Estado de São Paulo regulamenta a possibilidade de quebra do sigilo financeiro de contribuintes
Marcelo Marques Roncaglia*
Rafael Balanin*
A exposição de motivos do Decreto Estadual 54.240/09 demonstra que o Governo do Estado planeja:
(i) delimitar as situações em que se mostra indispensável o exame das informações das operações financeiras dos contribuintes;
(ii) descrever o procedimento que deve ser observado para o exame dessas informações; e
(iii) indicar quais são as autoridades competentes para analisar o pedido de exame dos dados.
Feitas essas considerações, passamos à breve análise das disposições do Decreto. Em primeiro lugar é interessante notar que o artigo 2º estabelece que a requisição das informações financeiras somente poderá ocorrer quando existir processo administrativo tributário devidamente instaurado ou procedimento de fiscalização em curso.
Por sua vez, o § 2º desse mesmo artigo estabelece que a requisição de informações poderá ser feita com relação ao sujeito passivo, bem como de seus sócios, administradores e de terceiros ainda que indiretamente vinculados aos fatos ou ao contribuinte.
O Decreto também enumera, em seu artigo 3º, as situações em que a requisição das informações bancárias será considerada indispensável:
(i) fundada suspeita de ocultação ou simulação de fato gerador de tributos;
(ii) fundada suspeita de inadimplência fraudulenta, em razão de indícios da existência de recursos não regularmente contabilizados ou de transferência de recursos para empresas coligadas, controladas ou sócios;
(iii) falta, recusa ou incorreta identificação de sócio, administrador ou beneficiário que figure no quadro societário, contrato social ou estatuto da pessoa jurídica;
(iv) subavaliação de valores de operação, inclusive de comércio exterior, de aquisição ou alienação de bens ou direitos, tendo por base os correspondentes valores de mercado;
(v) obtenção ou concessão de empréstimos, quando o sujeito passivo deixar de comprovar a ocorrência da operação;
(vi) indício de omissão de receita, rendimento ou recebimento de valores;
(vii) realização de gastos, investimentos, despesas ou transferências de valores, em montante incompatível com a disponibilidade financeira comprovada; e
(viii) fundada suspeita de fraude à execução fiscal.
O Decreto também estabelece que a autoridade administrativa poderá, desde que não haja prejuízo ao processo administrativo ou ao procedimento de fiscalização em curso, notificar a pessoa relacionada com os dados e informações a serem requisitados para apresentá-los espontaneamente no prazo de até 15 (quinze) dias.
Além disso, o Decreto também prevê que as informações obtidas estarão sujeitas ao sigilo fiscal, inclusive sob pena de responsabilização funcional daquele que eventualmente utilizar tais informações fora do interesse do processo administrativo ou procedimento de fiscalização.
Diante disso, consideramos que os contribuintes devem estar atentos para eventuais solicitações que as Autoridades Fiscais do Estado de São Paulo passarão a fazer, requisitando o fornecimento dessas informações aos próprios contribuintes ou para as instituições financeiras, tendo em vista a recente regulamentação pelo Decreto Estadual 54.240/09.
Nesse sentido, é conveniente ter em vista que toda e qualquer requisição desse tipo de informações, de acordo com o que estabelece o artigo 2º do Decreto, deve ser embasada em um processo administrativo ou procedimento de fiscalização já instaurado. Portanto, é direito do contribuinte, bem como daquele que vier a ser requisitado a prestar tal tipo de informação financeira, exigir a indicação do processo administrativo ou processo de fiscalização que embasou tal solicitação.
Também consideramos que deve ser analisada com muita atenção a eventual requisição de informações de sócios da empresa ou de terceiros, conforme autorizado pelo § 2º do Decreto. A esse respeito, entendemos discutível a possibilidade de a autoridade fiscal exigir indiscriminadamente informações de terceiros, sem que seja dada justificativa inequívoca da necessidade de análise de tais informações.
Além disso, deve-se lembrar que ainda não existe posição definitiva sobre a interpretação que deve ser dada à autorização para que as autoridades fiscais requisitem tal tipo de informação, prevista na LC 105/01.
Entendemos que existem argumentos para afirmar, que, muito embora a LC 105/01 tenha autorizado as autoridades fiscais a requisitar informações das instituições financeiras, isso não significa que não seja necessária a autorização judicial prévia para tal solicitação, em observância ao que dispõe o artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal. Enquanto não houve posicionamento definitivo do Supremo Tribunal Federal sobre tal questão, entendemos que existem argumentos para justificar que, mesmo após a entrada em vigor da Lei Complementar e do Decreto Estadual 54.240/09, as autoridades ainda precisam pleitear autorização judicial para solicitar as informações.
Por essa razão, entendemos que os contribuintes, bem como as instituições financeiras, devem ter cautela ao receber solicitações dessa natureza por parte dos agentes fiscais estaduais.
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*Sócio e associado da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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