ISS e o afretamento de embarcações
Marcia Barbosa P. de Sousa*
No mundo jurídico, todos sabem que somente é passível de tributação pelo ISS, por óbvio, a prestação de serviços, os quais devem estar expressamente contidos na lista anexa a legislação pertinente (seja o Decreto-Lei 406/68 - clique aqui, seja a LC 116/2003 - clique aqui), como bem determina a CF (clique aqui).
Ocorre que, apesar de o afretamento de embarcações não ser um serviço, propriamente dito, e não fazer parte do taxativo rol legal, alguns magistrados de primeira e segunda instância espalhados pelos estados brasileiros ainda insistem em encaixar, tal atividade em "outros" da lista de serviços. Além disso, em um mesmo Tribunal, como por exemplo o do Rio de Janeiro, as decisões são as mais diversas possíveis: ora pela não incidência do imposto, ora pela incidência de acordo com a atividade da empresa contratante ou até mesmo encaixando o afretamento de embarcações em itens da lista de serviços que preveem atividades de natureza completamente diversa.
Este cenário vem causando uma enorme instabilidade e insegurança jurídica aos contribuintes, que questionam: como pode uma empresa não recolher o ISS sobre afretamento de embarcações ao passo que outra é condenada a pagar?
Enquanto isso os municípios, em seu afã arrecadatório, continuam autuando aquelas empresas de afretamento que fizeram a correta opção de seguir a letra da Lei.
Como não poderia deixar de ser, a palavra final a respeito do assunto cabe aos Tribunais Superiores, após no mínimo quatro anos de processo. Sendo que, neste mês de novembro, finalmente, o STJ pronunciou-se a respeito do tema, ao julgar o Resp 1.054.144 - clique aqui (patrocinado pela Branco Advogados). Assim, através de sua 1ª Turma, o STJ, reformando decisão (acórdão) da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, definiu que o ISS não incide sobre contratos de afretamento de embarcações sejam eles por tempo, por viagem ou a casco nu.
Com efeito, acatando as razões apresentadas pelo contribuinte, a relatora do caso, ministra Denise Arruda, bem expôs em seu voto que no caso do afretamento a casco nu, a empresa cede apenas o uso da embarcação, tal e qual uma locação, de modo que a obrigação é de dar e não de fazer, portanto, não há o que se falar em prestação de serviço, levando em consideração, ainda, a orientação do STF no sentido de que é inconstitucional a incidência do ISS sobre a locação de bens móveis.
Já nos casos de afretamentos por tempo ou por viagem, o STJ entendeu que tais contratos são complexos porque, além da locação da embarcação com a transferência do bem, há outras inúmeras atividades envolvidas, entre as quais a disponibilização de tripulação. Por isso, ressaltou que tais atividades não podem ser desmembradas para efeitos fiscais e não são passíveis de tributação pelo ISS, já que especificamente o afretamento de embarcações não consta da lista de serviços legal.
Aqui bem vale o ditado: a “justiça tarda, mas não falha”. Agora, para que o destino dos contribuintes não se torne um eterno jogo de azar, espera-se que haja uma reflexão por parte dos tribunais estaduais para que não se esqueçam da função uniformizadora do STJ.
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*Gerente de Contencioso do Branco Consultores Tributários
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