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Plano de saúde aos seus sessenta anos

Persiste na sociedade, e mais significativamente no mundo jurídico, uma inquietante discussão que envolve grande parcela dos segurados dos Planos de Saúde no Brasil: a possibilidade, ou não, de aumento no valor das mensalidades quando os usuários atingem sessenta anos de idade.

23/11/2009


Plano de saúde aos seus sessenta anos

Guilherme Gonfiantini Junqueira*

Persiste na sociedade, e mais significativamente no mundo jurídico, uma inquietante discussão que envolve grande parcela dos segurados dos Planos de Saúde no Brasil: a possibilidade, ou não, de aumento no valor das mensalidades quando os usuários atingem sessenta anos de idade.

Por óbvio, o assunto é menos tormentoso quando o contrato não traz expressamente a possibilidade de aumento, o percentual e as faixas etárias em que será aplicado. Ou seja, na ausência de previsão contratual expressa nesse sentido, nos parece ser mesmo impossível o usuário, consumidor dos serviços, ser surpreendido com aumentos que em muitos casos chegam a 200%.

Assim, o tema é mais intrigante quando a majoração aos sessenta anos de idade está claramente prevista nos contratos. Nesses casos encontramos entendimentos compreensíveis e respeitáveis nos dois sentidos, isto é, aceitando e recusando a possibilidade de aumento no tilintar dos sessenta anos.

Entre em cena, nesse ponto, uma questão temporal.

Quando foi celebrado o contrato de Plano de Saúde?

Para os contratos celebrados anteriormente à edição da lei 9.656/98 (clique aqui), que regulou a atividade dos Planos de Saúde, a majoração das mensalidades aos sessenta anos dos usuários dependia de autorização prévia da Agência Nacional da Saúde – ANS. Assim, se ausente tal autorização, nos parece impossível o aumento no valor da mensalidade em função, exclusivamente, do critério etário.

Após a entrada em vigor da lei 9.656/98, que definiu as regras da relação entre os consumidores e as seguradoras dos Planos de Saúde, foi claramente prevista a possibilidade de variação da contraprestação mensal em razão da idade, desde que prevista no contrato. Ao mesmo tempo, a referida lei, embora permitindo a variação exclusivamente etária, vedou expressamente a possibilidade de aumento para consumidores com idade superior a sessenta anos.

Contudo, a alteração mais significativa e o maior ponto da discórdia aconteceram com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso, em 2004.

É porque a lei que o instituiu alterou sobremaneira a lei 9.656/98, proibindo direta e expressamente qualquer discriminação do idoso nos Planos de Saúde, pela cobrança de valores diferenciados em função da sua idade.

Assim, para os contratos celebrados após 1 de janeiro de 2004, quando entrou em vigor o Estatuto do Idoso, nos parece impossível a variação das mensalidades calcada exclusivamente no critério etário do segurado idoso.

Mas a discussão não se encerra aí.

Resta a hipótese mais palpitante: e os contratos celebrados anteriormente à edição do Estatuto do Idoso, cujo contratante-usuário somente atingiu a idade de sessenta anos após sua vigência, ou seja, após 1 de janeiro de 2004?

Como dito anteriormente, existem posições respeitáveis aceitando, e negando, a possibilidade de aumento em função dos sessenta anos.

Aqueles que aceitam a majoração defendem que aplicar o Estatuto do Idoso ao contrato em curso, celebrado antes da sua respectiva vigência, seria aplicar efeitos retroativos à lei nova – o que é vedado, como regra geral, no ordenamento jurídico brasileiro.

Por outro lado, há também o entendimento – predominante nos tribunais brasileiros – no sentido de que a cláusula que estipula o aumento aos sessenta anos do consumidor estaria sujeita a uma condição suspensiva, ou seja, o aniversário de sessenta anos do usuário do Plano de Saúde. Então, para essa corrente, que recusa a possibilidade de aumento no valor das mensalidades aos sessenta anos, mostra-se legítima a aplicação do Estatuto do Idoso se o implemento da condição suspensiva – aniversário do usuário – ocorreu quando o Estatuto já estava em vigor.

Impossível, portanto, o aumento aos sessenta anos.

Mais do que isso, essa corrente tem sustentado que, ainda que o consumidor tenha assinado seu contrato e completado os seus sessenta anos de idade antes da entrada em vigor do Estatuto do Idoso, estaria ele amparado contra a abusividade dos reajustes das mensalidades com base exclusivamente no critério da idade, tendo em vista a previsão da CF (clique aqui) quanto à defesa do idoso.

Participamos dessa última corrente, predominante no Brasil, seja porque o aumento exagerado das mensalidades aos sessenta anos dos usuários (chega-se a 200%!) desestimula, quando não impossibilita, a permanência no Plano de Saúde justamente no momento de maior necessidade do serviço contratado, seja porque logicamente não mais se justifica, pois em decorrência do aumento da expectativa de vida, o sexagenário de hoje não é mais o velho de antigamente.

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*Advogado de Zamari e Marcondes Advogados Associados S/C


 

 

 

 

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