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TJ/RJ condena Universal do Brasil a pagar royalties pela música Paz na Terra

A desembargadora Denise Levy Tredler, da 19ª câmara Cível do TJ/RJ, manteve a condenação da Universal Music do Brasil que terá que pagar royalties à empresa fonográfica Do Gueto Produções, referentes às vendas da música “Paz na Terra”, do grupo Cabeça de Nego.

4/2/2011


Royalties

TJ/RJ condena Universal do Brasil a pagar royalties pela música Paz na Terra

A desembargadora Denise Levy Tredler, da 19ª câmara Cível do TJ/RJ, manteve a condenação da Universal Music do Brasil que terá que pagar royalties à empresa fonográfica Do Gueto Produções, referentes às vendas da música "Paz na Terra", do grupo Cabeça de Nego.

Desde 2006, a Universal Music Itália vinha comercializando na Europa a canção através do DVD "Verso Sud", da banda "Negrita", sem autorização dos verdadeiros autores. Segundo a magistrada, qualquer utilização da referida obra, a título oneroso ou gratuito, deveria ter sido previamente autorizada pela Do Gueto Produções. Fato que não ocorreu, embora haja prova nos autos que a empresa italiana tinha interesse na autorização do uso da música.

"A autora teve de assinar um contrato escrito em outra língua, mesmo sem saber do que se tratava, para que pudesse obter cópia do DVD 'Verso Sud'", disse a desembargadora Denise Tredler. "Para tal, a Do Gueto também fez um depósito no valor de R$ 1.750,00",completou.

Segundo a decisão, as duas gravadoras pertencem a um mesmo grupo econômico e a Universal brasileira agia em nome da estrangeira. Para a magistrada, a Universal "excedeu, manifestamente, os limites impostos pelo seu fim econômico, pela boa-fé e pelos bons costumes".

Veja abaixo a íntegra decisão.

_________

DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL

ORIGEM: 5ª VARA CÍVEL DA REGIONAL DA BARRA DA TIJUCA DA COMARCA DA CAPITAL

APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0013695-93.2008.8.19.0209

APELANTE: UNIVERSAL MUSIC LTDA

APELADO: DO GUETO PRODUÇÕES LTDA-ME

RELATOR: DES. DENISE LEVY TREDLER

DIREITO CÍVEL E AUTORAL. RITO ORDINÁRIO. ARTIGO 93 DA LEI nº 9.613, DE 1998. ARTIGO 187, DO CÓDIGO CIVIL. INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. ATO ILÍCITO. RESPONSABILIDADE DE GRUPO ECONÔMICO. CONTRATO EM LÍNGUA ESTRANGEIRA. NULIDADE. ARTIGOS 104, III, E 224 DO C.C. Veiculação de música, por empresa do grupo econômico da ré, cujos direitos autorais pertenciam à autora, mesmo que não a autorizou. Imposição de contrato, em inglês, feita à empresa-autora por parte da UNIVERSAL MUSIC BRASIL, em nome da UNIVERSAL MUSIC ITÁLIA. Recurso que se conhece e a que se nega seguimento, com base no caput do artigo 557, do Código de Processo Civil.

Decisão

Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida em ação de reparação de danos materiais e morais, ajuizada por DO GUETO PRODUÇÕES LTDA-ME, em face de UNIVERSAL MUSIC LTDA, em que objetiva a autora seja a ré condenada ao pagamento de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), a título de danos material e moral, bem como condenada ao pagamento de royalty a que tem direito a empresa-autora, pelo valor praticado no mercado brasileiro, pelas vendas do “DVD” desde o seu lançamento.

Adoto, na forma regimental, o relatório da sentença de fls. 123/127, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial e condenou a ré ao pagamento de valor referente às vendas do “DVD” relativo à música “Paz na Terra”, cujo montante deverá ser apurado em sede de liquidação, havendo compensação dos honorários advocatícios, em razão da sucumbência recíproca.

Apela a ré, a fls. 139/149. Sustenta, em resumo, a sua ilegitimidade passiva; que, apesar de a UNIVERSAL MUSIC BRASIL e a UNIVERSAL MUSIC ITÁLIA fazerem parte de um mesmo grupo econômico, são sociedades independentes; que não é caso de desconsideração da personalidade jurídica da ré, haja vista não se tratar de fraude ou ato ilícito; que não é indevido o pagamento de royalties à apelada, pois a segunda empresa obteve autorização para utilização de mash up (trecho de fonograma existente em outra gravação) diretamente de Alexandre Coelho da Silva, que, além de sócio da sociedade autora, é produtor fonográfico da gravação “Paz na Terra” e agente do grupo “Cabeça de Nego”.

Contrarrazões, a fls. 182/189, que prestigiam o julgado.

É o relatório. Passo a decidir.

Da análise dos autos, observa-se que a autora é produtora fonográfica do “CD” gravado pelo grupo musical “Cabeça de Nego”, em que a música “Paz na Terra” figura em sua primeira faixa (fl. 37). Logo, qualquer utilização da referida obra, a título oneroso ou gratuito, deveria ter sido previamente autorizada pela apelada, em conformidade com o artigo 93 da Lei nº 9.613, de 1988.

Releva notar que o e-mail (por cópia a fl. 15) demonstra que a UNIVERSAL MUSIC italiana tinha a intenção de obter a autorização do uso da música supramencionada, pois os dados nele contidos deixam claro que a comunicação partiu da UNIVERSAL MUSIC brasileira e que estava atuando em nome daquela.

Releva notar, outrossim, que a apelante juntou aos autos, a fls. 81/82, ata de reunião de sócios-quotistas, datada de 13 de novembro de 2007, em que se encontra estipulado que as sociedades UNIVERSAL MUSIC TRADING COMPANY B.V. e FONTANA B.V. são as únicas sócias da empresa brasileira UNIVERSAL MUSIC LTDA. Observa-se que a primeira é devidamente constituída e existente de acordo com as leis da Holanda, com sede também nesse país.

Importa salientar que a cláusula segunda do contrato social da empresa ré autoriza a abertura, manutenção e encerramento de filiais, escritórios e repartições em qualquer localidade do país ou do exterior. Logo, denota-se a presença de um grupo econômico, de que faz parte tanto a UNIVERSAL MUSIC brasileira como a UNIVERSAL MUSIC italiana, o que foi inclusive afirmado pela própria apelante no item 10 da sua peça recursal, a fl. 142.

Ressalte-se que foi verificado que, desde 2006 na Europa, o “DVD” intitulado como “Verso Sud” da banda “Negrita” estava sendo comercializado com a música “Paz na Terra” pela UNIVERSAL MUSIC ITÁLIA, o que demonstra a ausência de boa-fé, diante do conhecimento que tinha a apelante dos direitos autorais da autora. Isto, além do fato de aquela empresa já haver manifestado o seu interesse, aos 04 de abril de 2008 (fl. 04 e 15), na reprodução da música em tela, quando impôs um contrato em inglês, a fl. 99 (tradução, a fls. 95/98), cuja forma é proibida no Brasil.

Ademais, a autora teve de assinar o contrato escrito em outra língua, mesmo sem saber do que se tratava, para que pudesse obter cópia do supramencionado “DVD”, sendo feito um depósito no valor de R$ 1.750,00 (um mil, setecentos e cinquenta reais), conforme fls. 100/101. A ré, ao exercer seu direito, excedeu, manifestamente, os limites impostos pelo seu fim econômico, pela boa-fé e pelos bons costumes, à luz do que dispõe o artigo 187 do Código Civil. Logo, tal conduta constitui-se em ato ilícito, com abuso de personalidade jurídica, gerando à apelada prejuízos que devem ser suportados pelo grupo econômico de que faz parte a apelante, a fim de se obter a devida reparação. Neste sentido:

CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. GRUPO ECONÔMICO. A responsabilidade do grupo econômico pelo ato de uma das sociedades que controla supõe que o ato desta seja ilícito. Recurso especial não conhecido (REsp 689653 / AM (recurso 2004/0131469-3). Relator(a): Ministro ARI PARGENDLER (1104). Órgão Julgador. TERCEIRA TURMA. Data do Julgamento: 10/06/2008). RITO SUMÁRIO. AÇÃO OBJETIVANDO O RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO DA LINHA TELEFÔNICA DO AUTOR E A CONDENAÇÃO DAS RÉS AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MORAIS DECORRENTES DO BLOQUEIO DO SERVIÇO DE TELEFONIA, INOBSTANTE A AUSÊNCIA DE QUALQUER DÉBITO PENDENTE. ASSISTE RAZÃO À ORA AGRAVANTE, NO TOCANTE AO ART. 28, § 2º, DO CDC NÃO SER APLICÁVEL AO PRESENTE CASO, EIS QUE NÃO OCORREU NENHUMA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM SEU CAPUT OU NO § 5º. MERECE SER ACOLHIDA A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA NET BRASIL S/A, EIS QUE, EMBORA TENHA SIDO ESCRITO EM LETRAS MINÚSCULAS -- RAZÃO PELA QUAL PASSOU DESPERCEBIDO POR OCASIÃO DA DECISÃO ANTERIOR -- , CONSTA NA ORDEM DE SERVIÇO DE INSTALAÇÃO DE ASSINATURA O ENDEREÇO E O CNPJ DA NET RIO S/A, RESPONSÁVEL PELA CONTRATAÇÃO DO SERVIÇO "NET COMBO" (QUE INCLUI TV POR ASSINATURA, INTERNET E TELEFONE), CONTRA QUEM A PRESENTE DEMANDA DEVERIA TER SIDO DIRIGIDA. COM EFEITO, TRATA-SE DE EMPRESAS COM SEDES EM ESTADOS DIFERENTES E COM CNPJ'S E OBJETOS DISTINTOS, SENDO QUE A NET RIO POSSUI SEDE NO RIO DE JANEIRO E FOI QUEM EFETIVAMENTE CELEBROU O CONTRATO DE FORNECIMENTO DE SERVIÇOS, POR ATUAR DIRETAMENTE NA RELAÇÃO JURÍDICA COM O CONSUMIDOR, ENQUANTO QUE A NET BRASIL POSSUI SEDE EM SÃO PAULO E ATUA UNICAMENTE NA CONTRATAÇÃO, FORMATAÇÃO DE PRODUTO E GESTÃO DO CONTEÚDO DA PROGRAMAÇÃO PARA AS OPERADORAS ATUANTES NO MERCADO BRASILEIRO DE TV POR ASSINATURA. DESSE MODO, O FATO DE ESSAS EMPRESAS INTEGRAREM O MESMO GRUPO ECONÔMICO "NET" NÃO IMPÕE A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS MESMAS EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS FIRMADOS, EM RAZÃO DE NÃO TER OCORRIDO QUALQUER MOTIVO ENSEJADOR DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DAS SOCIEDADES. EXERÇO O JUÍZO DE RETRATAÇÃO, PREVISTO PELO ART. 557, § 1º, DO CPC, PARA ACOLHER A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA NET BRASIL S/A, ORA AGRAVANTE (APELAÇÃOO 0184630-48.2007.8.19.0001. DES. HELENA CANDIDA LISBOA GAEDE. Julgamento: 11/02/2010 - TERCEIRA CÂMARA CÍVEL).

No que se refere ao contrato redigido em outra língua, cabe ressaltar que não foi observado o artigo 224, do Código Civil, haja vista que a celebração do contrato ocorreu aos 11 de abril de 2008 (fl. 99), e a tradução foi realizada meses após, aos 05 de dezembro de 2008, conforme fls. 95/98. Logo, o referido contrato não está revestido da forma prevista em lei, sendo nulo de pleno direito, à luz do que dispõe o inciso III do artigo 104 do C.C.

No tocante ao percentual relativo aos royalties sobre a comercialização da obra em tela, o juízo a quo , ao determinar que será de 41,70%, tomou por base o que já constava do contrato de produção fonográfica, a fl. 16. Logo, não se revela incoerente, tampouco teratológico, tendo em vista o que já seria de direito da autora-apelada.

Por essas razões, nego seguimento ao apelo, com base no artigo 557, caput, do Código de Processo Civil.

Rio de janeiro, 17 de dezembro de 2010.

Denise Levy Tredler

Desembargador Relator

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