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TJ/SC - Editora Abril não terá de indenizar motorista fotografado em blitz policial

A 1ª câmara de Direito Civil do TJ/SC confirmou sentença da comarca de Criciúma, que havia negado pedido de indenização formulado por Aldirnei Sartor contra a Editora Abril, por publicação de seu nome e imagem em matéria relacionada ao excesso de velocidade no trânsito.

21/10/2010


Excesso de velocidade

TJ/SC - Editora Abril não terá de indenizar motorista fotografado em blitz policial

A 1ª câmara de Direito Civil do TJ/SC confirmou sentença da comarca de Criciúma, que havia negado pedido de indenização formulado por um motorista contra a Editora Abril, por publicação de seu nome e imagem em matéria relacionada ao excesso de velocidade no trânsito.

Os advogados Alexandre Fidalgo e Juliana Akel, do escritório Lourival J. Santos - Advogados, representaram a Editora neste caso.

Conforme os autos, ele foi abordado pela polícia após exceder a velocidade de seu veículo na BR-290, estrada que liga Porto Alegre à cidade de Osório, no Rio Grande do Sul. Naquele instante, repórteres da revista Quatro Rodas, pertencente à editora, faziam reportagem sobre o assunto. O motorista foi fotografado e ainda concedeu entrevista aos jornalistas.

Após a negativa em 1º grau, ele apelou para o TJ. Alegou ter sua imagem denegrida por conta da reportagem. Ressaltou ser irrelevante o fato de a matéria ser de cunho informativo, pois não havia autorizado previamente a publicação de seu nome.

"Nota-se que a reportagem possui cunho exclusivamente narrativo, relatando a ocorrência dos fatos e divulgando a foto do autor como exemplo da aplicação da lei no caso concreto. Inclusive, o próprio autor confessou ter sido autuado por excesso de velocidade, admitindo serem verdadeiros os fatos veiculados na reportagem", anotou o desembargador substituto Stanley da Silva Braga, relator da matéria.

Dessa forma, acrescentou o magistrado, os dados publicados, assim como a narrativa dos fatos apresentada pelo jornalista, limitaram-se ao evento em si e à análise das leis de trânsito, sem distorção dos fatos ou crítica direcionada ao requerente.

"Ele teve sua imagem publicada de forma exemplificativa apenas", concluiu o relator, ao negar provimento à apelação.

Confira abaixo o acórdão na íntegra.

_________________

Apelação Cível n. 2006.008643-1, de Criciúma

Relator: Des. Subst. Stanley da Silva Braga

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PUBLICAÇÃO DE FOTO E NOME DO AUTOR EM REVISTA AUTOMOBILÍSTICA VINCULADO À MATÉRIA INFORMATIVA E EDUCATIVA SOBRE O TEMA "VELOCIDADE EXCESSIVA NO TRÂNSITO" – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DO AUTOR – JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE À FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO – ANÁLISE RESTRITA AO TEOR DA MATÉRIA VEICULADA EM REVISTA.

AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DO REQUERENTE – IRRELEVÂNCIA - HARMONIZAÇÃO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS - DIREITO À HONRA E À IMAGEM VERSUS LIBERDADE DE IMPRENSA – CUNHO INFORMATIVO E NARRATIVO EVIDENCIADOS – INOCORRÊNCIA DE ANIMUS DIFAMANDI OU INJURIANDI – FOTOGRAFIA TIRADA EM LOCAL PÚBLICO – MATÉRIA SEM FINS LUCRATIVOS - MERA NARRAÇÃO DOS FATOS - INTUITO INFORMATIVO E EDUCATIVO – EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.

1. O julgamento antecipado da lide não importa cerceamento de defesa quando o conjunto probatório é suficiente à formação do convencimento do Magistrado, observadas as peculiaridades do caso concreto.

2. "A matéria publicada revestida de interesse público que traz em seu bojo informações não distorcidas, apenas narrando os fatos que são de conhecimento e interesse da coletividade, encontra-se em perfeita sintonia com o direito de informação consagrado nos artigos 5º, XIV e 220, da Constituição Federal." (Ap. Cív. 2008.008698-9, da Capital, rel. Des. Joel Dias Figueira Júnior).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.008643-1, da comarca de Criciúma (1ª Vara Cível), em que é apelante A. S., e apelado Editora Abril:

ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

RELATÓRIO

A. S. ajuizou "Ação de Indenização por Danos Morais" em face de Editora Abril, alegando, em síntese, ter sido autuado pela Polícia Rodoviária Federal por conduzir seu veículo em velocidade superior à legalmente permitida, quando trafegava na BR 290. Afirmou ter a requerida, sem sua prévia autorização, publicado matéria narrando o fato, tendo mencionando seu nome completo e foto, em revista de grande circulação (Quatro Rodas), ressaltando aos leitores as penalidades e as infrações previstas em Resolução expedida pelo Conselho de Segurança do Sul (Codesul), trazendo o título "Não corra: A polícia vem aí." Asseverou ter tido seu nome, honra e imagem violados por conta da publicação da matéria, de fim puramente comercial, sem sua prévia autorização. Requereu a procedência da ação para condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais na quantia correspondente 300 (trezentos) salários mínimos ou em valor a ser arbitrado pelo Juízo e ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Pleiteou o benefício da Justiça Gratuita. Valorou a causa e juntou documentos (fls. 10/13).

Justiça gratuita restou deferida (fl. 16).

Devidamente citada, a Editora requerida apresentou contestação (fls. 18/34), requerendo, preliminarmente, a aplicação da Lei de Imprensa para o reconhecimento da decadência, sob a alegação de ter transcorrido prazo superior a três meses entre a data da publicação e o ajuizamento da presente ação. No mérito, asseverou tratar-se de matéria de cunho informativo, sendo de interesse público. Em relação à fotografia, afirmou ter essa sido obtida com anuência do autor, que concedeu espontaneamente a entrevista, inclusive, aceitando ser fotografado. Sobreleva que a matéria jornalística em análise limitou-se a transcrever as declarações feitas pelo próprio autor. Alega não ter sido a imagem do autor utilizada para fins lucrativos, haja vista tratar-se de matéria de interesse público. Afirma não ter praticado qualquer ilicitude, tendo agido em pleno direito de livre informar. Ressaltou ter se restringido a narrar os fatos envolvendo o autor a título exemplificativo, não havendo qualquer juízo de valor, sendo o cerne da questão explicar resolução de trânsito expedida pelo Conselho de Segurança do Sul (Codesul), que intensificou a fiscalização de velocidade nas rodovias da região sul do país. Ademais, defende serem todas as informações que se referem ao requerido verdadeiras. Suscitou não ter o autor demonstrado a ocorrência de qualquer prejuízo que supostamente sofrera em razão da matéria jornalística. Pugnou pela condenação do autor por litigância de má-fé.

Houve réplica à contestação (fls. 38/47).

Sobreveio Sentença (fls. 48/50) tendo o Magistrado a quo julgado antecipadamente a lide, nos seguintes termos: "Ante o exposto, rejeito o pedido e julgo extinto o processo forte no art. 269, I, do CPC. Custas e honorários pelo autor, estes fixados em mil reais, respeitando-se o art. 12 da Lei de Assistência."

Irresignado, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 54/63) alegando, preliminarmente, cerceamento de defesa, por não ter havido produção de prova testemunhal, visto ter sido o feito julgado antecipadamente. No mérito, assevera ter sofrido dano à sua imagem, ante a publicação de sua fotografia, feita sem sua autorização, publicada indevidamente na matéria jornalística veiculada pela editora requerida. Ressalta ser irrelevante a matéria versar acerca fato verídico, tampouco que tenha cunho informativo, pois não autoriza a apelada a publicar imagem sem prévia autorização.

Apresentadas as contra-razões (fls. 68/80), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

VOTO

É consabido que o procedimento recursal exige o preenchimento de pressupostos específicos, necessários para que se possa examinar o mérito do recurso interposto. Portanto, torna-se imperiosa, num primeiro momento, a análise dos pressupostos recursais, em razão de constituírem a matéria preliminar do procedimento recursal, ficando vedado ao Tribunal o conhecimento do mérito no caso de não preenchimento de quaisquer destes pressupostos.

Tais pressupostos são classificados como intrínsecos (cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e extrínsecos (regularidade formal, tempestividade e preparo). Os pressupostos intrínsecos estão atrelados ao direito de recorrer, ao passo que os extrínsecos se referem ao exercício desse direito.

Assim, preenchidos os pressupostos de admissibilidade, passa-se à análise do mérito.

1. Inconstitucionalidade da Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa)

Inicialmente, vale lembrar ter sido a integralidade dos dispositivos da Lei de Imprensa declarada inconstitucional, consoante julgamento plenário realizado no Supremo Tribunal Federal:

"O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em argüição de descumprimento de preceito fundamental proposta pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT para o efeito de declarar como não-recepcionado pela Constituição Federal todo o conjunto de dispositivos da Lei 5.250/67 – Lei de Imprensa" (STF, ADPF 130, Rel. Min. Carlos Britto, j. 30-4-09, Plenário, Informativo 544)

Diante desse julgamento, observado o efeito erga omnes a ele atribuído, tem-se a retirada da referida lei do ordenamento jurídico, razão pela qual deverão as causas oriundas do direito de imprensa, liberdade de informação e de expressão ser analisadas sob a ótica do direito comum (Código Civil), norteado pelos preceitos constitucionais atinentes à matéria.

2. Preliminar de cerceamento de defesa

Insurge-se o autor contra o julgamento antecipado do feito, asseverando ter sido impedido de produzir prova testemunhal que lhe serviria para demonstrar o efetivo dano sofrido por ele.

Razão não lhe assiste.

Isso porque não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando a produção de provas é desnecessária à formação do convencimento do Magistrado, mormente quando a controvérsia limita-se ao teor da matéria divulgada e à ilicitude da veiculação.

Na hipótese, o julgamento realizado antecipadamente encontra-se em perfeita consonância com o artigo 330, I, do Código de Processo Civil:

"Art. 330. O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença:

I quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência.

(...)"

Sob essa ótica, infere-se desnecessária a dilação probatória pretendida, sobretudo porque as provas documentais acostadas são suficientes para nortear a sentença prolatada, em especial o exemplar da revista "Quatro Rodas", na qual foi veiculada a matéria jornalística sob análise.

Não obstante, vige no sistema legal pátrio o princípio do livre convencimento motivado, nos termos do artigo 131, do Código de Processo Civil, in verbis:

"Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deve indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento."

Destarte, as provas produzidas no processo podem ser apreciadas livremente pelo Magistrado, o qual, após confrontá-las, firmará seu posicionamento fundamentado naquelas que gozarem de maior credibilidade.

Acerca do princípio da persuasão racional, ou do livre convencimento motivado, leciona Moacyr Amaral Santos:

"Conforme este princípio, ao juiz é concedido o poder de formar livremente a sua convicção quanto à verdade emergente dos fatos constantes dos autos. Quer dizer que o juiz apreciará e avaliará a prova dos fatos e formará a sua convicção livremente quanto à verdade dos mesmos. É o que reza o art. 131, do Código de Processo Civil: "O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas, deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento".

[...]

Entretanto, liberdade de convencimento não equivale a convencimento arbitrário. A convicção, que deverá ser motivada, terá que se assentar na prova dos fatos constantes dos autos e não poderá desprezar as regras legais, porventura existentes, e as máximas de experiência. O juiz, apoiado na prova dos autos, pela influência que exercer em seu espírito de jurista e de homem de bem, formará a convicção a respeito da verdade pesquisada." (Primeiras linhas de direito processual civil. Saraiva: 1997. vol. 2. p. 78).

Colhe-se da jurisprudência deste Tribunal:

"I. Não há cerceamento de defesa em razão de julgamento antecipado da lide se o juiz forma seu convencimento diante das provas documentais constantes dos autos, mostrando-se, assim, perfeitamente dispensável a instrução processual, em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual." (TJSC. Apelação Cível n. 2007.005949-9, de Laguna. Rel. Des. Joel Figueira Junior, julgado em 21.10.2008).

E ainda:

"Sendo a finalidade da prova justamente formar o convencimento do juiz, não basta que a parte apenas suscite a ocorrência de cerceamento de defesa ante o julgamento antecipado da lide, é preciso que demonstre com propriedade a relevância e a pertinência do meio probatório que lhe foi suprimido, além de sua aptidão para alterar o posicionamento adotado." (TJSC. Apelação Cível n. 2007.038546-6, de Imaruí. Rel Des. Marcus Tulio Sartorato, julgado em 15.07.2008).

Desse modo, sendo suficientes os elementos probatórios constantes nos autos, não há falar em cerceamento de defesa.

3. Mérito

O recurso do apelante cinge-se à alegação de que o uso indevido de sua fotografia e a veiculação de seu nome na reportagem publicada pela editora apelada teria causado prejuízos a sua moral e imagem.

A matéria jornalística ora analisada, que veiculou nome e fotografia do autor, mencionando do fato de ter este sido multado por excesso de velocidade, foi publicada na revista "Quatro Rodas" em abril de 1997, sob a manchete "Não corra: a polícia vem aí".

Tal reportagem tece esclarecimentos acerca da resolução 08/96 do Conselho de Segurança do Sul (Codesul), que, à época, intensificava a fiscalização e a punição a motoristas que trafegassem em excesso de velocidade, assim dispondo (fls. 124/125 da revista):

"(...) É justamente no Rio Grande do Sul que o dispositivo regulamentado pelo Codesul vem mostrando sua face mais expressiva e repressiva. Desde sua vigência iniciada em 1º de novembro, até 20 de janeiro deste ano, foram flagrados pelos radares da polícia rodoviária gaúcha 16.218 carros acima do limite de velocidade. Desses infratores, 458 ultrapassaram os 70% do limite tolerado pela portaria do Codesul e foram levados às delegacias para autuação e, posteriormente, encaminhados às autoridades dos 24 Juizados Especiais. "Eu exagerei. Sou obrigado a concordar com a autuação", admite A. S. (sic), de 29 anos, flagrado pelo radar quando dirigia seu Gol a 144km/h, na BR-290, que liga Porto Alegre à cidade de Osório. Conduzido à delegacia, S. foi autuado e aguarda decisão da justiça. Por ser réu primário, caso condenado, deverá prestar serviços à comunidade, além de ser obrigado a comparecer a aulas de regras de trânsito durante três meses." (...)

Ao lado da matéria, verifica-se a existência de uma foto colorida, onde aparece um homem de óculos escuros, inclinado sobre uma mesa, em frente a um policial sentado. Ao fundo aparecem outros dois policiais fardados. Abaixo da foto encontra-se a seguinte legenda: "'Eu exagerei', admite Ardinei Sartor, na delegacia" (fl. 125 da revista).

Analisando-se o conteúdo da matéria, imperioso destacar que não há, em nenhum momento, os requisitos simultâneos e necessários à procedência do pedido indenizatório: a) ato ilícito; b) prejuízo; c) nexo de causalidade entre o ilícito e o prejuízo; d) culpa do agente.

De fato, não se vislumbra o dolo de denegrir a imagem do autor. Nota-se que a reportagem possui cunho exclusivamente narrativo, relatando a ocorrência dos fatos e divulgando a foto do autor como exemplo da aplicação da lei no caso concreto.

Inclusive, o próprio autor confessou ter sido autuado por excesso de velocidade, admitindo serem verdadeiros os fatos veiculados na reportagem, ao afirmar "que em uma de suas viagens de trabalho, logo após a vigência do Novo Código Brasileiro de Trânsito, quando trafegava na BR 290, que liga Porto Alegre a Osório foi autuado pela Polícia Rodoviária Federal por estar conduzindo seu veículo com velocidade superior ao legalmente proibido." (fl. 03).

Dessa forma, os dados publicados, atinentes à operação rodoviária de fiscalização em questão, assim como a narrativa dos fatos apresentada pelo jornalista, limitaram-se ao evento em si e à análise das leis de trânsito, não havendo distorção dos fatos ou crítica direcionada ao requerente. Este teve sua imagem publicada de forma exemplificativa apenas.

Ora, visando proteger a informação e a manifestação do pensamento independente de censura ou licença, a liberdade de imprensa recebeu a tutela constitucional. Tal liberdade está prevista nos arts. 5º, IV e IX, e 220 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

[...]

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Não obstante a CF/88 tutele a liberdade de manifestação do pensamento e a liberdade de imprensa, não há que se tolerar práticas abusivas que, no exercício desses direitos, venham a acarretar lesão a outros direitos fundamentais também tutelados pela Carta Magna, como são os direitos à honra, intimidade e à imagem.

A própria Constituição da República Federativa do Brasil, no texto do §1º, de seu art. 220, expressa a necessidade de respeito aos direitos fundamentais à intimidade, moral, honra e imagem (tutelados pelo art. 5º, inciso X) quando do exercício da liberdade de informação. Nos termos do §1º, do art. 220, da CF/88:

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

Nesse sentido, leciona Alexandre de Moraes que "apesar da vedação constitucional da censura prévia, há necessidade de compatibilizar a comunicação social com os demais preceitos constitucionais" (Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6a. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 2181).

É o que acontece nesta demanda, em que se discute a inexistência da responsabilidade civil em razão da liberdade constitucional de imprensa. Nesses casos, deve-se analisar com ponderação os direitos fundamentais tutelados, reduzindo proporcionalmente a eficácia de um destes direitos de forma a se adotar a solução mais razoável no caso concreto.

Colhe-se da jurisprudência:

"No que pertine à honra, a responsabilidade pelo dano cometido através da imprensa tem lugar tão-somente ante a ocorrência deliberada de injúria, difamação e calúnia, perfazendo-se imperioso demonstrar que o ofensor agiu com o intuito específico de agredir moralmente a vítima. Se a matéria jornalística se ateve a tecer críticas prudentes (animus criticandi) ou a narrar fatos de interesse coletivo (animus narrandi), está sob o pálio das 'excludentes de ilicitude' (art. 27 da Lei n. 5.250/67), não se falando em responsabilização civil por ofensa à honra, mas em exercício regular do direito de informação" (STJ, Resp. n. 719.592/AL, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. em 12.12.2005).

Cumpre, então, analisar o presente caso, em que há claro conflito entre direitos fundamentais constitucionalmente tutelados – liberdade de imprensa e direito à imagem e honra -, observando o entendimento acima explanado.

Argumenta o apelante que teve sua honra e imagem abalados com a vinculação de sua fotografia e nome à reportagem de texto que faz menção à atuação da polícia na fiscalização de infrações de trânsito em rodovias do sul do Brasil.

É certo que a quaestio faz presente dois valores constitucionais igualmente importantes: de um lado, a liberdade de expressão e, de outro, a inviolabilidade da honra e da imagem.

Ao contrário do litígio entre regras, que se resolve pela subsunção, no conflito entre princípios constitucionais a solução passa pela ponderação, com conseqüente relativização do princípio preterido, sempre tendo em conta a hipótese sub judice.

O magistério de Sérgio Cavalieri Filho é esclarecedor:

"Com efeito, ninguém questiona que a Constituição garante o direito de livre expressão à atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (arts. 5º, IX, e 220, §§ 1º e 2º). Essa mesma Constituição, todavia, logo no inciso X o seu art. 5º, dispõe que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação". Isso evidencia que, na temática atinente aos direitos e garantias fundamentais, esses dois princípios constitucionais se confrontam e devem ser conciliados. É tarefa do intérprete encontrar o ponto de equilíbrio entre princípios constitucionais em aparente conflito, porquanto, em face do princípio da unidade constitucional, a Constituição não pode estar em conflito consigo mesma, não obstante a diversidade de normas e princípios que contém; deve o intérprete procurar as recíprocas implicações de preceitos e princípios até chegar a uma vontade unitária na Constituição, a fim de evitar contradições, antagonismos e antinomias." (FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p.129/132)

Em decorrência da publicação, alega o autor ter passado por humilhações e constrangimentos diante de amigos, colegas de trabalho e clientes aos quais realiza revenda de produtos, tudo em conseqüência da veiculação da foto do autor, rodeado de policiais, juntamente com seu nome completo e suposto comentário por ele realizado, em uma matéria que versava sobre a fiscalização de infrações de trânsito.

É compreensível que o autor possa ter sido alvo de situações jocosas em seu círculo de amizade e até passado por alguns contratempos, porém, a alegada humilhação do autor não resiste a um olhar mais atento, posto que o fato noticiado se tratava apenas de uma autuação de trânsito, sendo, em conseqüência, desconsiderada a hipótese de prática de crime.

Além disso, não se evidencia o caráter difamatório na utilização da foto do autor durante uma "blitz" de trânsito, utilizada tão-somente com o intuito de ilustrar uma das atividades desenvolvidas pelos policiais na região, questão de interesse público, inexistindo animus difamandi por parte da revista "Quatro Rodas", ora apelada.

Ademais, o autor não é facilmente identificado na imagem publicada, a ponto de ser reconhecido por qualquer pessoa que tenha visto a reportagem, e por isso sofrer discriminações que o prejudicassem mesmo em seu trabalho, pois encontra-se de óculos escuros, em um ângulo de perfil lateral.

Assim, realizando-se a necessária ponderação, e sopesando os princípios aparentemente conflitantes, entende-se que, neste caso, há a relativização do resguardo à honra e à imagem do autor em face da livre manifestação do pensamento e da liberdade de imprensa, uma vez que a fotografia veiculada limitou-se a ilustrar matéria sobre a atuação policial nas rodovias do sul do Brasil.

Não se vislumbrando prejuízos provocados por ação ou omissão voluntária ou violação de direito, não há por que se falar em reparação de danos, posto que inexistentes.

Inclusive, verifica-se que, apesar da matéria em análise ter sido publicada em abril de 1997, o autor só ajuizou a ação indenizatória no ano de 2005, ou seja, já decorridos 8 anos do suposto abalo à sua honra, resolveu subitamente buscar algum ressarcimento. Há de se convir que tal desídia, por si só, demonstra não ter o autor sofrido abalo moral significativo, afigurando-se o pleito em análise como uma aventura jurídica de objetivos puramente financeiros.

Portanto, conclui-se que, neste caso concreto, a liberdade de imprensa e livre manifestação do pensamento não provocou danos indenizáveis por violação à honra e imagem do apelante. Não se infere, feitas as supracitadas considerações, a configuração ato ilícito decorrente da atividade jornalística da requerida.

Assim, mostra-se incabível o pagamento de qualquer indenização de cunho moral, diante da inexistência de ato ilícito.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, esta Primeira Câmara de Direito Civil, à unanimidade, resolveu conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Carlos Prudêncio, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Carlos Alberto Civinski.

Florianópolis, 5 de outubro de 2010.

Stanley da Silva Braga

RELATOR

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