta, em razão da publicação da matéria intitulada “Terror e Poder”.

É como voto.

O Senhor Desembargador JOÃO EGMONT - Vogal

Com o Relator.

O Senhor Desembargador LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS - Vogal

Com o Relator.

DECISÃO

NÃO SE CONHECER DO AGRAVO REGIMENTAL. CONHECER DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DAR PROVIMENTO. UNÂNIME.

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