A Justiça contra o consumidor
Arthur Rollo*
Já disseram que a Justiça falha porque tarda. A demora da Justiça acarreta a permanência dos conflitos de interesses na sociedade, gerando uma sensação de impunidade.
Quem ingressa com processo judicial nunca tem a certeza de êxito. Por mais pacífica que seja a tese na jurisprudência, cada caso é um caso, o que significa que o processo pode demorar muito e, além disso, o autor vir a perder a ação. Quem perde a ação geralmente arca com os honorários da parte vencedora, fixados entre 10 e 20% do valor da condenação ou, na ausência desta, segundo o prudente arbítrio o Juiz.
Ao serem advertidos pelo advogado da demora do processo e do risco de perderem a ação, porque essa informação tem que ser dada, muitos clientes "deixam para lá". Deixar para lá significa, na prática, que o problema permanecerá eternamente na sociedade, porque quem deixa de entrar com a ação permanece insatisfeito e passa a não acreditar mais na Justiça.
Aqueles que, mesmo advertidos, "teimam" em promover a ação sentem o peso da demora na tramitação do processo. A Justiça de São Paulo, sem dúvida alguma, é a mais assoberbada. Em alguns fóruns demoram três meses para juntar uma petição no processo. O processo no Juizado Especial, que devia ser concluído em aproximadamente um mês, está demorando muitas vezes mais de dois anos para terminar. A audiência de conciliação nesse tipo de processo, em alguns fóruns, está sendo designada para daí um ano e meio. Recursos de apelação no TJ/SP não costumam demorar menos de quatro ou cinco anos para julgamento.
Essa demora, sem dúvida, contribui para problemas agudos dos consumidores, como a ineficiência dos serviços prestados pela Telefônica. Após ser multada na via administrativa, esta empresa recorre à via judicial, aliás o que é um direito seu, sendo que o processo se arrasta por anos a fio, pelos problemas da Justiça. Isso impede que as multas administrativas venham a doer no bolso, provocando a reincidência dos comportamentos nocivos ao consumidor.
Muitos consumidores deixam de recorrer à Justiça pela demora e outros que recorrem, por vezes, se deparam com decisões esdrúxulas (já ouvimos o relato de caso em que a empresa foi condenada a pagar indenização de R$15 por danos morais). Tudo isso desestimula novas ações e dificulta os acordos por parte das empresas, já que ou o consumidor aceita um mau acordo ou terá que esperar por anos o desfecho de seu processo.
Para driblar a demora da Justiça, alguns consumidores estão adotando novas estratégias. A ação, como regra, deve ser proposta no domicílio do réu. Muitos fornecedores têm domicílios espalhados por todo o Brasil, o que permite que o consumidor escolha dentre eles aquele onde a demora é menor.
Muitas ações contra empresas aéreas, por exemplo, vêm sendo propostas em estados do Nordeste, onde a Justiça é mais célere. Alguns consumidores, como aconteceu no caso do acidente da TAM, preferiram propor suas ações em outros países, onde a Justiça é mais célere.
A demora da Justiça prejudica os consumidores, porque aumenta o número de recusas injustificadas por parte dos fornecedores ao atendimento de demandas legítimas daqueles. Enquanto esse quadro não melhorar, terão os consumidores que continuar pesquisando a Justiça que demora menos antes de entrar com uma ação.
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*Advogado, mestre e doutorando em direitos difusos e coletivos da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo
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