Reflexões da advocacia empresarial contemporânea
Guilherme Zugno*
O dinamismo econômico e a volatilidade do mercado moderno contagiaram a estrutura da advocacia do mundo e, em nosso interesse especial, do Brasil. Há uma tendência crescente pela adoção do conceito de escritório-empresa, com advogados preparados para assessorar o mercado nas decisões cotidianas, com conhecimentos que ultrapassam a seara jurídica e penetram em noções econômicas e administrativas. É cada vez mais comum deparar-nos com advogados com títulos de MBA em marketing, finanças e economia. A aparente evolução seria louvável não fosse a estrita preocupação com a lucratividade e a solução superficial de problemas cotidianos das sociedades empresárias. Superficial, pois restritos a aplicação objetiva de normas, atuando como meros “operadores do direito”.
Em outros tempos, advogar era primar pela excelência na realização da justiça, com bases teóricas e culturais sólidas, elaborando, criando e operando. Os advogados eram pessoas diferenciadas, dotadas de uma cultura invejável. Estudiosos, não somente da lei, mas, principalmente, das questões sociais, políticas e filosóficas que os envolviam.
Integrantes de uma elite que valorizava, sobremaneira, a cultura e o saber, o advogado despontava como aquele que detinha o dever de prezar pela salutaridade social.
Ao advogado contemporâneo, cumpre retomar o papel fundamental na persecução dos escopos e evolução do direito, com referência nos valores, costumes e princípios que ditam as diretrizes básicas da socialidade.
Para tanto, é imprescindível o permanente estudo nas mais diversas áreas humanas, pois só o conhecimento permite-nos a compreensão da complexidade da coletividade organizada, das diversidades culturais, dos hábitos e vivências. Há, na sociedade organizada, um antagonismo valorativo que deve ser compreendido e respeitado. Para tanto, prescinde um estudo sociológico, filosófico e antropológico.
Apenas uma imersão responsável e comprometida no estudo do pluralismo cultural permite-nos verificar a eficácia das normas gerais sociais, em razão da percepção da forma que externa, ou não, valores convergentes nas mais diversas culturas e concepções de vida.
Destarte, a advocacia é uma profissão, no seu sentido amplo, de entender, compreender, vivenciar e experienciar para, então, avaliar, evoluir e inovar, combatendo normas que ferem as diretrizes sociais, atos do poder público e decisões judiciais confrontantes com o ordenamento jurídico e, contrários aos interesses da coletividade.
Necessitamos, portanto, adaptar o romantismo da advocacia antiga ao cenário econômico contemporâneo, que demanda agilidade e eficiência com maior imediatismo. Precisamos deixar de estudar apenas leis e regulamentações, repetindo fórmulas e conceitos pré-concebidos. Observamos, hoje, uma pretensão equivocada da formalização do comportamento humano pela regulamentação estática e perpétua, como se fosse possível criar modelos ideais resistentes ao tempo e às diferentes culturas. Seria como buscar congelar a evolução do ser humano aos valores presentes. Contudo, deveríamos – os advogados - aguçar a percepção sobre as formas. O processo hermenêutico, consistente na atribuição de sentidos aos fatos e formas pré-concebidas é indispensável para que possamos compreender o entorno social que nos envolve para, com perspicácia e sapiência, podermos entender a coletividade e, assim, contribuir para a sua evolução.
Atualmente, raras são as mentes pensantes, que apresentam inovações científicas, alternativas, soluções inéditas. Ínfimo é o aspecto cultural e a socialidade dos profissionais do direito.
A presente elucidação é importante como um primeiro passo para alterar a atual concepção do demasiado mercantilismo jurídico, visando assegurar uma atuação do advogado com maior eficiência e respeitabilidade perante o mercado e os poderes Estatais, de forma a exigir condutas legislativas pertinentes às necessidades coletivas; atos públicos pautados na legalidade e na razoabilidade; responsabilidade do judiciário no julgamento adequado dos casos, com respeito à classe dos advogados e, conseqüentemente à sociedade.
A convergência de conhecimentos econômicos e administrativos – a demanda do mercado internacional – com uma sólida base científico-jurídica, abrangendo conhecimentos culturais, filosóficos, sociológicos e antropológicos, possibilita ao advogado contemporâneo uma atuação mais eficaz de forma a assegurar o atendimento aos princípios constitucionais e a adequada congruência entre o direito e as transformações sociais.
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*Advogado e pós-graduando em Direito Societário
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